Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
19/02/2013 - 16h48

Contra a obesidade, médicos pedem por imposto sobre refrigerantes

Publicidade

DENIS CAMPBELL
SHIV MALIK
DO "GUARDIAN"

Academy of Medical Royal Colleges apresenta plano de ação de dez pontos para tirar o Reino Unido da posição de "país mais gordo da Europa".

*

Os 220 mil médicos do Reino Unido estão apelando por um aumento de 20% no custo das bebidas açucaradas, por uma redução no número de casas de fast food e pela proibição de comidas não saudáveis em hospitais, a fim de impedir que a crise da obesidade, que vem ganhando força no país, se torne incontrolável.

A Academy of Royal Medical Colleges, que congrega as instituições de ensino de medicina britânicas, está apelando por ação dos ministros, do NHS (Serviço Nacional de Saúde), dos legislativos locais e dos fabricantes de alimentos, e também por mudanças no comportamento dos pais, a fim de romper o ciclo de "geração após geração caindo vítima das doenças e mortes causadas por obesidade".

Edson Silva/Folha Imagem
A proporção de obesos ingleses em 2050 será de 60% dos homens, 50% das mulheres e 25% das crianças
A proporção de obesos ingleses em 2050 será de 60% dos homens, 50% das mulheres e 25% das crianças

Em relatório que descreve o problema em termos sombrios, a organização afirma que os médicos estão "unidos em perceber a epidemia de obesidade como maior ameaça à saúde do Reino Unido. As consequências da obesidade incluem diabetes, doenças cardíacas e câncer, e pessoas estão morrendo desnecessariamente por conta de doenças que poderiam ser prevenidas".

A organização critica as tentativas de governos anteriores e do atual para combater a obesidade como "desordenadas e decepcionantemente ineficientes", e gravemente insuficientes dada a escala do problema. Um quarto dos ingleses adultos são obesos, e a previsão é de que essa proporção cresça para 60% dos homens, 50% das mulheres e 25% das crianças em 2050.

Depois de uma pesquisa de um ano de duração, a organização preparou um plano de ação de dez pontos --entre os quais questionários a serem aplicados pelos profissionais de saúde aos pacientes acima do peso com perguntas sobre seu estilo de vida, e assistência a pais de crianças recém-nascidas para que criem bons hábitos alimentares nos filhos. O objetivo é que o Reino Unido deixe de ser "o país mais gordo da Europa".

O professor Terence Stephenson, presidente da Academy, disse que o relatório não imagina estar oferecendo solução completa para a obesidade, mas que "afirma a necessidade de que juntos façamos mais, a partir de agora, para que o problema não se agrave, e o NHS se torne incapaz de enfrentá-lo". Estima-se que a obesidade custe 5,1 bilhões de libras ao ano para o NHS.

O relatório propõe medidas que, afirma, "a sociedade como um todo precisa tomar a fim de evitar que a crise da obesidade se torne insolúvel". Apelando por uma reversão dos hábitos de alimentação prejudiciais, o texto afirma: "Da mesma forma que o desafio de persuadir a sociedade de que o hábito do fumo, profundamente entranhado, contrariava seus melhores interesses, mudar a maneira pela qual comemos e nos exercitamos se tornou questão de necessidade".

A organização deseja uma ampliação dramática dos esforços de combate à obesidade. Suas dez recomendações para eliminar o que define como "ambiente obesogênico" incluem apoio a:

- Um tributo experimental de 20% sobre os refrigerantes açucarados, por prazo de pelo menos um ano, como o que foi adotado em algumas regiões dos Estados Unidos, com o objetivo de determinar qual seria o efeito sobre as vendas. A potencial arrecadação anual de um bilhão de libras que o tributo traria poderia ajudar a bancar o custo de uma ampliação dos programas de controle de peso.

- Os legislativos locais devem limitar o número de lojas de fast food autorizadas a operar perto de escolas, faculdades, polos de lazer e outros pontos de reunião de crianças, para por fim ao "paradoxo" de escolas que tentam persuadir seus alunos a comer refeições saudáveis, mas têm seus esforços prejudicados por carrinhos de hambúrguer aprovados pelas autoridades locais e estacionados diante de suas portas.

- Os profissionais do NHS devem conversar regularmente com os pacientes acima do peso sobre seus hábitos alimentares e de exercício, em todas as suas consultas, e oferecer-lhes ajuda, sob uma norma de "todo contato conta".

- O NHS deve investir pelo menos 300 milhões de libras nos próximos três anos para enfrentar a séria escassez de programas de controle de peso, para que muito mais pacientes com problemas de excesso de peso possam ser encaminhados a ele e ajudados "de maneira sensível e cuidadosa".

- Ampliação no número de cirurgias bariátricas para os casos de obesidade severa, ante o total atual de oito mil operações anuais bancadas pelo NHS, para ajudar pessoas cuja vida esteja em risco.

