Grupo
percorre país para libertar escravos
Mais de 100
anos após a abolição, o Ministério do
Trabalho continua a enfrentar o problema do trabalho escravo. E
agora, não são só negros os obrigados a trabalhar
sem salário. Quatro grupos especiais de fiscalização
móvel do Ministério do Trabalho, com escolta da Polícia
Federal, já libertaram -sobretudo no Norte e Nordeste- 462
este ano. Em 1999 foram 639.
No limiar do
milênio, fazendeiros aliciam trabalhadores rurais a trabalhar
em troca de comida, que é habitualmente superfaturada, de
modo a mantê-lo preso à terra, sob a pressão
crescente de dívidas.
Só em
1993 o governo brasileiro admitiu em foros internacionais a persistência
do trabalho escravo no Brasil. O gesto se deu no governo Itamar,
quando o então ministro do Trabalho, Walter Barelli, anunciou
à OIT (Organização Internacional do Trabalho)
programa para combater essa e outras formas de trabalho degradante.
Mas até agora existe um único caso de condenação
de fazendeiro por trabalho escravo, com a pena de prisão
convertida em prestação de serviços para a
comunidade.
(Folha
de S.Paulo)
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Grupo
percorre país para libertar escravos
O tecido branco
da camiseta está coberto por uma camada espessa de sujeira
amarronzada. Pedro Silva dos Santos, 29, veste também bermudão
e traz aos pés sandálias de dedo. Arregalou os olhos
negros muito vivos ao se dirigir, há oito dias, à
fiscal do trabalho que o localizou numa fazenda no interior do Pará,
a 70 km da mais próxima estrada de asfalto.
"Deus te
abençoe, doutora."
Pedro é
personagem de uma rotina administrativa anacrônica e que consiste
em libertar escravos.
Os quatro grupos
especiais de fiscalização móvel do Ministério
do Trabalho, com escolta da Polícia Federal, já libertaram
-sobretudo no Norte e Nordeste- 462 este ano. Em 1999 foram 639.
A fazenda Boca
Quente está no município de Brannach, 950 km a sudoeste
de Belém. Pedro e três outros trabalhadores foram aliciados
no sul da Bahia, em outubro último, pelo sobrinho do proprietário
das terras.
Uma refeição
quente
Na caçamba do mesmo caminhão -três dias de viagem
e uma única refeição quente- vieram oito outros
trabalhadores rurais baianos, com a promessa de R$ 7 de diária
e conforto para morar.
A servidão
(Código Penal e mais as leis 5.889/73 e 9.777/98) ocorre
quando o empregado não recebe dinheiro e passa a trabalhar
em troca de comida, que é habitualmente superfaturada, de
modo a mantê-lo preso à terra, sob a pressão
crescente de dívidas.
Os companheiros
de viagem de Pedro foram distribuídos por três outras
fazendas de propriedade ou arrendadas por Miguel Vieira Messias,
num raio de 300 km, nos municípios de Xinguara, Redenção
e Parauapebas.
Messias já
está sendo processado desde o ano passado, por trabalho escravo,
pela Justiça Federal de Marabá.
Em julho deste
ano fez um acordo com a Justiça do Trabalho, pelo qual se
comprometia, em caso de reincidência, a pagar 3.000 Ufirs
(R$ 3.192) se houvesse um único trabalhador flagrado.
Multa
Os 12 casos de escravidão registrados esta semana renderão
uma multa de R$ 38.304, além dos R$ 10.502 que precisou pagar
de direitos trabalhistas e rescisão de contrato.
Ele não
quis falar à Folha. Seu advogado, Kallil Nascimento Ferreira,
reconhece as irregularidades, mas nega ter ocorrido escravidão.
Os quatro fiscais
do ministério e os cinco agentes da Polícia Federal
rodaram, em três veículos, 1.200 km em uma semana para
resgatar esse grupo de escravos.
A informação
inicial foi transmitida à coordenadora do grupo, Cláudia
Ribeiro Brito, pela CPT (Comissão Pastoral da Terra). É
um ponto da agenda rural em que igreja e governo atuam excepcionalmente
em fina sintonia.
Fuga
Numa das terras de Messias, a fazenda Rio Vermelho, em Xinguara,
quatro trabalhadores alugaram-se a fazendeiros vizinhos para levantar
os R$ 25 que permitiram a um deles tomar na estrada asfaltada uma
condução e percorrer 235 km até Marabá.
O trabalhador
procurou a polícia, que por sua vez o encaminhou à
Delegacia Regional do Trabalho. Mas foi em dependências da
CPT que a denúncia ganhou corpo e desencadeou a operação
de resgate.
Os 11 ex-escravos
embarcaram na quarta-feira de volta à Bahia. Com passagem
paga pelo "empregador".
(Folha de S.Paulo)
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