Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Opinião

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Maria Elisa Granchi Fonseca

SIM

Não basta querer

Desde 2002, a Associação Americana de Retardo Mental propõe a compreensão de deficiência mental para além do mero ser ou não ser intelectualmente "bom" ou "ruim".

É preciso considerar os sistemas de apoio com que a pessoa com deficiência intelectual (DI) precisará contar ao longo da vida. Além das habilidades intelectuais, há que se considerar a saúde física do indivíduo, seu desempenho social e sua capacidade de adaptação às práticas da vida diária, e tudo isso depende da severidade de cada caso.

Limitações de adaptação prejudicam tanto a convivência quanto a capacidade da pessoa em responder ao que o ambiente espera dela em sua residência, na escola, no trabalho e na comunidade.

Pense, então, na situação conjugal, que advém do casamento. Uma situação que envolve rotina doméstica, contas a pagar, faxina a fazer, comida a preparar e "amor para dar", o que, aliás, não é a questão. Aspectos emocionais, direito ao amor, apaixonar-se, envolver-se intimamente, tudo isso é da condição humana. Independentemente da DI. Independentemente de ser ou não DF, PC, TDAH, DA e demais siglas.

A concepção de matrimônio e casamento costuma ser romanceada, como um direito a ser garantido. Mas não se pode deixar de considerar os efeitos desse contrato sobre a vida de quem os leva.

Não basta querer casar para casar. Um par com recursos intelectuais e funcionais limitados, a ponto de precisarem de apoio pervasivo e supervisão direta, terão consciência plena de estarem em um lar, e não somente em uma casa mobiliada? A presença de alguém mediando o casamento faz do mesmo matrimônio?

Não que neguemos a essas pessoas o direito à família e ao casamento. Mas não podemos negar, outrossim, que essas mesmas pessoas sejam passíveis de recursos linguísticos limitados, tenham dificuldade no trato com o dinheiro, problemas com autonomia e independência, falhas nas competências sociais, na observância de regras e leis, na credulidade.

Podem também ter dificuldades para evitar a vitimização, problemas com deslocamento, higiene, vestuário, manejo de medicamentos, habilidades ocupacionais e com a segurança --situações de difícil enfrentamento quanto mais severa for a deficiência intelectual.

Tudo isso poderá fazer com que as competências necessárias para a vida a dois passem a ser motivos para a vida a três, ou quatro, ou cinco. A presença constante de alguém pode vir a ser urgente e até critério para a manutenção da independência e qualidade de vida do casal.

Há dúvidas quanto a se o casamento entre duas pessoas com DI vai se caracterizar como casamento no sentido pleno do termo. Ou ainda como "viver junto", "estar perto de", tanto faz. Isso está relacionado ao grau da DI. Quanto melhor a pessoa funcionar no ambiente, menos problemas de adaptação terá no convívio com seu cônjuge, em seu lar.

Não parece ter havido discussão sobre casamento entre pessoas com DI leve. Isso pelo fato de os quadros leves estarem próximos dos neurotípicos, que se confundem na multidão. A discussão que se se observa considera indivíduos com quadros mais comprometidos, o que provoca um questionamento: de onde partiu a ideia? Quem resolveu casar com quem?

Se o caso é mais severo, o rebaixamento intelectual deixa o indivíduo menos suscetível a fantasias e à tentação de fazer planos. Será que alguém não resolveu por ele que, agora, além de todos os direitos iguais, também é preciso exigir o direito civil de se casar? Não, deficientes intelectuais não devem se casar sem autorização antes que se avalie a severidade de cada caso.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página