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Poeta e cronista, autor de "Esquimó" e "Perambule".

Poema do tapete

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Não sei por quê, mas sou fascinado por tapetes. Desses grandes de botar na sala, persas ou falsamente persas, com motivos intrincados que a gente nunca decifra. Rosáceas propagando galhos retorcidos de flores que se transformam em arcos que quase encostam em faixas com riscos de fósforos focinhos de felinos.

Quando era criança eu me irritava com a repetição dos padrões. De fato, eles são hipnóticos, e podem se apoderar do nosso olhar como uma música chata que invade o nosso ouvido. Mas agora eu não ligo de 
perder o controle. Fico um bom tempo olhando os tapetes que encontro por aí.

Não tenho tapete em casa. Sou muito alérgico a poeira e preguiçoso demais pra usar o aspirador. Vou ao aniversário de Maíra, e enquanto se fala de política e artes plásticas, abaixo os olhos e me deixo levar pelas cores e formas do seu tapete. Chega a ser meio alucinógeno.

Uma vez passei horas conversando com uma editora de livros em pé em cima de um tapete com bordas que pareciam ripas de madeira entalhadas (janela nova, penteadeira antiga) envolvendo um círculo felpudo de lã azul-turquesa —flocos pretos cintilantes. Foi como pisar no mapa de outro mundo. Lamentei estar no ângulo errado pra cruzar o portal.

Agora lembrei do tapete de Lebowski, o protagonista do filme dos irmãos Coen. The Dude o usava como se fosse uma rede. Deitava no seu “rug” estendido no centro da sala, acendia um baseado e imaginava uma vida melhor: voando pelo céu sem heroísmo, ouvindo Dylan entre as estrelas.

Conheço uma pessoa que reformou o apartamento inteiro, trocou todos os móveis, talheres e roupas de cama; manteve apenas um velho tapete vermelho desbotado, mas que estava com ela no pior momento da sua vida. Um tapete de confiança. 

Um tapete sentimental. Se eu fosse um sultão de mil anos atrás, ia querer só duas coisas: cavalos e tapetes. Cavalos árabes, os mais resistentes, de traços mais delicados —com um rabo que empina e tremula no ar feito bandeira no momento em que o animal começa a galopar. E tapetes na areia, sob as tendas do deserto. (Não curto dança do ventre, embora aprecie danças e ventres.)

Nem oca, nem castelo, nem cabana. Tapetes. Tapetes e toalhas, toalhas e cobertas —tecidos de seda pura. Contra a aspereza da realidade que esfola e sem a ilusão de se proteger do fim. Alívio e vulnerabilidade. Tapetes, olhos e cabelos. E corpos, que se entendem sem razão.

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