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30/11/2004 - 02h52

Sul: vinhos, madeira e a imensidão azul

Carolina Chagas
free-lance para a Folha de S.Paulo

Tradicional região produtora de vinhos do país, a serra gaúcha ganhou, em 1994, o primeiro e, por enquanto, único curso superior de enologia do país. Fixado na cidade de Bento Gonçalves (RS), a maior produtora de vinhos da região, o curso surgiu da necessidade de mão-de-obra qualificada para atender o mercado local. Com o diploma do Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica, www.cefetbg.gov.br) embaixo do braço, os profissionais ganham empregos em laboratórios de análises químicas —que controlam a qualidade do vinho—, em vinícolas (chamadas de "cantinas" na região), no planejamento e na implantação de vinhedos, em empresas revendedoras, exportadoras e importadoras de vinhos e derivados.

No vestibular para 2005, 227 candidatos concorrem às 20 vagas oferecidas. "O curso é totalmente voltado para as necessidades da região e, por isso, a absorção dos alunos pelo mercado de trabalho é quase instantânea", afirma Carlos Alberto Trevisan, administrador do Cefet.

Muito voltado para aulas práticas, o curso inclui no processo de aprendizado atividades em uma pequena fábrica de vinhos. Durante os três anos de formação, os alunos ajudam a controlar todas as etapas do processo de produção da bebida nesse estabelecimento —do plantio da uva ao engarrafamento. O vinho produzido ali, em pequena escala, é até vendido no mercado local. "Neste ano, tivemos uma grata surpresa: nosso espumante ganhou medalha de ouro no Concurso Internacional de Vinhos da Associação Brasileira de Enologia", diz Trevisan. Participaram da disputa 14 países, com 405 amostras da bebida, que foram julgadas por 40 enólogos de várias nacionalidades.

Outras faculdades da região também têm a uva como tema. Na cidade de Videira (SC), região produtora de vinhos e frutas, a Unoesc (Universidade do Oeste de Santa Catarina, www.unoescvda.edu.br) resolveu mudar o perfil dos cursos de biotecnologia. "Voltamos o trabalho do curso para o desenvolvimento regional", diz o químico Luciano Avallone Bueno, coordenador do curso. Essa é, aliás, a principal diferença entre o curso de biotecnologia industrial da Unoesc e os similares encontrados na Unesp e na Unicamp, por exemplo.

A primeira turma entrou na faculdade em 2002 e ainda não se formou, mas, de acordo com o professor, "o campo de trabalho é bem amplo, e as previsões são ótimas". A partir do sexto período, os alunos optam entre a área de enologia e a de animal e vegetal. De olho nas vinícolas da região, a maior parte fica com a primeira opção e está prestes a ajudar o mercado —por enquanto, apenas enólogos fazem o trabalho. Para o coordenador, os biotecnólogos vão ajudar bastante no processo da produção de vinhos. "A biotecnologia modifica a uva, é um estudo que pode melhorar as espécies", afirma.

Mas não foi só a produção dos vinhos que ganhou destaque nas universidades da região. Distante da produção, a UFPR (Universidade Federal do Paraná, www.ufpr.br) está mais preocupada com a conservação da costa marítima. Implantado em fevereiro de 2000 no Centro de Estudos do Mar, o curso de ciências do mar quer formar profissionais que serão úteis em toda a costa brasileira. Segundo o coordenador do curso, o oceanólogo Maurício Noernberg, o currículo foi desenvolvido para acrescentar aos cursos tradicionais de oceanografia um enfoque mais preciso na área socioambiental.

No Paraná, Estado com um litoral pequeno e uma grande área preservada, essa compreensão pode ser vital para o desenvolvimento sustentável da região. Noernberg acredita que esse conhecimento também ajude nas regiões costeiras mais afetadas pelo turismo. "Não há nenhum currículo nessa área com a preocupação de enxergar e contextualizar todos os aspectos envolvidos nessas localidades", diz.

Local de intensa produção madeireira, o Paraná abriga também o curso de engenharia industrial madeireira. A disciplina começou a ser lecionada no país em 1999, pela UFPR, e hoje já tem quatro cursos espalhados pela Brasil. "A indústria madeireira é muita antiga e tradicional, e nunca investiu em recursos humanos. Acabou ficando tecnologicamente defasada", afirma o engenheiro Umberto Klock, coordenador do curso. A sede do mercado por mão-de-obra especializada ficou clara quando a primeira turma se formou, no final do ano passado. Dos 22 novos engenheiros, 19 foram imediatamente empregados. Os outros três se dedicaram à área acadêmica: um deles faz mestrado no México, outro na França, e o terceiro, na própria UFPR —sua bolsa, paga por uma empresa madeireira, é superior à recebida por doutorandos de institutos de pesquisa. Na semana passada, quatro grandes empresas, inclusive estrangeiras, procuraram o curso de engenharia industrial madeireira, buscando os futuros novos formandos. Saíram de mãos abanando: todos os estudantes já têm empregos garantidos, a maior parte no Paraná.

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