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New York Times

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Inteligência/Roger Cohen

Medo e negociações

Tel Aviv

Há um nível do conflito israelo-palestino que envolve questões bem conhecidas: as fronteiras, Jerusalém, a segurança e o chamado direito de retorno palestino. Esses serão temas das negociações que acabam de ser retomadas após um hiato de três anos. Mas, na realidade, o conflito tem a ver com questões mais profundas: desconfiança, ódio, trauma e, acima de tudo, temor.

Os israelenses, apesar de todo o seu domínio militar, possuem temores existenciais -que o verdadeiro objetivo dos palestinos não é se comprometer com as fronteiras de 1967 ou algo próximo a isso, mas aniquilar Israel. Como judeus em um mar árabe, eles temem o isolamento. Temem que o mundo esteja perdendo a paciência com a constante expansão dos assentamentos na Cisjordânia.

Os palestinos temem que sua progressiva marginalização e humilhação desde 1948 sejam irreversíveis, que suas divisões sejam irreparáveis, que sua causa esteja perdendo ressonância entre os árabes, preocupados com suas próprias lutas internas, e que eles não tenham como se contrapor ao poderio de Israel, aliado dos EUA.

O medo não se presta a um debate racional. Nesse sentido, ele é um fator negativo nas negociações. Por outro lado, um ponto de inflexão pode ser alcançado quando o temor da perpetuação do conflito empurrar cada lado para fora de posições entrincheiradas.

As negociações têm duração prevista de nove meses, tempo suficiente para um parto. Mas o histórico desses esforços não é encorajador. Noto que meus sentimentos estão em zigue-zague durante uma visita a Israel, inclusive durante conversas com o vice-chanceler Zeev Elkin e com o ministro das Finanças, Yair Lapid.

Elkin é um nacionalista religioso que se opôs, como a maioria dos integrantes do partido Likud, do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, a uma solução com dois Estados (Netanyahu acabou isolado dentro do seu próprio partido). Lapid é um centrista preocupado com a tendência ultrarreligiosa da sociedade israelense e um homem desconfiado das motivações palestinas, mas convencido de que o surgimento de dois Estados é essencial para salvar o sionismo, porque só esse resultado preservará uma pátria judaica.

O mais surpreendente é que Elkin, homem de veemente certeza religiosa, parecia cheio de temores, ao passo que Lapid, com suas dúvidas sobre uma futura Palestina e cético de que Deus seja confiável quando se trata dos judeus (ele citou o Holocausto), acolhe uma cautelosa esperança.

Elkin, que veio da Ucrânia para Israel em 1990, na época da primeira intifada, e que viveu a segunda intifada (cerca de mil israelenses mortos), insistiu que a situação de segurança piorou desde que ele chegou -embora não haja atentados suicidas há cinco anos e a economia israelense esteja prosperando em meio a uma relativa calma.

Citando os foguetes do Hamas disparados de Gaza contra Ashdod, no sul do país, ele disse: "Há menos segurança do nosso ponto de vista. Nos últimos 20 anos, todo lugar que abandonamos se tornou uma base do terror. A experiência dos últimos 20 anos, pelo menos para mim, é de que tentar estabelecer um Estado palestino leva a um resultado que não está melhorando".

Ele falou por algum tempo sobre a necessidade absoluta de convencer o líder palestino, Mahmoud Abbas, a reconhecer Israel como um Estado judaico (a Organização para a Libertação da Palestina já reconheceu Israel).

"O verdadeiro problema não é a fronteira, nem a terra e nem a segurança", disse Elkin. "É que não há líder palestino pronto para dizer uma coisa simples: reconhecer a possibilidade de um Estado judeu na região". Um complexo de temores em Elkin, sejam eles genuínos ou cultivados, sustenta uma visão mística: que todo o Eretz Israel pertence por decreto divino aos judeus.

Lapid adotou uma visão diferente. Sobre a reivindicação de que os palestinos reconheçam Israel como um Estado judaico, ele disse: "Acho isso uma bobagem. Viemos para cá dizendo que não precisamos que mais ninguém nos reconheça. Estamos libertos, não mais uma minoria. Meu pai veio para cá para estar num lugar onde não precisasse do reconhecimento de ninguém. Então digo isso por orgulho judaico".

Ele observou uma questão fundamental nas negociações de paz: "Vocês querem ser governados por seus medos ou por suas esperanças? Porque, se quiserem ser governados por seus medos, encontrarão centenas deles".

Os judeus libertos, livres dos seus medos, genuínos sionistas como Lapid, podem fazer a paz. O mesmo vale também para os palestinos que deixarem de lado o retrato amedrontador dos judeus.


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