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09/12/2009 - 08h44

Solidão pega

IVAN LESSA
colunista da BBC Brasil

É precisamente o que o título diz. Está sozinho? Amuado? Na fossa? Tristonho? Os outros que se cuidem. Esse negócio pega. Conforme se diz de um resfriado comum ou uma suína gripe. Aquela velha história que os gregos nos legaram, a de que o homem só é um homem forte é pura balela. Para usar uma expressão do tempo do onça. Onça grega, claro.

Solidão pega. Bolação minha? Jeito nenhum. Sou capaz de muita besteira. De muita generalização ousada. De alguma sargentização tímida. Essa, não. Essa é pesquisa pura. Daquelas que aprendi a gostar e passar adiante. Por falta de assunto ou coisa melhor a fazer.

Enumero, pois, para alegria de todas as pessoas gregárias que me leem, o que consegui descobrir nos meios mediáticos que enfrento e que me confrontam. Se há solitários entre vós, amigos, cheguem para lá que, até onde sei, vossa solitude (não é bonita essa palavra?) é capaz de ser transmitida ciberneticamente. One never knows, feito deveria ter dito qualquer personagem shakespeariano.

A espiral depressiva do pobre candidato a anacoreta arrasta um e todos que dele se aproximarem. Começam todos a se sentirem desconectados uns dos outros. Espirram solidão, seus olhos lacrimejam solidão, há uma tossezinha que é pura solidão --e não há cama, chazinho ou aspirina que resolva. Se a coisa durar muito, a sociedade exclui de seu meio o pobre desgraçado do solitário.

Tudo isso, sem voos poéticos pretensiosos, que esses são minha forma de me aliar ao Mundo e aos Outros, é conclusão a que chegou o doutor John Cacioppo, da Universidade Chicago. Cacioppo, que me desculpe vossa mercê mas, com esse nome, deveria estar no elenco daquela esplêndida série da HBO, Os Sopranos. O que está fazendo em Chicago e ainda mais pesquisando, não tenho a menor ideia. Cito-o, para que não me chamem de mentiroso e para dar vida a quem deveria ser personagem. Diz ele na apresentação de seus achados em revista especializada em especializações:

"Na periferia, as pessoas têm menos amigos, no entanto sua solidão leva-as a romper os tênues laços que ainda lhe restaram."

Cacioppo explica que, antes mesmo que uma relação acabe, as pessoas essas a que ele dedicou boa parte de sua vida transmitem o vírus (ou será bactéria? Micróbio?) da solidão aos poucos amigos que ainda lhe sobraram. Esses então, por sua vez, danaram-se. Adeus, vida comunitária! E não há antibiótico ou sopinha que cure.

Mais um pouquinho do Cacioppo. Perdão. Doutor Cacioppo: "Este efeito contagiante desfia e desgasta o tecido social."

E o ilustre, como eu no início destas linhas, é subitamente bafejado por uma musa distraída que ia passando.
Acrescenta ele:

"É como puxar um fio de uma suéter de crochê: todo ele se desfaz."

Dois adendos importantes. Segundo a pesquisa em questão, as mulheres são mais sujeitas a "pegar" solidão do que os homens. Pelo menos é o que relataram elas aos pesquisadores. Confesso que não vejo motivo para a ressalva cacioppana. Mulher é gente feito a gente, "seu" dotô. "Vão pará com esses sexismo aí!", como diria o bom, o esplêndido Ronald Golias, segundo consta um homem nada solitário.

O outro adendo é o de a solidão, que, associada a certas condições especiais (o doutor não foi específico), pode contribuir para a longevidade de um indivíduo, para sua condição cardíaca e pode chegar até mesmo a provocar angústia e depressões generalizadas.

Finalizo informando que a pesquisa foi feita com 5 mil habitantes de Farmingham, no Estado de Massachusetts.

Convenhamos, todos nós sabemos que Farmingham é uma cidade tristíssima povoada por gente tristérrima.

 

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