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Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Desafio olímpico

A soma da sorte constitutiva com a circunstancial constitui problema filosófico, colocado não só ao olimpismo

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Como não queria dar uma de estraga-prazeres, esperei o fim dos Jogos de Tóquio para escrever esta coluna sobre o que os filósofos chamam de sorte moral. Não há dúvida de que os heróis olímpicos estão entre os melhores de suas modalidades e muito acima da média da humanidade. A diferença de desempenho entre um atleta de elite e um amador numa prova como a maratona é abissal e aparece não só no cronômetro mas também em parâmetros físicos como perfil metabólico e tipo de fibra muscular predominante. Boa parte disso é determinada pela genética.

É aqui que as coisas ficam interessantes. É mais ou menos pacífico entre filósofos que só podemos responsabilizar moralmente uma pessoa por ações sobre as quais ela exerce algum controle. Assim como não condenamos o motorista que atropela o sujeito que se jogou do viaduto, não deveríamos elogiar alguém pelos genes que tem. Eles são o resultado da loteria cósmica, não de mérito individual.

Genes são o ponto de partida, mas, para ser bom atleta, é preciso treinar muito e aprimorar o que a natureza deu. Verdade, mas a capacidade de dedicar-se aos treinos resulta ao menos em parte de uma combinação de genética com outros elementos que o indivíduo não controla, como ter recebido cuidados adequados na infância e ter tido a chance de iniciar-se no esporte. Os filósofos chamam isso de sorte constitutiva.

E o acaso não para aí. O desempenho de cada competidor depende de outros fatores aleatórios, que vão de como o atleta acordou no dia da prova até a velocidade dos ventos. Os filósofos chamam isso de sorte circunstancial.

Não faço essas observações para diminuir a glória dos medalhistas, mas porque a soma da sorte
constitutiva com a circunstancial constitui um tremendo problema filosófico, que desafia não só o olimpismo como também a noção de mérito, de punição, nossas intuições sobre a igualdade e até a ideia de livre-arbítrio.

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