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25/07/2010 - 16h13

Frida e Pagu

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MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA REVISTA sãopaulo

Surrealismo e engajamento político são dois capítulos ligeiramente obsoletos na arte moderna --salvo quando associados a dilaceramentos pessoais que dão consistência física, corpórea, à representação artística. Vem daí o estranho fascínio das foto-biografias da pintora Frida Kahlo e da escritora Patrícia Galvão (a Pagu).

Em termos estritamente estéticos, a associação entre imaginário religioso e onirismo fantástico promovida por Kahlo resulta numa repetição que deforma, sem mudar na essência, os clichês da realidade e do realismo latino-americanos: arte mimética, restrita ao plano do conteúdo, que terá seu contraponto no populismo messiânico, meio "kitsch", dos muralistas David Siqueiros, José Clemente Orozco e Diego Rivera (marido dela).

Em termos estritamente literários, Pagu passa para a história mais como musa do modernista Oswald de Andrade do que como autora de "Parque Industrial", considerado precursor do "romance proletário" no Brasil, panfleto sindical com tiques futuristas.

Sem comparar as repercussões das duas personagens (internacional no caso de Frida, local no de Pagu), não seria errado atribuí-las ao calvário pessoal por que ambas passaram. Em "Frida Kahlo: Suas Fotos", o clímax está nos registros associados ao acidente que a mutilou, nas cenas de Frida trabalhando na cama de hospital e nas naturezas-mortas fotográficas que reaparecem numa obra que utilizou a estética naïf do ex-voto para fazer do corpo martirizado seu tema.

Em "Viva Pagu", a reconstituição da trajetória da escritora e ativista nascida há cem anos inclui desenhos e manuscritos produzidos durante sua prisão na era Vargas, num contraponto político das imagens ousadas da mulher que desafiou os costumes puritanos da época.

LIVROS

FRIDA KAHLO: SUAS FOTOS
organização: Pablo Ortiz Monasterio
editora: Cosac Naify (524 págs., R$ 120)
avaliação: bom

VIVA PAGU
organização: Lúcia Maria Teixeira Furlani e Geraldo Galvão Ferraz
editora: Imprensa Oficial/Universidade Santa Cecília (348 págs., R$ 90)
avaliação: bom

conexões

filme

FRIDA
Nesse filme baseado na biografia escrita por Hayden Herrera, Salma Hayek e Alfred Molina dão vida ao casal Frida Kahlo e Diego Rivera.
direção: Julie Taymor
distribuição: Imagem (2002, R$ 14,40)
avaliação: bom

livros

PARQUE INDUSTRIAL
Publicado em 1933 sob o pseudônimo Mara Lobo, o romance polariza burgueses e proletários pelos bairros da "Pauliceia Desvairada".
autor: Patrícia Galvão
editora: José Olympio (2006, 126 págs., R$ 25)
avaliação: regular

DIEGO E FRIDA
Biografia dos artistas mexicanos escrita com a força da linguagem romanesca pelo francês Le Clézio (prêmio Nobel de literatura em 2008).
autor: J. M. G. Le Clézio
tradução: Vera Lúcia Dias
editora: Record (2010, 240 págs., R$ 39,90)
avaliação: bom

filme

EVA
Joseph Losey (Lume, R$ 44,80)
Norte-americano que se radicou na Inglaterra após ser perseguido pelo macarthismo, Losey transforma a musa da nouvelle vague Jeanne Moreau (foto) na quintessência da sedução. Com uma obsessão por dinheiro que expressa a frieza sádica com que manipula o desejo, a Eva desse filme de 1962 conduz o escritor vivido por Stanley Baker ao inferno, numa Veneza que é o avesso da "dolce vita".
avaliação: ótimo

livro

Ensaios de um catalogador do universo

Morto em 1985, o italiano Italo Calvino foi um "ensaísta", na acepção original do termo: um escritor que faz do comentário sobre uma obra de arte ou um fato cotidiano a ocasião para iluminações pessoais, divagações no limite entre ficção e reflexão.

Os ensaios de "Coleção de Areia" tratam de assuntos variados: uma exposição sobre o Novo Mundo, uma mostra de cartografia, relatos de viagem (Japão, México e Irã), uma homenagem ao linguista Roland Barthes (sob o duplo impacto de sua morte e de seu livro derradeiro). Num dos textos, ele define o historiador Mario Praz como um "catalogador universal das obras máximas, menores e mínimas nas quais a mão humana expressou a cor evidente da época e as pulsões ocultas da alma".

A descrição caberia no próprio Calvino: no texto que dá título ao livro (sobre uma "exposição de coleções estranhas"), ele faz de uma vitrine com areias de diferentes lugares uma metáfora de nosso "mundo triturado e erodido", que a inteligência especulativa tenta recompor pelo museu imaginário das palavras.

COLEÇÃO DE AREIA
autor: Italo Calvino
tradução: Maurício Santana Dias
editora: Companhia das Letras (232 págs., R$ 39)
avaliação: ótimo

 

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