Não vamos nos livrar do petróleo tão rápido, diz coordenador de rede de política climática brasileira

Em evento sobre novo relatório do painel do clima da ONU, exploração de óleo na Amazônia foi debatida

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São Paulo

O coordenador científico da Rede Clima (Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas), Moacyr Araújo, afirmou nesta segunda-feira (20) que acredita que o país não vai parar de depender do petróleo no futuro próximo.

A declaração foi dada quando ele foi questionado pela Folha sobre a aposta do governo federal na exploração de petróleo, especialmente na Amazônia.

"Nós não vamos nos livrar do petróleo tão rapidamente assim, tá? Isso é uma constatação não só do Brasil, mas do planeta", disse, durante evento para imprensa promovido pelo Instituto ClimaInfo e pela Fapesp sobre os resultados do novo relatório do painel do clima da ONU (IPCC, na sigla em inglês).

A Rede Clima tem o papel de apoiar atividades de pesquisa do Plano Nacional de Mudanças Climáticas e é vinculado ao MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação).

Plataforma de petróleo da Petrobras no meio da baía de Guanabara, no Rio de Janeiro
Plataforma de petróleo da Petrobras na baía de Guanabara, no Rio de Janeiro (RJ); governo Lula tem planos de explorar petróleo na Amazônia - Bruno Domingos/Reuters

Segundo um relatório elaborado pela Agência Internacional de Energia, para zerar as emissões líquidas de carbono até 2050, é essencial que não sejam feitos investimentos em novos projetos de extração de combustíveis fósseis. A meta é um dos passos para que seja possível cumprir o Acordo de Paris e limitar o aquecimento global a 1,5°C.

Araújo ponderou que é preciso "fazer muito esforço para diminuir a matriz fóssil", mas que o petróleo não é usado apenas para fazer combustíveis fósseis. Ele aponta que cerca de 10% da produção da indústria petroquímica são focados em plástico, número que, o pesquisador estima, deve chegar a 20% até 2050.

"Vai ser muito difícil impedir a geração [de plástico], porque ele tem aplicações que vão além de uma garrafa pet, com toda a questão cirúrgica, hospitalar etc, que depende fortemente da indústria do plástico."

O pesquisador destacou que a poluição massiva de plástico é outro problema a ser enfrentado e que esse material precisa ser reaproveitado e usado na geração de energia. "Eu acho que a gente tem que administrar essa questão", afirmou.

"Sou absolutamente contra novas explorações em áreas de elevado potencial de biodiversidade, sem que haja análise prévia etc. Mas dizer e assumir que nós vamos nos livrar do petróleo nos próximos dez, 20 anos, eu acho ilusório. É melhor trabalhar justamente essa forma de mitigar isso aí, como transformar esse excesso em energia novamente."

Ana Toni, escolhida para chefiar a Secretaria Nacional de Mudanças do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, também estava presente.

Em resposta à mesma pergunta sobre exploração de petróleo no novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), disse que é preciso elaborar planos setoriais "para fazer as difíceis escolhas sobre o que temos que abrir mão o mais rapidamente possível e as coisas que vão demorar um pouco mais".

"Em relação aos combustíveis fósseis, todas as fontes de energia têm, logicamente, impactos ambientais. O combustível fóssil é o primeiro que vamos ter que resolver, mas temos que olhar [os impactos] como um todo", afirmou, acrescentando que não comentaria sobre a exploração na Amazônia.

Um dos pontos abordados no âmbito da discussão climática é o de transição justa, ou seja, como fazer a transição energética levando em conta que nações em desenvolvimento ainda dependem de combustíveis fósseis.

Toni afirma que, no caso do Brasil, existe um problema para equacionar os aspectos econômicos, sociais e de redução de carbono e que a solução para a transição passa por uma gestão eficiente.

"Mecanismos a que talvez a gente não tenha dado tanta ênfase no passado se tornam prioritários agora, para podermos agilizar as medidas necessárias para fazer essas escolhas difíceis. Se não é o combustível fóssil na Amazônia, é o quê? Como é que a gente vai fazer com que a economia continue andando, com que a população continue sendo servida da melhor maneira possível? Essas escolhas requerem uma gestão de boa governança."

Mercedes Bustamante, presidente da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e uma das revisoras do novo relatório-síntese do IPCC, que também fez parte da entrevista coletiva, ponderou que, na transição justa, o objetivo é garantir que as pessoas empregadas pelo setor fóssil tenham capacitação e trabalho nessa transição.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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