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22/01/2013 - 16h03

Livro conta os cem anos da estação Grand Central Terminal, em Nova York

SAM ROBERTS
DO "NEW YORK TIMES"

Há 100 anos, em 2 de fevereiro de 1913, as portas do Grand Central Terminal, o principal terminal ferroviário de Nova York, foram abertas oficialmente ao público, depois de mais de 10 anos de construção e a um custo superior a US$ 2 bilhões, em valores atuais.

Leia segunda parte de trecho do livro
Leia última parte de trecho

O terminal nasceu da política local, da ousadia arquitetônica, do exercício impiedoso do poder pelas grandes empresas e de um projeto de engenharia visionário. Nenhuma outra edificação corporifica a ascensão de Nova York de modo tão vívido quanto o Grand Central.

Abaixo, a história de seu nascimento, um excerto do livro "Grand Central: How a Train Station Transformed America", de Sam Roberts, crítico de urbanismo do "New York Times", que sai este mês pela Grand Central Publishing.

A ideia que resultou no Grand Central Terminal ocorreu a William Wilgus "com um clarão repentino", ele recordou décadas mais tarde. "Foi a ideia mais audaciosa que já tive".

Wilgus, engenheiro chefe da New York Central Railroad desde 1899, havia supervisionado a dispendiosa reforma do Grande Central Depot, anos antes.

Nascido em Buffalo em 1865, ele estudou por dois anos com um engenheiro civil de sua cidade e mais tarde fez um curso de desenho técnico por correspondência, na Universidade Cornell. Sua criatividade lhe valeu postos cada vez mais importantes em uma sucessão de ferrovias, e por fim o posto que veio a ocupar na New York Central.

Uma colisão fatal em 1902, na qual um trem local matutino vindo de White Plains atingiu o vagão traseiro de um trem vindo de Danbury, Connecticut, que estava parado no túnel da Park Avenue, causando a morte instantânea de 15 passageiros, havia convencido Wilgus de que já não era possível operar um caótico pátio ferroviário de dois quarteirões de largura em uma área que estava se tornando o coração da maior cidade dos Estados Unidos.

Em carta de três páginas a W. H. Newman, o presidente da ferrovia, datada de 22 de dezembro de 1902, Wilgus, que então tinha 37 anos, recomendou uma solução audaciosa e extravagante: demolir a Grand Central Station existente e substituir as notórias locomotivas a vapor usadas pela ferrovia por trens elétricos.

Os avanços tecnológicos da proposta eram claros. A eletricidade requeria menos manutenção. Ao contrário das locomotivas a vapor ou, posteriormente, a diesel, os trens elétricos não necessitavam portar combustível ou maquinaria para gerar potência. A eletricidade permitia que os trens acelerassem mais rápido, o que era claramente vantajoso para um serviço de trens de subúrbio que operava principalmente com jornadas curtas.

Outra vantagem, que em retrospecto parece evidente, explica o motivo que tornou a sugestão de Wilgus tão revolucionária e, por fim, fez com que sua adoção fosse inevitável: os motores elétricos produziam menos vapores nocivos e nenhum vapor ou fumaça sufocante. Além disso, como o engenheiro explicou na carta, a eletricidade "torna desnecessários os abrigos para trens usados no passado", porque viabilizava a instalação de trilhos subterrâneos.

Sem a fumaça, a cinza e as brasas, os pátios ferroviários podiam ser expandidos sem que terrenos maiores fossem necessários, com a criação de plataformas em dois níveis, o inferior para os viajantes de subúrbio e o superior para os trens de longa distância.

Pela primeira vez, todo o pátio ferroviário, que se estendia até a rua 56, onde o labirinto de trilhos que conduziam os passageiros às plataformas convergia em quatro linhas principais, poderia ser recoberto. A "grande muralha da China" que dividia a cidade ao meio em uma extensão de 14 quarteirões poderia ser eliminada. O ar por sobre os pátios poderia ser transformado magicamente em um novo e valioso espaço para imóveis no coração de Manhattan.

Para começar, Wilgus planejava uma edificação de 12 pavimentos e 200 mil metros quadrados por sobre o terminal, que poderia gerar receita de aluguel da ordem de US$ 2,3 milhões anuais.

Essas vantagens não apenas beneficiariam "a humanidade em geral", como poderia ter dito o "comodoro" Cornelius Vanderbilt, mas além desse agradável subproduto cumpririam também a missão principal da New York Central and Hudson River Railroad, fundada por ele: a "de que garantamos que antes de tudo beneficiemos a nós mesmos".

A solução radical de Wilgus para o "problema da Park Avenue", proclamava o engenheiro, despudoradamente, "celebra o surgimento de uma notável oportunidade de promover o bem comum levando em conta o ganho privado em benefício da corporação envolvida".

