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Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

Descrição de chapéu FGTS

FGTS para quem?

Qualquer reformulação do FGTS precisa estabelecer com clareza o que se quer com ele

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Em 2019 as regras do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) passaram por duas importantes mudanças. Primeiro, os trabalhadores ganharam a opção de sacar uma parte do fundo anualmente, a cada mês de aniversário. Segundo, foi permitido que esse saque-aniversário fosse usado como garantia em empréstimos. Antes disso, o saque acontecia apenas em situações específicas, como na demissão sem justa causa, por motivo de saúde grave ou para aposentadoria.

Homem consulta aplicativo do FGTS no celular - Gabriel Cabral/Folhapress

Passados quatro anos dessas duas mudanças, a opção pelo saque-aniversário e por sua antecipação se materializou de forma expressiva. Em 2023, foram R$ 14,6 bilhões na modalidade saque-aniversário e R$ 23,4 bilhões na modalidade saque-aniversário para alienação ou cessão fiduciária (isto é, aquele que é sacado para pagar empréstimos contraídos). Em perspectiva comparada, as duas novas modalidades passaram a ocupar a segunda e terceira posição entre todos os tipos de saque, atrás apenas da dispensa sem justa causa, em R$ 50,6 bilhões.

Os números mostram de forma clara que, entre deixar os recursos no FGTS e sacá-los, muitos trabalhadores preferem retirá-los de lá. Menos claro é o motivo pelo qual o fazem, o que pode estar relacionado às diversas dimensões da regra que rege o FGTS.

Nas atuais regras de remuneração do FGTS, qualquer trabalhador deveria escolher sacar o máximo possível em qualquer oportunidade. Mesmo para aqueles que desejam poupar, há investimentos tão seguros, mais líquidos e de maior retorno que o FGTS. A única explicação razoável para que alguns trabalhadores não exerçam o saque é a restrição de dois anos de acesso ao saldo do fundo em caso de demissão para os que optaram por essa modalidade.

E, embora existam bons argumentos para que o governo promova a poupança da população de baixa instrução e renda —atuando contra percepções financeiras equivocadas que se observam nesse segmento—, uma poupança forçada alta a um retorno tão baixo abusa da visão de que a atuação paternalista do Estado está lá para proteger o trabalhador.

Já com relação à antecipação dos recursos do fundo, é difícil estabelecer se a demanda por essa modalidade é impulsionada por condições adversas e necessidades urgentes que alguns trabalhadores enfrentam ou falta de entendimento sobre as consequências das escolhas financeiras que estão fazendo. A evidência recente já é capaz de estabelecer que existe uma relação entre baixa capacidade de tomar boas decisões financeiras e a adesão a produtos financeiros de alto custo.

Mas pesa a favor do uso do FGTS na garantia de empréstimos o fato de os juros praticados nessa modalidade serem regulados e se encontrarem substancialmente abaixo das praticadas em outras modalidades de crédito, que também apresentam demanda dos trabalhadores de baixa renda, apesar do altíssimo custo.

Se o que se pretende com o FGTS é estimular a poupança do trabalhador para fazer frente a demandas inesperadas, é preciso ao menos tornar os rendimentos mais atrativo para eles. Enquanto o diferencial de retornos do FGTS permanecer abaixo de retornos de referência, haverá incentivos ao saque sempre que ele for permitido. Alternativamente, se o que se pretende é que os recursos constituam reserva para aposentaria, é preciso aproximar o modelo do FGTS ao de um regime de previdência. Mas, se o que se quer é subsidiar o setor habitacional à custa do trabalhador, será preciso voltar às regras anteriores.

Qualquer reformulação do FGTS precisa estabelecer com clareza o que se quer com ele. FGTS para o quê? Ou melhor, para quem?

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