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MPF pede que autorização para megaprojeto turístico em Boipeba seja revogada

Área do empreendimento equivale a quase 20% da ilha; empresa diz que construirá em 2% da propriedade

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São Paulo

O MPF (Ministério Público Federal) na Bahia encaminhou na terça-feira (14) requerimento para que o governo estadual revogue a licença de instalação de um megaprojeto turístico e imobiliário na Ilha de Boipeba, em Cairu (175 km de Salvador).

O órgão destaca que a região é área pública federal, em processo de reconhecimento como reserva de comunidades tradicionais.

A licença concedida pelo Inema (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos) prevê que na área de 1.651 hectares de mata atlântica sejam construídos um condomínio residencial com 67 lotes, duas pousadas (uma com 25 quartos e outra com 25 casas), infraestrutura viária, píer e pista de pouso.

A área total equivale à de dez parques Ibirapuera, em São Paulo.

Também foi autorizado o uso de dois lotes para atividades de interesse social, como centro cultural, equipamento esportivo e estação de tratamento de resíduos.

A Mangaba Cultivo de Coco, responsável pelo empreendimento, diz que o projeto foi submetido a diversos órgãos públicos e que a licença está vinculada ao cumprimento de 59 condicionantes socioambientais.

O MPF ressalta que o projeto ocupa quase 20% de Boipeba e afirma que a atuação do Inema é obstáculo ao modo de vida das comunidades tradicionais.

Os procuradores dizem ainda que o instituto foi informado da existência de áreas onde vivem povos tradicionais. Em ofício de agosto de 2022 ao Inema, a SPU (Superintendência do Patrimônio da União) da Bahia recomendou que, por isso, não fossem autorizados empreendimentos.

O líder comunitário Raimundo Siri afirma que o projeto ficará "em cima da comunidade Cova da Onça", "espremida entre o mar, a praia e o empreendimento". "A comunidade não tem como desenvolver mais, a gente não tem como mais usar o território para sobreviver", diz.

Pesca e mariscagem, conta, são duas das principais atividades na região, além do extrativismo de mangaba e do turismo ecológico.

Para ele, o projeto é para "pessoas seletas". "A tendência é a comunidade sumir do mapa e as pessoas serem substituídas por outras."

Entre os sócios da Mangaba Cultivo de Coco estão Arminio Fraga, sócio-fundador da Gávea Investimentos, ex-presidente do Banco Central e ex-colunista da Folha, e José Roberto Marinho, presidente da Fundação Roberto Marinho e vice-presidente do conselho de administração do Grupo Globo.

O sócio gestor do projeto é Marcelo Stallone, também sócio na Gávea Investimentos.

Marinho foi procurado pela reportagem por meio da Fundação Roberto Marinho, que não respondeu aos contatos. Fraga e Stallone preferiram se pronunciar em nota da Mangaba.

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Turista caminha na praia Ponta dos Castelhanos, na ilha de Boipeba, no município de Cairu (BA); mega empreendimento deve ser instalado na região - Danilo Verpa - 2.set.2018/Folhapress

A empresa, na nota, afirma que o projeto Fazenda Ponta dos Castelhanos prevê construções em menos de 2% da área total da propriedade, e supressão vegetal em 0,17%, o que garantiria "a preservação naturalmente da APA das Ilhas de Tinharé-Boipeba".

O comunicado ainda diz que, entre as condicionantes para a concessão da licença, estão a capacitação da mão de obra local, manutenção de caminhos usados pela população e livre acesso para atividades extrativistas.

Também por nota, o Inema afirma que o projeto foi licenciado "com a mais perfeita lisura e transparência".

"[O processo] pode ser considerado como um marco positivo na atividade turística da região, contribuindo para a preservação, através da ocupação controlada e ordenada", diz o texto.

Rui Rocha, agrônomo e diretor da ONG Floresta Viva, analisa que, em comparação com outros modelos de turismo de massa na região, como o existente na vila de Morro de São Paulo, o projeto pode "compor um ecossistema de turismo nesse arquipélago com resultados muito positivos".

"A preocupação com Boipeba é muito genuína, muito legítima. É um santuário. Mas eu acredito que um projeto bem desenhado pode ajudar a preservar. O que se pretende edificar é uma área muito pequena", afirma.

Já a ONG Gambá (Grupo Ambientalista da Bahia) "vê com muita preocupação a negativa do governo do estado em cumprir ou até mesmo em responder às recomendações do Ministério Público Federal".

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