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Barco ecológico criado em faculdade pública quer provar que Amazonas é maior rio do mundo

Três embarcações serão usadas em programa que vai mapear o rio e depois serão doadas à população ribeirinha

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São Paulo

Um grupo formado por professores e alunos das Fatecs (Faculdade de Tecnologia de São Paulo) do Tatuapé, na zona leste da capital paulista, e de Jaú, no interior do estado, estão participando da construção de três embarcações que farão parte de um programa que pretende confirmar que o Amazonas, com cerca de 7.000 km, é o rio com a maior extensão no mundo.

Um estudo do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), de 2008, aponta que o Amazonas chega a 6.992 km, superando o tamanho do rio Nilo. O rio que cruza o Egito e o Sudão tem 6.852 km de extensão.

Os barcos serão usados no programa Rio Amazonas — do Gelo ao Mar. Além de buscar a confirmação científica de que o rio é o mais extenso do planeta, a expedição vai catalogar a biodiversidade local defendendo o uso de energia limpa.

A expedição coordenada pelo navegador Yuri Sanada partirá do rio Mantaro, nascente recém-descoberta no Peru, indo até o Oceano Atlântico, em abril de 2024.

Imagem colorida mostra um barca feito em computador, na cor amarela, com um casco maior ao meio e dois menores nas laterais. Ele tem um painel solar na parte de cima.
Projeto do barco que está sendo desenvolvido pela Fatec de São Paulo para expedição no rio Amazonas - aventura.com.br no Youtube

"Sempre quis fazer um projeto diferenciado, mais científico, na Amazônia, e mostrar a realidade. [O rio Amazonas] tem muitas áreas inexploradas, então a intenção do projeto é percorrer inteiro e fazer a documentação da biodiversidade ao longo do trajeto", diz Sanada.

O principal desafio dos envolvidos na iniciativa é montar barcos resistentes com materiais acessíveis e sustentáveis.

"Participar de um projeto desse porte ajuda os alunos, principalmente na visualização da aplicação de forma prática dos conhecimentos adquiridos nas aulas", diz Alex Almeida Prado, 44, professor de construção naval da Fatec Jahu.

Além dos professores, o programa tem a participação de dois alunos do curso superior tecnológico de construção naval e outros cinco estudantes dos cursos da área naval da Fatec Jahu.

"Contatamos os alunos para trabalharem com PBL (do inglês Problem-Based Learning), aprendizagem por meio de problema. A gente apresenta o problema para os alunos, eles fazem uma pesquisa mais aprofundada, vão a campo e propõem soluções. A partir de um problema real, eles aplicam a teoria aprendida em sala de aula", explica Flávio Ventura, 43, professor da disciplina de projeto de produto.

O trabalho de construção dos barcos será dividido entre as duas Fatecs. Prado vai coordenar a montagem do casco e do motor, enquanto outros dois professores ficarão com o desenvolvimento do assento e do pedal das embarcações.

"Uma das questões principais é tentar fabricar de maneira mais limpa possível. Já tem a energia solar e a produção da energia através da pedalada, além dos materiais que serão utilizados no desenvolvimento do casco. A ideia é usar o máximo de material alternativo", diz Rosângela Monteiro dos Santos, 39, professora de ergonomia no curso de gestão de produção industrial da Fatec Jahu.

As embarcações serão do tipo trimarã, compostas de três cascos —um maior no meio e dois menores ao lado— feitos com fibras naturais, como cânhamo e juta, e resina vegetal à base de óleo de mamona. Serão movidos a energia solar e também por meio de pedais.

"Estamos vendo até que ponto a gente pode usar esses tipos de materiais ecológicos mantendo a segurança. É uma navegação longa, de quase 7.000 km, com apoio a cada 30 dias em regiões inóspitas. Temos a preocupação de usar materiais que já exista um certo conhecimento do comportamento deles. Os que a gente não tem ainda, estamos fazendo testes de resistência", diz Prado.

Por causa da duração da expedição, os professores estão trabalhando em protótipos para encontrar uma forma de adaptar o assento às necessidades da jornada.

Imagem colorida mostra três pessoas, da cintura para cima. À esquerda, o navegador Yuri Sanada segura um protótipo de um banco, feito em impressora 3D. No centro, uma mulher com as mãos na cintura observa. No lado direito, um homem com camiseta preta também olha para o objeto.
O navegador Yuri Sanada (esq.) e os professores Rosângela Monteiro e Flávio Ventura analisando a proposta de desenvolvimento do banco para o barco que fará parte do projeto Rio Amazonas - do Gelo ao Mar - Arquivo pessoal

"Não é um assento só para pedalar ou para descansar. Tem que pensar no uso durante todas as etapas, que serão meses. Tem que ficar interagindo com quem vai usar e projetando, ver quais são as necessidades e tentar resolver de acordo com o que a gente imagina que vai acontecer", diz Rosângela Monteiro.

O motor para a embarcação também está sendo projetado do zero. As peças estão sendo criadas por meio de uma impressora 3D, passarão por testes para serem fabricadas em metal e montadas na estrutura do equipamento.

"Junto com a Fatec pensamos em criar um motor nosso, que não se conecta a internet, não tenha bluetooth, mas que leve do ponto A ao ponto B. Esse motor vai custar um décimo do que custaria um importado", que estaria na casa dos US$ 5.000 (R$ 25,6 mil), diz Sanada.

Após o uso na expedição, as embarcações serão doadas para as populações ribeirinhas da região e tribos indígenas. A ideia é também doar a tecnologia desenvolvida.

"No Xingu, por exemplo, se comunicam muito por meio de barcos. Se conseguir dar para eles um motor elétrico solar ou a pedal, que eles possam ir de uma aldeia a outra, é uma mudança total na vida", diz Sanada.

A concepção dos barcos está na fase de testes com protótipos, mas a meta é fazer um material abaixo do valor de mercado. Um modelo importado, segundo Sanada, gira em torno de R$ 30 mil. Os organizadores também estão buscando parcerias para arcar com os custos.

Segundo o navegador, a expedição vai ser transformada em algumas produções, como uma websérie, um longa Imax (filmado com câmeras especiais para telas maiores que as de cinema comuns) e um documentário educacional, que deverá ser distribuído em museus de 40 países.

"Temos aprovado em lei audiovisual R$ 6 milhões para fazer o longa-metragem e produções derivadas. Mas o filme Imax, que tem coprodução internacional, [o custo] é bem mais alto. Por isso, estamos buscando esta parte do orçamento nos Estados Unidos."

Ao final da expedição, o programa deverá ter como extensão um projeto com cientistas, chamado "21 Projetos para a Amazônia no Século 21".

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