Publicidade
Publicidade
20/09/2006
-
17h35
DANIELA LORETO
da Folha Online
A atual onda de violência no Afeganistão [que ganhou força no início deste ano] é resultado da sobrevivência do grupo islâmico radical Taleban. Mas o Taleban não foi derrotado cinco anos atrás pelos Estados Unidos, quando uma coalizão liderada pelos americanos invadiu o Afeganistão atrás de Osama bin Laden e em resposta aos ataques de 11 de setembro de 2001?
Supostamente, sim. Mas a exemplo de Bin Laden --homem mais procurado pelos EUA e cujo paradeiro continua desconhecido--, o Taleban mostra estar "vivo" e exibe sua força diariamente às tropas ocidentais que lutam para controlar a violência no território afegão, disse à Folha Online, por telefone, a cientista política Vanda Felbab-Brown, 29, do Centro Belfer de Ciências e Assuntos Internacionais da Universidade Harvard.
Ela acrescenta que, além dos talebans, outras causas dão forma à violência: a fraqueza do governo afegão [chefiado por Hamid Karzai, apoiado pelos EUA] e a frágil segurança na fronteira com o Paquistão.
De acordo com dados da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), 173 pessoas morreram neste ano no país somente em ataques suicidas --151 delas civis.
Segundo Felbab-Brown [especialista em segurança internacional e política externa americana], embora o Taleban tenha sido removido do Afeganistão após a invasão dos EUA, o grupo não chegou a ser totalmente desarticulado e, logo no ano seguinte, começou a ganhar força novamente.
"O Taleban obteve abrigo e possibilidade de movimentação no Paquistão", diz a especialista. "A fronteira entre os dois países [Afeganistão e Paquistão] é uma área de difícil controle, porque, ao mesmo tempo em que o Afeganistão não possui os meios necessários para realizar essa patrulha, o Paquistão não tem vontade política para controlar a região", afirma.
"Ligações perigosas"
Felbab-Brown explica que o Paquistão era estreitamente ligado ao Taleban quando a milícia tomou o controle do país, em 1994 --impondo regras violentas. "O Paquistão colaborou e financiou a milícia para que tomasse o poder afegão. Por isso, resiste em capturar os líderes do grupo que fugiram após a invasão."
De acordo com Felbab-Brown, são esses mesmos líderes que utilizaram os recursos e facilidades existentes na fronteira com o Paquistão para reorganizar o grupo.
Outro fator que contribui para a violência crescente no país, segundo a especialista, é a falta de um governo central forte. Durante os cinco anos que se passaram após a deposição do Taleban, o governo afegão ainda não conseguiu controlar todo o território do país.
"Progressos foram feitos, mas o governo ainda é muito fraco, principalmente nas Províncias do sul do país", diz ela. "Sempre brinco que [o presidente] Karzai é prefeito de Cabul."
Instabilidade
A especialista explica que o Taleban conseguiu desestabilizar o país, assustando a população e convencendo-os de que o governo não é capaz de protegê-los.
"Os afegãos já não têm tanta certeza de que a vida agora é melhor do que durante o regime Taleban. Em 2001, todos estavam otimistas, mas agora há muita insegurança. Há pessoas sendo mortas, estupradas, muitos acham que a vida no país não melhorou muito".
Felbab-Brown diz que o Taleban não tem a capacidade de derrotar as forças da Otan ou da coalizão, mas explica que é exatamente assim que grupos de resistência agem [desestabilizando o governo]. "Os rebeldes ganham se conseguirem sobreviver, gerando instabilidade, assustando a população e afastando o povo do governo. Eles não precisam derrotar as forças contra as quais lutam", afirma.
Para ela, o principal é garantir à população que o governo ainda controla o país e mostrar progresso imediato na vida das pessoas. "Muitos estão assustados e deixam de fornecer informações à inteligência porque temem pela própria segurança", diz.
