Javier Milei cruzou um oceano para participar de um comício organizado pelo Vox, partido espanhol de ultradireita que se sustenta no ressentimento contra imigrantes e em assombrações da esquerda. Além do argentino, discursaram Viktor Orbán, Marine Le Pen e José Antonio Kast. Donald Trump foi citado como herói.

A viagem foi uma jogada típica de populistas dessa espécie. Milei não teve reuniões com o governo espanhol para discutir os interesses de seu país. O argentino abraçou a ala hidrófoba da oposição, declarou guerra ao socialismo, citou suspeitas de corrupção sobre o premiê Pedro Sánchez e voltou para casa. A Espanha retirou sua embaixadora de Buenos Aires.

A crise fabricada por Milei não foi acidental. O presidente argentino buscava um palco para divulgar sua imagem e estreitar seus laços com um movimento internacional de ultradireita. O discurso foi feito na proporção de sua ambição. "Agora que sou presidente, minha responsabilidade de travar a batalha cultural é ainda maior", declarou.

A passagem pela Espanha também tinha o objetivo de agitar sua base em território doméstico, onde o personagem de Milei ainda cativa parte de uma população submetida a um ajuste econômico amargo. Ao desembarcar em Buenos Aires, ele se recusou a pedir desculpas e afirmou que voltava ao país "surfando numa onda de lágrimas socialistas".

Milei faz parte de uma categoria de governantes que se habituaram a fazer uma política externa de alta voltagem e baixo resultado. Durante a viagem, o presidente chegou a se encontrar com empresários espanhóis com investimentos vultosos na Argentina. Vários deles criticaram o ultraliberal depois dos ataques ao primeiro-ministro.

Chamado de "nossa estrela brilhante" pelo líder do Vox, o presidente argentino foi o animador de torcida ideal no momento em que o time de populistas de ultradireita ensaia uma recuperação. Essa rede de políticos aprendeu que pode agir de maneira organizada para uma disputa política que já se mostrou transfronteiriça.