Ibama determina o retorno ao Brasil do porta-aviões São Paulo, barrado na Turquia

País é acusado de exportação ilegal de resíduos tóxicos no navio vendido a empresa turca

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Rio de Janeiro

O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) decidiu cancelar a autorização de exportação do porta-aviões São Paulo para a Turquia e determinou o retorno da embarcação ao Brasil.

Na sexta-feira (26), após denúncias de organizações ambientalistas sobre exportação ilegal de resíduos tóxicos, o governo turco barrou a entrada do navio naquele país por falta de informações sobre a quantidade de materiais tóxicos em sua estrutura.

O porta-aviões foi vendido pela Marinha ao estaleiro Sök Denizcilik and Ticaret Limited, especializado em desmanche de navios. O veículo deixou o Brasil no último dia 4, em viagem que vem sendo monitorada em tempo real pelo Greenpeace.

Porta-aviões São Paulo, maior embarcação que já integrou a Marinha brasileira e que foi vendido para empresa turca - Rob Schleiffert / flickr

Nesta terça-feira (30), estava em frente ao litoral do Marrocos, se aproximando do Estreito de Gibraltar.

Em ofício assinado pela coordenadora-geral de Gestão da Qualidade Ambiental, Rosângela Maria Ribeiro Muniz, o Ibama diz que "fica suspensa a autorização emitida pelo Ibama para essa movimentação, devendo o exportador brasileiro providenciar, às suas expensas, o retorno ao Brasil da embarcação".

Caso a determinação não seja cumprida, diz o Ibama, o exportador do navio fica sob o risco de incorrer em tráfico ilegal de resíduos perigosos. O navio foi exportado pela Oceans Prime Offshore, representante marítima no Brasil da Sok.

Em nota enviada por e-mail à Folha, a embaixada da Turquia no Brasil disse que o governo turco vem avisando, desde o início do processo, que o navio não entraria no país se representasse algum perigo.

Ancara chegou a emitir uma autorização para a entrada do navio, mas a decisão impunha condições, como a garantia de que a embarcação fosse inspecionada antes de chegar, de acordo com condições estabelecidas na Convenção de Basileia.

Responsável pela inspeção, a empresa norueguesa Grieg Green admite, porém, que não teve acesso a toda a estrutura e que o trabalho foi prejudicado ainda pela limitação de acesso a documentação original do navio, dada a sua idade.

No dia 4, a Justiça Federal do Rio de Janeiro concedeu liminar ao Instituto São Paulo-Foch impedindo a saída da embarcação. Ao ser notificada, a Marinha informou que o pedido não poderia ser acatado porque o navio já estava em águas internacionais.

Segundo a embaixada da Turquia, a entrada do navio no país depende de uma segunda inspeção sob supervisão de instituições independentes e da entrega de um inventário de materiais perigosos, com a exata localização de amianto e outros resíduos.

"Tudo isto poderia ter sido evitado se houvesse transparência e licitude no processo desde o início, quando houve o edital para o leilão do porta-aviões", diz a fundadora da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto, Fernanda Giannasi.

"Se o navio atracar no Rio, teremos de criar uma frente que exija transparência nas informações, inventário correto dos tóxicos e a desamiantização sob supervisão das instituições públicas e controle social em todas as etapas."

O amianto é apontado como causador de doenças como asbestose, doença crônica pulmonar de origem ocupacional, cânceres de pulmão e do trato gastrointestinal, por exemplo.

Porta-aviões era o maior navio de guerra brasileiro

O porta-aviões São Paulo foi vendido em 2021 por R$ 10,5 milhões. Era o maior navio de guerra brasileiro, com 31 mil toneladas, 266 metros de comprimento e capacidade para até 40 aeronaves. Seu armamento era composto por três lançadores duplos de mísseis e metralhadoras de grosso calibre.

Construído no fim dos anos 1950, foi batizado inicialmente de Foch e, após integrar a esquadra francesa, chegou ao Brasil em 2001. Operou até 2017, quando a Marinha decidiu se desfazer dele.

Nicola Mulinaris, diretor de Comunicação e assessor político da Shipbreaking Platform, diz que o transporte do navio desrespeita regras do acordo de Basileia, pelas falhas na caracterização dos resíduos tóxicos e por falta de aviso aos países em cujas águas ele vai navegar até chegar à Turquia.

Segundo ele, a inspeção da Grieg Green identificou pouco menos de dez toneladas de amianto no navio, enquanto um porta-aviões francês da mesma classe, chamado Clemenceau, tinha 760 toneladas.

A Oceans Prime afirmou que foi notificada e repassou à Sok. Suas atividades, diz, se resumiram "àquelas burocráticas necessárias à exportação do bem". "Esperamos que a Sok contate diretamente o Ibama ou, alternativamente, nos envie informações relacionadas ao seu ofício."

A reportagem ainda não conseguiu contato com a Sok.

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