O terminal, ele explicou mais tarde, poderia "ser transformado de uma agência não produtiva de transporte em uma unidade autônoma de geração de receita - uma mina de ouro, por assim dizer".

Wilgus estava pedindo aos diretores da ferrovia que confiassem muito em suas palavras. O preço projetado de US$ 35 milhões que ele calculou para todas as melhorias envolvidas no projeto equivalia a cerca de meio ano de faturamento bruto da empresa. Além disso, a ferrovia faturava a maior parte de seu dinheiro com o transporte de carga, e não passageiros.

Por que investir tanto em um projeto que só beneficiaria passageiros? Mas o engenheiro chefe foi persuasivo. Em 10 de janeiro de 1903, o conselho da ferrovia decidiu aprovar o projeto e promover Wilgus.

Seis meses mais tarde, o conselho - cujos integrantes incluíam Cornelius Vanderbilt 2º, neto do "comodoro" fundador da ferrovia, e o banqueiro J. P. Morgan - conferiu formalmente a Wilgus o poder de realizar seu plano para um terminal ferroviário digno de um rei, que serviria de portão de entrada para todo um continente, realizando sua audaciosa visão.

Antes mesmo que as escavações começassem, antes que as primeiras pedras do leito rochoso que existe sob Manhattan fossem detonadas, começaram a surgir dúvidas quanto a um contrato de demolição definido já então como maior na história da cidade. Em um terreno de sete hectares adquirido pela ferrovia, 120 casas, três igrejas, dois hospitais e um asilo de órfãos teriam de ser derrubados, assim como estábulos, armazéns e outras estruturas auxiliares.

O "New York Times" reconheceu que "para descrever o projeto, é sempre necessário usar superlativos". Seria o maior terminal ferroviário do país, com a maior extensão de trilhos internos e, além disso, geraria receita suficiente para cobrir seus custos operacionais.

Em 1906, quase dois antes que uma proibição estadual ao uso de locomotivas a vapor na área que se estende da rua 42 ao Harlem entrasse em vigor, a Central começou a operar trens elétricos na Grand Central Station então existente. (A ferrovia New Haven seguiu seu exemplo um ano mais tarde, utilizando corrente direta gerada pela Central nos trechos de trilhos equipados com terceiro trilho condutor, e usando corrente alternada transmitida por linhas elétricas posicionadas sobre a ferrovia nos trechos que ela mesma operava em Connecticut - como continua a fazer até hoje.)

Depois da eletrificação, o segundo desafio de Wilgus era como construir um terminal sem incomodar os passageiros das centenas de trens de subúrbio e de longa distância operados pela ferrovia. Superá-lo tornou necessário que a ferrovia transferisse temporariamente algumas das funções da estação para o Grand Central Palace Hotel, localizado nas imediações.

Wilgus desenvolveu uma estratégia de construção engenhosa. O árduo processo de demolir estruturas existentes, escavar rochas e terra a 30 metros de profundidade para os dois níveis de plataformas e as instalações auxiliares, demolir o imenso abrigo de trens e construir o novo terminal seria realizado em "porções" longitudinais, como ele mesmo definiu - sulcos escavados no meio de Manhattan, uma seção por vez, do leste para o oeste.

A construção levaria 10 anos, e Wilgus deixou a empresa antes da metade do processo; o custo final do projeto dobrou, para quase US$ 2 bilhões em dólares atuais.

Enquanto a construção do terminal avançava, a New York Central acompanhava com preocupação os acontecimentos do outro lado da cidade, onde sua maior rival, a Pennsylvania Railroad, estava desafiando o monopólio da Central ao enfim começar a oferecer serviço ferroviário direto para Manhattan. A Central e a Pennsylvania eram como a Coca-Cola e a Pepsi, perpétuas rivais por rotas, passageiros e mercados.

No século 19, a Pennsylvania Railroad estava em clara desvantagem na cidade de Nova York. Por não ter estação na região central da ilha, seus passageiros desembarcavam em Exchange Place, Jersey City, e eram transportados a Manhattan de barco.

Construir uma ponte que atravessasse o rio requereria um projeto conjunto com as ferrovias de Nova Jersey, mas nenhuma estava interessada. No entanto, a eletrificação tornou viável um túnel por sob o rio Hudson.

Em 12 de dezembro de 1901, pouco menos de um mês antes da colisão no túnel da Park Avenue, Alexander Cassatt, o presidente da Pennsylvania Railroad, anunciou que sua companhia construiria um túnel sob o rio e operaria trens cujo terminal seria uma grande estação controlada por ela, a ser construída nos dois quarteirões entre as ruas 31 e 33, na Oitava Avenida.

Leia continuação de trecho do livro

 

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