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Roteirista. Escreve para programas e séries da Rede Globo.

Término com analista

Já sofri menos com alguns finais de namoro

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Acabei de "terminar" com meu psicanalista. Já sofri menos com alguns términos de namoro.

Namoro, hoje em dia, se acaba até pelo WhatsApp. Há quem pratique um tal de "ghosting", que é o ato de simplesmente desaparecer, a ponto de a pessoa achar que o companheiro faleceu. Terminar com o analista é mais difícil. Você conta que se sente bem, mas ele sabe que você não está bem e marca outra sessão.

Meu ex (psicólogo) se chama dr. João. Muita gente chama seus analistas de Edu, Alê, até Lelê. Eu e dr. João mantínhamos uma formalidade quase cerimonial. Talvez porque ele não fosse de falar muito. Às vezes, ele deixava escapar um "por quê?" ou "nos vemos quarta". Nossa relação era perfeita. Ledo engano.

Depois do período eleitoral, passei a evitar conflitos políticos em grupos de WhatsApp, padarias e academia, onde as pessoas soltam asneiras com o mesmo critério com que decidem usar abadá para malhar. Com o aniversário do golpe de 1964, o assunto voltou a pipocar por todos os cantos. Sentia que estava me reprimindo a ponto de desenvolver um cisto interno e imaginário de desaforos.

Resolvi desabafar com dr. João. Reclamei, xinguei, chamei dr. João de João, Jo, Johnny, brother. E, justo naquele dia, dr. João, ou Jo, ou brother, resolveu falar —se é que dá para chamar de falar a grande pororoca de clichês que saiu de sua boca.

"Eu vivi naquela época e não foi tudo isso que falam." "Você acredita em tudo que lê na Folha?" "Quando o rebanho entra em pânico, se joga do precipício." "Na vida, você pode ser predadora ou presa." Fiquei com raiva, pensei em virar a mesa, não só pela opinião, mas pelo péssimo uso de metáforas do reino animal. Mas fiquei quieta, esperando o "nos vemos na quarta" dele.

No dia seguinte, mandei um WhatsApp falando que precisava de um tempo, refletir sobre a última sessão. Ele pediu para voltar e falei que ligaria para marcarmos. Nunca mais liguei. Fiz o tal do "ghosting" no dr. João.

Queria agradecer ao dr. João, que me inspirou a fazer essa coluna na Folha. Jo, eu não faleci. Só fui ali dissolver alguns cistos imaginários.

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