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26/08/2003 - 03h07

Foguete demorará a ganhar confiabilidade

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MAURÍCIO TUFFANI
da Folha de S.Paulo

Mesmo que o próximo vôo do VLS tenha pleno sucesso, o Brasil ainda não poderá ter a segurança de contar com um lançador de satélites confiável. O número de fracassos já obtidos para uma série de quatro protótipos faz com que o VLS esteja muito longe de ter uma taxa mínima de falhas admissível para ser considerado um produto seguro. E isso só será possível se forem realizados lançamentos de mais protótipos.

Essa é a posição de engenheiros que trabalham no programa espacial brasileiro, que preferem não se identificar. Mas ela é apoiada por um dos mais respeitados especialistas em tecnologia aeroespacial do Brasil, Jerzy Tadeusz Sielawa, 73 anos, ex-diretor-associado de tecnologia espacial do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e ex-chefe da pós-graduação do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), nascido em Cracóvia, na Polônia, e naturalizado brasileiro.

Embora diga não duvidar da competência dos técnicos do instituto, ele afirma que o órgão não dispõe de estrutura satisfatória na área de controle de qualidade. Após o acidente com o VLS-1, os ministros José Viegas Filho, da Defesa, e Roberto Amaral, da Ciência e Tecnologia, e o presidente da AEB (Agência Espacial Brasileira), Luiz Bevilacqua, disseram que o programa de construção do lançador brasileiro, que gastou cerca de US$ 280 milhões desde 1980, deverá continuar.

O teste de novos protótipos em projetos de engenharia que apresentem falhas é considerada necessária para os trabalhos de controle de qualidade. "Concordo com a afirmação do presidente da AEB de que o projeto do VLS não pode parar, mas certamente será necessário programar os lançamentos de novos protótipos para aumentar a confiabilidade do produto", afirma o engenheiro Gilberto Francisco Martha de Souza, professor da Escola Politécnica da USP e especialista em confiabilidade e análise de risco.

"Na engenharia, após a simulação de um projeto existe sempre a fase de verificação prática com protótipos para testar erros de implementação antes da construção do produto final", diz José Reinaldo Silva, professor de modelagem e design de sistemas, também da Escola Politécnica da USP. "No caso de insucessos repetidos, pode ser necessária a revisão das soluções adotadas para os problemas e até mesmo a revisão do projeto em si."

O VLS exige um controle de qualidade muito mais complexo que o da quase totalidade dos lançadores de satélites em operação em todo o mundo. Enquanto quase todos os lançadores estrangeiros têm três ou quatro estágios, cada um deles com um único propulsor, o VLS emprega quatro propulsores no primeiro estágio.

Gestão militarizada

As críticas de Sielawa não se limitam aos aspectos técnicos do projeto do VLS. Aposentado do Inpe há três anos, ele afirma que o modelo de gestão de instituições controladas por militares, como o IAE, é inadequado para a pesquisa. Além de não ser um ambiente favorável para a livre troca de idéias, segundo ele, existe também o fato de que certos cargos de chefia cabem a oficiais-aviadores da Aeronáutica --e não a oficiais de engenharia.

Muitas vezes, de acordo com Sielawa, há cargos que acabam sendo preenchidos por oficiais sem envolvimento com a área de pesquisa do setor. "Por outro lado, uma chefia que deve ser ocupada, por exemplo, por um capitão-aviador, acaba às vezes sendo interrompida desnecessariamente, se ele completa seu tempo máximo nessa patente e é promovido a major", explica o pesquisador.

As críticas ao modelo militar de gestão de instituições como o IAE, o ITA e outras que integram o complexo do CTA se assemelham àquelas que motivaram as reformas administrativas na gestão federal nas últimas décadas. Para muitos dos pesquisadores que atuam nesses órgãos, seus ambientes de trabalho se tornaram ilhas de conservadorismo em meio ao processo de reformulação da máquina administrativa.

Uma característica da cultura desses órgãos é a ética da obediência e a ausência de compromisso com resultados, segundo estudos da Enap (Escola Nacional de Administração Pública).

Falha de material

O brigadeiro Sergio Ferolla, 69, ex-diretor do CTA (Centro Técnico Aeroespacial) e atualmente membro do STM (Superior Tribunal Militar), disse ontem acreditar que o acidente com o VLS-1 tenha sido causado por uma "falha de material".

Ferolla disse que "o acontecimento [a explosão do foguete] é meio ilógico". Segundo ele, que disse não ter nenhuma informação concreta sobre o ocorrido, o foguete estava "todo inibido" e não havia razão para o começo de uma ignição. "Pela lógica, não podia acontecer, mas aconteceu."

O brigadeiro disse que essa possível falha de material pode estar relacionada à demora para a conclusão do projeto. "Os projetos se retardam, devido à falta de recursos começam a se alongar no tempo e aí é claro que podem aparecer coisas imprevisíveis."

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