Entenda o jargão climático usado nas discussões da conferência do clima da ONU

Glossário traz expressões como NDCs e greenwashing

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São Paulo

A COP27, conferência do clima da ONU, entra na sua segunda semana com uma série de questões em aberto. Para explicar o que está em jogo, a Folha elaborou um glossário com expressões e conceitos que mais aparecem no debate.

COP

Sigla para Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas, as COPs são encontros anuais em que os países signatários (195 mais a União Europeia) se reúnem para discutir o enfrentamento conjunto das mudanças climáticas. O evento no Egito é o 27º do tipo a ser realizado.

Ativistas fazem manifestação no centro de convenções em que acontece a COP27, no Egito - Joseph Eid/AFP

Acordo de Paris

Foi o primeiro grande acordo fechado pelos 195 países mais a União Europeia, em 2015, com a definição de que todos têm de colaborar para resolver o problema.

Um acordo anterior, o Protocolo de Kyoto (firmado em 1997), trazia obrigações de redução de emissões de gases de efeito estufa somente para os países ricos. O Acordo de Paris estabeleceu que todo mundo tem de fazer sua parte, dentro das suas próprias capacidades, de modo a alcançar um objetivo comum de conter o aumento da temperatura do planeta.

É sobre como esse acordo vai ser posto em prática que as COPs desde então têm se debruçado. Em 2021, em Glasgow, foi definido o "livro de regras" do Acordo de Paris. Para a COP27, a palavra de ordem era a "implementação" desse livro.

1,5ºC

A principal decisão do Acordo de Paris foi colocar um limite para o aumento da temperatura. O tratado estabelece a meta de "manter o aumento da temperatura média global bem abaixo de 2ºC em relação aos níveis pré-industriais e envidar esforços para limitar esse aumento da temperatura a 1,5ºC".

Os países-ilha, nações insulares que estão na linha de frente do perigo, sob o risco de desaparecer com o aumento do nível do mar, bateram o pé por 1,5ºC. A redação do acordo com os dois números foi o consenso possível para atendê-los de algum modo.

Três anos depois do Acordo de Paris, o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) publicou um relatório mostrando que esse meio grau de aquecimento fará muita diferença. Com 2ºC, os danos serão muito mais graves.

NDCs

Para conter o aumento da temperatura do planeta, a fórmula é bem conhecida: é preciso reduzir as emissões dos gases que provocam o aquecimento, os chamados gases de efeito estufa, como o CO2 (gás carbônico) e o metano. Mas em vez de estabelecer uma meta genérica de quanto deveria ser essa redução, o Acordo de Paris conta com as chamadas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas, na sigla em inglês).

Ou seja, cada país colocou na mesa sua meta própria, o quanto pode contribuir para resolver o problema.

Já em Paris, porém, ao se fazer as contas, percebeu-se que tudo o que os países estavam prometendo cortar era insuficiente para atingir a meta de conter o aquecimento e decidiu-se que elas deveriam ser atualizadas a cada cinco anos, sempre no sentido de se tornarem mais ambiciosas.

Novas promessas foram apresentadas no ano passado. Mas o cálculo mais recente, que considerou as políticas atualmente em curso e novas metas de redução de emissões, mostrou que o mundo ainda segue no rumo de aquecer 2,8°C até o fim do século.

Mitigação, Adaptação e Meios de Implementação

O Acordo de Paris se estrutura, basicamente, nesses três modos de ação. Mitigação é essencialmente reduzir o tamanho do problema com o corte das emissões de gases de efeito estufa.

As metas que cada país colocou em suas NDCs são basicamente medidas de mitigação. O Brasil, por exemplo, indicou no Acordo de Paris que reduziria suas emissões em 37% até 2025 e 43% até 2030.

Ocorre que esses gases permanecem por décadas na atmosfera – até séculos, no caso do CO2. Então muito do que foi emitido no passado vai continuar aquecendo o planeta por um tempo, de modo que muitas das mudanças climáticas já estão contratadas. Elas vão acontecer.

Então entra em cena a necessidade de se adaptar para lidar com os impactos que já estão ocorrendo ou logo virão a ocorrer.