Reforço
De acordo com a Felbab-Brown, o primeiro passo para alcançar progresso no Afeganistão é melhorar a situação da segurança, mas os países ocidentais não dão sinais de que enviarão soldados para enfrentar a violência do Taleban, não neste momento.
A Otan tem cerca de 20 mil membros no Afeganistão, a maioria deles está nas Províncias do norte e do centro do país, que são regiões mais estáveis. Embora apresentem problemas com o ópio e com a falta de governança, a presença e ação do Taleban são menos significantes.
Segundo Felbab-Brown, no sul, onde há forte ação do Taleban, há apenas cerca de 8.000 membros da Otan. "É um número pequeno. Foi pedido um reforço de cerca de 2.500 homens, mas ainda é pouco", diz.
A especialista diz que para derrotar uma insurgência são necessários dez soldados para cada rebelde. "É claro que se trata de uma regra geral, que talvez não se aplique, mas a estimativa é que exista entre 8.000 a 12 mil talebans no Afeganistão, ou seja, há um taleban para cada soldado da Otan. O número de tropas ainda é muito pequeno."
Operações
Devido ao pequeno número de soldados no país, de acordo com a especialista, as tropas são destacadas para realizar operações em determinadas áreas, mas depois deixam as regiões.
Segundo ela, apesar do grande número de rebeldes mortos em operações, a ação militar no país é ineficaz. "Durante a Operação Medusa --a mais recente levada a cabo pela Otan--, 400 rebeldes foram mortos em três dias. Ação funciona assim: os soldados combatem os talebans e se retiram. Durante a noite, os rebeldes retornam e continuam a amedrontar a população.
"Por isso, seria importante ter mais homens, para manter uma presença constante nas regiões onde há mais influência insurgente, em vez de deixar a região depois de cada operação."
Reconstrução
Para Felbab-Brown, é fundamental que a reconstrução seja levada para o sul do Afeganistão, pois é importante, na opinião dela, que a comunidade internacional e o regime de Cabul mostre que está fazendo diferença na vida das pessoas. Um bom exemplo, explica, seria construir estradas e utilizar recursos para na reconstrução e no desenvolvimento.
A analista diz ainda que a situação da segurança é tão ruim que a ONU (Organização das Nações Unidas) praticamente já não atua no sul do país. "Os EUA tentaram reconstruir a estrada que une Candahar, Cabul e algumas das principais cidades da região. No entanto, ela está praticamente abandonada, é muito perigosa e muitas pessoas não se arriscam a utilizá-la... É fundamental a presença das tropas para que a reconstrução possa ser retomada."
Envio de ajuda
Segundo Felbab-Brown, após a invasão de 2001, havia "entusiasmo" entre vários países em enviar ajuda militar e financeira ao Afeganistão, mas, após alguns anos, o compromisso diminuiu.
A principal causa da relutância em enviar ajuda, de acordo com Brown, são as freqüentes baixas entre soldados estrangeiros que combatem os rebeldes no país. Ela explica que em muitos países, a população se opõe ao envio de soldados. O Canadá é um bom exemplo disso. O país mantém cerca de 2.500 soldados no Afeganistão, e enfrenta muita pressão para retirar suas tropas devido ao alto número de baixas.
Felbab-Brown explica que missões para combater insurgências são "complicadas e longas", e não apresentam resultados imediatos. "O nível de comprometimento precisa ser maior que em outras missões, os soldados se envolvem em confrontos diretos com os rebeldes."
Como exemplo, ela cita a Alemanha, que recentemente enviou homens ao território afegão, mas eles oferecerão ajuda "restrita", ou seja, não vão se envolver diretamente em confrontos.
Leia mais
Afegãos recorrem ao cultivo de papoula para sobreviver
Veja as principais dificuldades enfrentadas pelo Afeganistão
Saiba mais sobre a milícia Taleban
Invasões estrangeiras marcam história do Afeganistão
Especial
Leia o que já foi publicado sobre o Afeganistão
EUA nunca conseguiram derrotar o Taleban, diz analista de Harvard
Publicidade
da Folha Online
A atual onda de violência no Afeganistão [que ganhou força no início deste ano] é resultado da sobrevivência do grupo islâmico radical Taleban. Mas o Taleban não foi derrotado cinco anos atrás pelos Estados Unidos, quando uma coalizão liderada pelos americanos invadiu o Afeganistão atrás de Osama bin Laden e em resposta aos ataques de 11 de setembro de 2001?