- Os hospitais devem adotar para a comida que servem aos seus pacientes e pessoal os mesmos padrões nutricionais adotados pelas escolas públicas da Inglaterra, e eliminar as casas de fast food e as máquinas de venda de alimentos que comercializem produtos pouco saudáveis nas instalações do hospital.

- Assistentes sociais dos departamentos de saúde devem fazer visitas domiciliares para aconselhar pais de recém-nascidos quanto à alimentação de seus filhos, e evitar que se viciem em doces ou alimentos gordurosos já na primeira infância.

- Todas as escolas devem servir alimentos saudáveis em suas cantinas, o que inclui as escolas livres e as escolas privadas, até agora isentas por ordem do secretário da Educação Michael Gove dos regulamentos que se aplicam às escolas públicas.

- A publicidade televisiva de alimentos com alto teor de sal, açúcar e gordura saturada deve ser proibida antes das 21h, porque as atuais restrições para reduzir a exposição das crianças a esse tipo de anúncio não funcionaram.

O relatório define como "inexplicável" a presença de refeitórios hospitalares que fornecem refeições não saudáveis, porque caberia a essas instituições dar o exemplo, e como "ainda mais espantoso que, nas áreas de recepção de muitos hospitais, os pacientes encontrem lojas de fast food de marcas conhecidas ou máquinas de venda de doces, refrigerantes e salgadinhos".

O texto faz críticas severas a Gove: "Excluir a onda de escolas particulares que surgiram nos últimos anos da regulamentação nutricional parece ser um tremendo gol contra da parte do atual governo".

Stephenson disse ao "Guardian" que o imposto adicional de 20% sobre os refrigerantes que contêm açúcar se justificava porque eles representam "calorias inúteis", e são "o maior exemplo de um alimento prejudicial. A pessoa consome açúcar puro. Nossos corpos não evoluíram para lidar com esse tipo de coisa".

Jamie Oliver, o cozinheiro e ativista no combate à atividade, recebeu o relatório positivamente, definindo-o como "o mais claro sinal de alerta de que a profissão médica está preocupada com a obesidade. Precisamos de ação agora para educar crianças e famílias sobre como escolher a comida certa, e para lhes dar a melhor chance na vida".

A Food and Drink Federation, organização setorial dos fabricantes britânicos de alimentos, classificou o relatório como "pouco interessante", alegando que o texto "pouco acrescenta a um importante debate". Afirmou que o estudo não menciona o papel do álcool em adicionar calorias às dietas adultas, e que pouco menciona sobre a "saúde no lugar de trabalho".

Terry Jones, porta-voz da associação, disse que "a Academy of Medical Royal Colleges apresentou suas recomendações como uma coleção de ideias desequilibradas, aparentemente sob pesada influência de grupos de pressão que defendem cada qual sua causa exclusiva".

O Departamento da Saúde afirmou que estava estudando as conclusões apresentadas pelo estudo. "A ameaça que a obesidade representa tanto para os adultos quanto para as crianças é um dos maiores desafios de saúde pública atuais", disse um porta-voz. "Esse relatório abrangente reconhece, da mesma forma que nosso recente apelo a ação contra a obesidade, que não existe uma resposta única ao problema da obesidade".

"Cabe a todos - governo, indústria, profissionais de saúde e grupos voluntários, e também às pessoas mesmas - trabalharmos juntos para promover a alimentação saudável e um estilo de vida saudável", acrescentou.

O British Retail Consortium, associação setorial do varejo britânico, afirmou que era errado "demonizar" seus integrantes, que incluem cadeias de fast food como Burger King, McDonalds e KFC. Richard Dodd, porta-voz da organização, afirmou que essas cadeias oferecem aos seus clientes produtos e pratos reformulados para reduzir o teor de gordura, açúcar e sal.

"É errado demonizar qualquer tipo específico de comida ou restaurante. O que nossos membros vêm fazendo de maneira dedicada é encorajar dietas saudáveis e equilibradas, oferecendo aos consumidores a informação e as escolhas de que precisam", ele disse, acrescentando que era também responsabilidade dos pais ajudar as crianças a "construir uma atitude saudável e responsável para com a comida, e uma dieta equilibrada".

Gavin Partington, diretor geral da British Soft Drinks Association, a organização setorial dos fabricantes de refrigerantes britânicos, disse que "compartilhamos do reconhecimento de que a obesidade é uma grande prioridade de saúde pública, mas rejeitamos a ideia de que um imposto sobre os refrigerantes, que contribuem com apenas 2% das calorias totais de uma dieta média, vai resolver um problema que gira em torno da dieta em termos mais amplo e do nível de atividade física".

"Nos 10 últimos anos, o consumo de refrigerantes contendo açúcar adicional caiu em 9%, e a incidência de obesidade continuou a crescer. Hoje, 61% dos refrigerantes não contêm açúcar adicional. Os produtores de refrigerantes têm o compromisso de tomar novas medidas voluntárias de redução, como parte do programa de redução de calorias proposto pelo governo", acrescentou.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página