Adaptar-se é fazer, por exemplo, infraestrutura mais resistente a chuvas extremas, a inundações. Mas tanto para reduzir emissões —mudando a matriz energética dos países para fontes renováveis— quanto para se adaptar, muitos países precisam de ajuda econômica, e aí entram os tais meios de implementação.

No Acordo de Paris ficou decidido que os países ricos contribuiriam com US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020, valor que ainda não foi atingido e já é considerado insuficiente.

Um estudo encomendado pela presidência da COP no Egito estimou que os países em desenvolvimento e emergentes —exceto a China— precisarão de mais de US$ 2 trilhões por ano para financiar o combate à mudança climática. Esse valor considerou também as compensações pelas chamadas perdas e danos.

Perdas e Danos

O problema é que o clima já está tão instável e há tantos impactos sendo causados, especialmente nos países mais pobres, que em alguns casos já não é mais possível se adaptar: o dano já está feito, e as perdas são enormes. Uma situação que se encaixa na expressão foram as enchentes no Paquistão neste ano, que levaram à morte de 1.700 pessoas e deslocaram milhões de suas casas.

"Se há alguma dúvida sobre perdas e danos [causados pela crise climática], vá para o Paquistão. Lá há perdas e há danos", afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, na abertura da COP no Egito.

Esses casos, em geral em países pobres, levaram à pergunta inevitável: quem vai pagar por isso? A expectativa é que seja criado um fundo para para as perdas e danos. Logo no início da COP no Egito, o tema entrou oficialmente na agenda, o que foi considerado um primeiro passo para que essa discussão ande.

Justiça Climática

Essa é uma expressão que ganhou força nos últimos anos e está particularmente presente na COP. A ideia vem do fato de que os impactos das mudanças climáticas atingem de forma e intensidade diferentes os distintos grupos sociais, e que as medidas de mitigação e adaptação deveriam priorizar as populações vulneráveis.

Apesar de as mudanças climáticas serem relativamente democráticas, uma vez que atingem o planeta inteiro, são os mais pobres, os negros e as mulheres os mais atingidos. Invariavelmente, os lugares mais afetados são os que menos contribuíram para causar o aquecimento global.

"Para lidar com a mudança climática, é preciso simultaneamente tratar da injustiça subjacente em nosso mundo e trabalhar para erradicar a pobreza, a exclusão e a desigualdade", define Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda, em seu livro "Justiça Climática". Um slogan espalhado pela COP do Egito é de que "não há justiça climática sem direitos humanos", em decorrência da prisão do ativista Alaa Abd el-Fattah.

Artigo 6

Esse é o artigo do Acordo de Paris que trata da ideia do mercado de carbono, um mecanismo que permita que os países cooperem entre si na implementação de suas NDCs, por meio da possibilidade de que eles comercializem seus "resultados de mitigação".

Grosso modo, a ideia é que os países que reduzam mais emissões do que os previstos nas suas NDCs possam vender esses créditos para que outro país possa cumprir também suas metas.

O artigo 6.2 trata desse comércio de emissões entre países. Já o 6.4 cria o Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável, que prevê o comércio de emissões por projetos. Ainda é preciso definir algumas regras para o funcionamento desses mecanismos. Os Estados Unidos levaram uma proposta para a COP do Egito, mas não foram bem recebidos.

Greenwashing

A expressão em inglês que pode ser traduzida como "lavagem verde" costuma ser usada para definir ações adotadas por empresas, governos e até mesmo por ONGs que parecem ambientalmente corretas, mas na prática têm pouco ou nenhum impacto.

É uma espécie de propaganda sustentável enganosa, com o intuito de se mostrar responsável em relação ao ambiente ou ao clima, mas sem resultado real. No âmbito das COPs do Clima, tem ocorrido uma enxurrada de promessas por parte de empresas e governos de zerar emissões líquidas de gases-estufa até a metade do século.

Para evitar isso, foi criado um grupo com a missão de separar o joio do trigo. O secretário-geral da ONU, António Guterres, na abertura da COP, defendeu "tolerância zero para o greenwashing na neutralização de emissões" ao divulgar "um guia prático para garantir compromissos de zero líquido confiáveis e responsáveis".

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations

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