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Caro
Dimenstein,
Concordo
plenamente que a fase de 0 aos 3 anos é fundamental
no desenvolvimento de todo indivíduo. Sempre
lidei com crianças pequenas e conheço
bem a sede de aprender e assimilar tudo que está
à volta delas nesta fase. Já foi provado
que os estímulos nesta faixa etária têm
um papel fundamental no formação das conexões
cerebrais. Contudo, é um erro pensar que a forma
mais correta de proporcionar estímulos seria
através de creches ou de qualquer estrutura de
ensino formal.
Muitas
vezes, estes estabelecimentos são fatores de
redução dos estímulos que a criança
teria em seu dia-a-dia. Por lidarem com um número
em geral excessivo de crianças e com profissionais
muitas vezes pouco preparados para a função,
como seu artigo apontou, expõem as crianças
a condições impróprias de cuidados,
higiene e psicológicas.
Muitas com certeza, estariam melhor em suas casas, mesmo
que sob o cuidado de uma irmã mais velha ou de
uma vizinha, mas onde fossem livres para engatinhar,
brincar na terra, explorar texturas, cores e sons...
Fico assustada ao pensar quanto de verba seria empenhada
na construção de creches, sua estruturação
e manutenção. Quanta burocracia surgiria
para implantá-las e administrá-las, os
gastos com concursos e nomeações, licitações...
Sabemos dos problemas de nosso país...
O
mais importante para crianças de 0 a 3 anos seria
conviver em um ambiente familiar sadio, inseridas em
uma comunidade que abriga brincadeiras expontâneas
e manifestações populares, em ambientes
que, mesmo simples e pobres, sejam limpos e livres de
esgosto e lixo.
Sem falar que, mesmo em creches bem estruturadas, causa-me
calafrios ver a pressa com que impõem atividades
inadequadas de 'pré-alfabetização'
às crianças e mães que se orgulham
de filhos que já lêem aos quatro/cinco
anos de idade...mas muito provavelmente, lêem
mas não entendem. O respeito ao ritmo de cada
criança tem sido esquecido e todas passam por
uma 'pasteurização' cada vez maior, através
das estruturas de ensino formal. Nas camadas mais privilegiadas
de nossa sociedade, enfrentam 'vestibulinhos' para ingressar
no primeiro ano do ensino fundamental...
Mobilizar-se por creches pode não ser o melhor
caminho. Eu me engajaria em formas de conscientizar
todas as camadas da população da importância
desta fase da vida. Tornar as pessoas de todas as classes,
cada vez mais conscientes de como os bebês absorvem
tudo que está a sua volta e quanto mais ricas
as experiências que lhes proporcionarmos, mais
eles se desenvolverão. Incentivar as famílias
que tiverem condições de manter suas crianças
em casa, sob bons cuidados e estímulos afetivos
e sensoriais, que o façam.
Um
primeiro passo: seria desligar a televisão (presente
até mesmo nos humildes barracos) e trocá-la
por boas músicas, a preencher os ambientes da
casa e os ouvidos dos pequeninos. Dançar com
eles, conversar, fazer cócegas. Estar ao lado
deles com corpo e mente presentes. Envolvê-los
nas atividades domésticas, como deixar que empilhem
panelas e potinhos, enquanto se está cozinhando.
Ensiná-los a notar cada detalhe visual de onde
estão, observar o céu, pequenos insetos,
cores, sombras. Deixá-los ter contato com animais,
mesmo que gatos ou cachorros sem raça, e com
crianças de diferentes faixas etárias.
O dia-a-dia de uma casa é um ambiente muito estimulante,
se o bebê não for confinado a um berço,
carrinho ou 'chiqueirinho' em demasia.
Os bebês estão atentos e não é
preciso tirá-los de suas casas para que suas
fases evolutivas se desenrolem a contento. Um objetivo
maior é tornar estas casas ambientes adequados
para abrigá-los e isto, talvez possa ser mais
facilmente alcançado com programas como os agentes
de saúde, que visitam comunidades periodicamente.
Estes agentes, além dos cuidados físicos,
podem ser treinados para passarem conceitos de como
estimular os bebês nos diferentes aspectos necessários.
Podem detectar situações restritivas (como
bebês mantidos imobilizados por cueiros...) ou
estressantes (como bebês expostos a ruídos
altos constantes) e orientar. Podem até distribuir
para as famílias pequenos kits explicativos e
com brinquedos educacionais de baixo custo, financiados
por iniciativa privada.
Haverá casos em que uma creche, com certeza,
será a melhor solução para a evolução
de um pequenino, mas não é necessário
esperar vagas para todos em uma creche. Podemos nos
mobilizar por iniciativas mais fáceis e ágeis
de serem implantadas e esta mensagem, que se tornou
tão extensa (desculpe! não era minha intenção)
é, simplesmente, para semear esta idéia
junto a uma pessoa de tamanha influência como
você.
Neuza
de Faria Árbocz
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