Supostamente, sim. Mas a exemplo de Bin Laden --homem mais procurado pelos EUA e cujo paradeiro continua desconhecido--, o Taleban mostra estar "vivo" e exibe sua força diariamente às tropas ocidentais que lutam para controlar a violência no território afegão, disse à Folha Online, por telefone, a cientista política Vanda Felbab-Brown, 29, do Centro Belfer de Ciências e Assuntos Internacionais da Universidade Harvard.
Ela acrescenta que, além dos talebans, outras causas dão forma à violência: a fraqueza do governo afegão [chefiado por Hamid Karzai, apoiado pelos EUA] e a frágil segurança na fronteira com o Paquistão.
Divulgação |
"Taleban nunca foi derrotado pelos EUA", diz Felber-Brown |
Segundo Felbab-Brown [especialista em segurança internacional e política externa americana], embora o Taleban tenha sido removido do Afeganistão após a invasão dos EUA, o grupo não chegou a ser totalmente desarticulado e, logo no ano seguinte, começou a ganhar força novamente.
"O Taleban obteve abrigo e possibilidade de movimentação no Paquistão", diz a especialista. "A fronteira entre os dois países [Afeganistão e Paquistão] é uma área de difícil controle, porque, ao mesmo tempo em que o Afeganistão não possui os meios necessários para realizar essa patrulha, o Paquistão não tem vontade política para controlar a região", afirma.
"Ligações perigosas"
Felbab-Brown explica que o Paquistão era estreitamente ligado ao Taleban quando a milícia tomou o controle do país, em 1994 --impondo regras violentas. "O Paquistão colaborou e financiou a milícia para que tomasse o poder afegão. Por isso, resiste em capturar os líderes do grupo que fugiram após a invasão."
De acordo com Felbab-Brown, são esses mesmos líderes que utilizaram os recursos e facilidades existentes na fronteira com o Paquistão para reorganizar o grupo.
Outro fator que contribui para a violência crescente no país, segundo a especialista, é a falta de um governo central forte. Durante os cinco anos que se passaram após a deposição do Taleban, o governo afegão ainda não conseguiu controlar todo o território do país.
"Progressos foram feitos, mas o governo ainda é muito fraco, principalmente nas Províncias do sul do país", diz ela. "Sempre brinco que [o presidente] Karzai é prefeito de Cabul."
Instabilidade
A especialista explica que o Taleban conseguiu desestabilizar o país, assustando a população e convencendo-os de que o governo não é capaz de protegê-los.
"Os afegãos já não têm tanta certeza de que a vida agora é melhor do que durante o regime Taleban. Em 2001, todos estavam otimistas, mas agora há muita insegurança. Há pessoas sendo mortas, estupradas, muitos acham que a vida no país não melhorou muito".
Felbab-Brown diz que o Taleban não tem a capacidade de derrotar as forças da Otan ou da coalizão, mas explica que é exatamente assim que grupos de resistência agem [desestabilizando o governo]. "Os rebeldes ganham se conseguirem sobreviver, gerando instabilidade, assustando a população e afastando o povo do governo. Eles não precisam derrotar as forças contra as quais lutam", afirma.
Para ela, o principal é garantir à população que o governo ainda controla o país e mostrar progresso imediato na vida das pessoas. "Muitos estão assustados e deixam de fornecer informações à inteligência porque temem pela própria segurança", diz.
Reforço
De acordo com a Felbab-Brown, o primeiro passo para alcançar progresso no Afeganistão é melhorar a situação da segurança, mas os países ocidentais não dão sinais de que enviarão soldados para enfrentar a violência do Taleban, não neste momento.
