Brasil ainda está no foco da espionagem dos EUA, diz especialista

RAPHAEL HERNANDES
DE SÃO PAULO

Para o jornalista americano James Bamford, que há 35 anos acompanha a atuação da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA) e é autor de uma série de livros sobre o tema, não há indício de que a agência tenha deixado de espionar o Brasil, como veio à tona em 2013.

"É um país importante", disse em entrevista à Folha.

Bamford, que estará no Brasil para uma palestra na próxima sexta (5) no evento de cibersegurança CryptoRave, em São Paulo, afirma que, desde as revelações sobre monitoramento feitas pelo ex-analista da CIA Edward Snowden, o Brasil se mostra preocupado com espionagem e privacidade dos cidadãos.

"É um dos poucos países que tem tomado medidas mais agressivas para proteger suas comunicações."

A revelação de Snowden esfriou a relação entre os dois países, e a então presidente Dilma Rousseff desistiu de uma visita a Washington, ainda sob a gestão de Barack Obama. Entre os pontos revelados, estava que ela e outros líderes mundiais tinham as comunicações interceptadas por autoridades americanas.

Ao citar a segurança, Bamford destacou o lançamento de um satélite nacional e a instalação de um cabo submarino ligando o Brasil à Europa sem passar pelos EUA.

Ele ressalta que o país é importante para a coleta de inteligência por funcionar sua localização e porte. "São Paulo é lugar-chave para a comunicação no hemisfério Sul."

Ao comparar o recente governo de Donald Trump com os anteriores, Bamford vê sinais contraditórios.

Ao mesmo tempo em que há movimento para ampliar o poder das agências de inteligência, a gestão do republicano colocou fim à interceptação de comunicações de cidadãos americanos que mencionem algum termo relacionado a um dos adversários dos EUA ou a terrorismo.

Sobre a vulnerabilidade dos EUA a ciberataques —o país atrai especial preocupação dos demais sobretudo por causa de seu imenso setor financeiro e de operações da Defesa— Bamford se refere à relação com a Rússia como uma "ciberguerra".

"Os dois são praticamente iguais em cibercapacidade. Acho que [o cenário] ficará mais agressivo sob Trump."

Já a respeito da suposta interferência de hackers russos nas eleições americanas, o jornalista afirma que NSA tem práticas similares, embora se limite a coletar inteligência, não em manipulá-la.

Ele cita como exemplo as eleições de 2012 no México. "A população acha que a Rússia é má, mas não percebem que nós fazemos o mesmo. E com nações amigas."

COREIA DO NORTE

As operações virtuais em relação a países que têm uma relação mais hostil com os EUA, como Irã e Coreia do Norte, são em sua maioria para coleta de inteligência, diz o especialista.

"É difícil saber muito porque muito é sigiloso. O problema com a Coreia do Norte é que ela é pouco conectada com o resto do mundo, então é fácil para eles protegerem sua infraestrutura".

Há, no entanto, a especulação de que as recentes falhas em testes de mísseis promovidos pelos norte-coreanos tenha acontecida devido a um malware [programa malicioso] implantado pelos americanos, segundo Bamford.

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