Folha Online sinapse  
30/11/2004 - 02h58

Centro-Oeste: universidades tentam atrair pesquisadores

Carolina Chagas
free-lance para a Folha de S.Paulo

Manter tradições locais, preservar o Pantanal e criar cursos que dêem aparato teórico para os empresários do agronegócio são preocupações das instituições de ensino do Centro-Oeste, região que a soja enriqueceu e onde o algodão fez famílias fincarem raiz.

Criado em 1993 como mestrado e recém-aprovado como doutorado, o curso de agricultura tropical da UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso, www.ufmt.br) treina pesquisadores para atuar na investigação, no ensino e na utilização de sistemas de produção agropecuária tropicais. O curso tem três grandes linhas de pesquisa: descoberta e catalogação de recursos naturais; propagação, melhoramento e manejo de plantas medicinais (que tenta aliar os conhecimentos da agricultura tradicional ao das espécies com uso medicinal); e desenho dos sistemas de produção da região (que pretende pesquisar as formas de plantio das diferentes culturas e desenvolver técnicas que aliem o conhecimento popular e o científico para o cultivo em larga escala).

"Esse trabalho pretende sobretudo preservar as tradições e as espécies da região", explica a agrônoma Maria Cristina Albuquerque, coordenadora do curso, ligado aos setores de agronomia e veterinária da UFMT. Várias espécies da região foram catalogadas e reproduzidas em viveiro durante o curso. Um dos trabalhos nesse sentido foi o coordenado pela agrônoma Maria de Fátima Coelho, que resgatou espécies da flora —especialmente orquídeas— existentes na divisa de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, na região que foi alagada com a construção da Usina Hidrelétrica Ponte de Pedra, entre Sonora (MS) e Itiquira (MT). Há também no momento o cultivo em larga escala de duas espécies "selvagens" da região: a mangaba, um fruto, e o nó-de-cachorro, uma planta com poderes afrodisíacos, segundo os moradores do Centro-Oeste.

Além de disputarem quem conta com parte maior do Pantanal em seu território, a UFMT e a UFMS (Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, www.ufms.br) mantêm departamentos que desenvolvem atividades abertas a pesquisadores de outras instituições e cursos no Pantanal.

Recém-elevado à categoria de doutorado, o curso de ecologia e conservação da UFMS, aberto em 1996, já formou 56 mestres e ficou famoso por seu "curso de campo". "Entre os meses de setembro e outubro, melhor período para transitar na região, passamos 30 dias no Pantanal fazendo pesquisas diversas", explica o biólogo Erich Fischer, 37, coordenador do programa, que, depois de se formar e se pós-graduar em Campinas, fixou-se em Campo Grande. O caminho do professor não é muito comum. "Temos problemas em manter o corpo docente aqui, apesar da riqueza do Pantanal. Achamos que, com o doutorado, conseguiremos atrair mais pesquisadores", diz.

O programa coordenado por ele tem cinco linhas de pesquisa que se preocupam basicamente em catalogar e pesquisar o comportamento das espécies da fauna e da flora da região, descobrir como o clima e as doenças afetam essas espécies e o que deve ser feito para manter a funcionalidade do sistema de maneira sustentável. Há ainda um braço da pesquisa que investiga o controle biológico de pragas e o modo como as espécies devem ser tratadas para se adaptarem bem ao Pantanal.

A UFMT mantém o CPP (Centro de Pesquisas do Pantanal), ligado à UNU (Universidade das Nações Unidas) e à Embrapa-Pantanal, um dos mais importantes focos de pesquisa aplicada do Centro-Oeste. A prioridade do CPP é financiar pesquisas nas áreas de pesca, gado e alternativas econômicas. "Cada tema é pesquisado de forma interdisciplinar — investigamos também questões econômicas, sociais e culturais que a atividade envolve", explica o professor Pierre Girard, coordenador do CPP e da pós-graduação do Instituto de Biociências da UFMT.

Criar uma massa crítica e bons profissionais para o ensino de agronegócios é o principal objetivo do consórcio formado pela UnB (Universidade de Brasília, www.unb.br), pela UFG (Universidade Federal de Goiás, www.ufg.br) e pela UFMS para lançar um mestrado na área. "A idéia surgiu há seis anos, mas tínhamos de trazer de outros Estados profissionais capazes de analisar com propriedade o agronegócio e desenvolver pesquisas nessa linha", diz o agrônomo José Ferreira de Noronha, Ph.D em economia agrícola pela Universidade de Kentucky (EUA). Ele se mudou para Goiânia há oito anos, logo depois de se aposentar da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP), e hoje coordena o mestrado em Goiás. O curso existe há três anos, e cada universidade pode oferecer até 20 vagas por período. "Neste ano, tivemos uma procura de quatro candidatos por vaga", afirma Noronha. A procura foi tão grande que o curso ganhou um "filhote": um curso de especialização dado nos fins de semana.

Leia mais
  • Mapa da diversidade
  • Norte: floresta e subsolo influenciam cursos
  • Nordeste: Einstein poderia ser pernambucano
  • Sudeste: tecnologia de ponta, petróleo e parcerias
  • Sul: vinhos, madeira e a imensidão azul
  • ENQUETE: O que define um centro de excelência em educação?

  •      

    Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).