A Otan tem cerca de 20 mil membros no Afeganistão, a maioria deles está nas Províncias do norte e do centro do país, que são regiões mais estáveis. Embora apresentem problemas com o ópio e com a falta de governança, a presença e ação do Taleban são menos significantes.
Segundo Felbab-Brown, no sul, onde há forte ação do Taleban, há apenas cerca de 8.000 membros da Otan. "É um número pequeno. Foi pedido um reforço de cerca de 2.500 homens, mas ainda é pouco", diz.
A especialista diz que para derrotar uma insurgência são necessários dez soldados para cada rebelde. "É claro que se trata de uma regra geral, que talvez não se aplique, mas a estimativa é que exista entre 8.000 a 12 mil talebans no Afeganistão, ou seja, há um taleban para cada soldado da Otan. O número de tropas ainda é muito pequeno."
Operações
Devido ao pequeno número de soldados no país, de acordo com a especialista, as tropas são destacadas para realizar operações em determinadas áreas, mas depois deixam as regiões.
Segundo ela, apesar do grande número de rebeldes mortos em operações, a ação militar no país é ineficaz. "Durante a Operação Medusa --a mais recente levada a cabo pela Otan--, 400 rebeldes foram mortos em três dias. Ação funciona assim: os soldados combatem os talebans e se retiram. Durante a noite, os rebeldes retornam e continuam a amedrontar a população.
"Por isso, seria importante ter mais homens, para manter uma presença constante nas regiões onde há mais influência insurgente, em vez de deixar a região depois de cada operação."
Reconstrução
Para Felbab-Brown, é fundamental que a reconstrução seja levada para o sul do Afeganistão, pois é importante, na opinião dela, que a comunidade internacional e o regime de Cabul mostre que está fazendo diferença na vida das pessoas. Um bom exemplo, explica, seria construir estradas e utilizar recursos para na reconstrução e no desenvolvimento.
A analista diz ainda que a situação da segurança é tão ruim que a ONU (Organização das Nações Unidas) praticamente já não atua no sul do país. "Os EUA tentaram reconstruir a estrada que une Candahar, Cabul e algumas das principais cidades da região. No entanto, ela está praticamente abandonada, é muito perigosa e muitas pessoas não se arriscam a utilizá-la... É fundamental a presença das tropas para que a reconstrução possa ser retomada."
Envio de ajuda
Segundo Felbab-Brown, após a invasão de 2001, havia "entusiasmo" entre vários países em enviar ajuda militar e financeira ao Afeganistão, mas, após alguns anos, o compromisso diminuiu.
A principal causa da relutância em enviar ajuda, de acordo com Brown, são as freqüentes baixas entre soldados estrangeiros que combatem os rebeldes no país. Ela explica que em muitos países, a população se opõe ao envio de soldados. O Canadá é um bom exemplo disso. O país mantém cerca de 2.500 soldados no Afeganistão, e enfrenta muita pressão para retirar suas tropas devido ao alto número de baixas.
Felbab-Brown explica que missões para combater insurgências são "complicadas e longas", e não apresentam resultados imediatos. "O nível de comprometimento precisa ser maior que em outras missões, os soldados se envolvem em confrontos diretos com os rebeldes."
Como exemplo, ela cita a Alemanha, que recentemente enviou homens ao território afegão, mas eles oferecerão ajuda "restrita", ou seja, não vão se envolver diretamente em confrontos.
Leia mais
Especial
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Alvo de piadas, Barron Trump se adapta à vida de filho do presidente
- Facções terroristas recrutam jovens em campos de refugiados
- Trabalhadores impulsionam oposição do setor de tecnologia a Donald Trump
- Atentado contra Suprema Corte do Afeganistão mata 19 e fere 41
- Regime sírio enforcou até 13 mil oponentes em prisão, diz ONG
+ Comentadas
- Parlamento de Israel regulariza assentamentos ilegais na Cisjordânia
- Após difamação por foto com Merkel, refugiado sírio processa Facebook
+ EnviadasÍndice