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A heterogênea e dispersa família dos indecisos

O indeciso está nas praças, nos bancos e farmácias, sem adesivos no peito nem bandeira na mão

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Passei a última semana à procura de indecisos. E a maior surpresa foi descobrir que eles existem de fato. Nem parece, olhando na internet. Não estão no Twitter, nem nos comentários da Folha, nem nas colunas de opinião. Não puxam hashtags pra entrar nos trending topics nem pagam anúncios pra defender a própria indecisão. São a categoria mais desunida e heterogênea desse país tão desunido e heterogêneo. Não é culpa deles. Se estivessem tão certos assim da própria indecisão, não seriam indecisos.

O indeciso está nas praças, nos bancos e farmácias, sem adesivos no peito nem bandeira na mão. Faz carinho num vira-lata de rua, atravessa a rua displicente, enfrenta, voraz, um pão na chapa.

Ilustração de Catarina Bessel para coluna de Gregório Duvivier - Catarina Bessel

Sinto inveja da concentração com que o indeciso cuida da própria vida —tão decidido. Faz tempo que nós, os decisos, deixamos de falar de outra coisa. Eu mesmo ando tão deciso que não cogito fazer outra coisa senão espalhar minha decisão aos quatro ventos. Não consigo me matricular numa academia, ler um livro até o final, assistir a uma novela. Só tenho conseguido pensar: como pode alguém não ter se decidido?

"O senhor já decidiu seu voto?", pergunto ao senhor, na saída do metrô. "Ainda não tive tempo de pensar nisso, não." Achei que ele estivesse brincando. Não estava. "Lula apoia a Nicarágua, mas Bolsonaro armou a população", disse Sergio, um homem idoso, mas atlético. "Pra mim as duas coisas são muito ruins", acrescentou. "Igualmente ruins?", pergunto. "Então, não me decidi." Queria mais tempo. O vagão chegou. Pedi seu telefone, ele me deu.

Tenho no meu telefone cinco pessoas cujo sobrenome é "indeciso". Conheci Fátima Indecisa na fila da farmácia Drogasmil de Botafogo. Seu voto tendia mais pro Lula, mas e a preguiça de votar lá do outro lado da cidade? Já Carla Indecisa queria mesmo era votar de novo na Simone Tebet. Cléber Indeciso odeia Bolsonaro, mas… No Lula não dá. Marília Indecisa anda muito pegada, e se votar no Lula vai ter que ser escondida do marido, se votar no Bolsonaro a filha nunca mais fala com ela.

Estou separando um material de decisão pra cada membro da família Indecisa. Quero contar pra Fátima que domingo vai ter passe livre, e pra Carla que a Simone pode ser ministra da Educação, pro Sergio quero contar que Bolsonaro quer liberar a caça esportiva de animais nativos, e também que eu gostei de conversar com cada um deles. Não sei se vai funcionar. Pra mim, já funcionou. Fez os dias passarem mais rápido.

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