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Escritor, doutor em ciência política pela Universidade Católica Portuguesa.

E o Oscar não vai para...

Uma lista de quem merece ganhar -e a de quem vai ganhar

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É impressão minha ou a lista dos filmes indicados ao Oscar de melhor filme é bastante pobre este ano? Obras-primas não há. Grandes filmes... talvez um. E depois há os esquecimentos imperdoáveis, como "Benediction", do sempre subestimado Terence Davies (um biopic sobre o poeta Siegfried Sassoon), e "The Northman", de Robert Eggers, um Hamlet brutal para nossos tempos brutais.

Sem falar das injustiças flagrantes: os favoritos ao prêmio raramente coincidem com aqueles que mais o merecem. Exagero meu? Não creio. Fica aí a lista clássica de quem vai ganhar os principais prêmios –e a lista paralela de quem merece ganhar. Vai uma aposta?

MELHOR ATOR

Quem vai ganhar: Brendan Fraser, em "A Baleia". Hollywood sempre gostou de ressurreições e Brendan Fraser é o ressuscitado. Como Charlie, em "A Baleia", Brendan assina um dos papéis mais emocionalmente desonestos de que há memória. A culpa não é dele; é de Darren Aronofsky, que leva Fraser aos limites da vitimização e da santidade. Nesse exercício de pornografia kitsch, não admira que o personagem, apesar da obesidade mórbida, ascenda literalmente aos céus.

Brendan Fraser no filme "The Whale", de Darren Aronofsky - Divulgação

Quem merece ganhar: Bill Nighy, em "Living". É um bom exercício comparar os personagens de Fraser e Nighy. Ambos se encontram doentes em fase terminal. Mas a contenção inteligente de Bill Nighy eleva o roteiro (mediano) de Kazuo Ishiguro a patamares de uma delicadeza comovente. T.S. Eliot já tinha avisado: "a poesia não é um modo de libertar a emoção, mas uma fuga da emoção; não é a expressão da personalidade, mas uma fuga da personalidade". Com o seu Williams, Bill Nighy constrói um poema.

Bill Nighy, de 'Living' - Chris Delmas/AFP

MELHOR ATRIZ

Quem vai ganhar e quem merece ganhar: Cate Blanchett, em "Tár". O melhor do filme de Todd Field é a personagem ambígua a que Cate Blanchett deu corpo e voz: um clichê pretensioso da alta cultura que, apesar de tudo, nutre um amor verdadeiro pela arte. Uma abusadora sexual que, confrontada com a matéria-prima dos seus crimes, encontra uma réstia de consciência. A esse respeito, como esquecer a sequência em que Lydia Tár, já caída em desgraça, é levada a uma casa de massagens de duvidosa reputação? A reação de Lydia ao ver as ninfetas dispostas a servi-la já justificava a estatueta dourada para Cate Blanchett.

Cate Blanchett, atriz de 'Tár' - Patrick T. Fallon/AFP

MELHOR ATOR COADJUVANTE

Quem vai ganhar: Ke Huy Quan, em "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo". A oscilação frenética de Waymond, dividido entre o papel do pacato marido que cuida da sua lavandaria e o intrépido guerreiro do multiverso, tem os condimentos necessários para convencer a Academia.

Quem merece ganhar: Judd Hirsch, em "Os Fabelmans". O tio Boris tem pouco tempo no filme. Mas como resistir a esta força da natureza que introduz o jovem Sammy/Spielberg na lição mais dolorosa sobre a arte? Ela será sempre, e simultaneamente, a fonte de toda dor e glória.

Judd Hirsch, que atua em "Os Fabelmans" - Mario Anzuoni - 6.nov.22/Reuters

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE

Quem vai ganhar: Jamie Lee Curtis, em "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo". Ri com ela no papel de uma justíssima burocrata do Internal Revenue Service, ameaçando os faltosos com truculência. O odor a loucura e a naftalina que ela emana é impagável, embora talvez mais apropriado num sketch humorístico do Saturday Night Live.

Quem merece ganhar: Kerry Condon, em "Os Banshees de Inisherin". Que faz esta mulher culta e sensata no desterro de Inisherin? Testemunha as metástases do desespero e do ressentimento masculinos, tentando, em vão, civilizar os homens. No fundo, não foi esse, desde sempre, o papel histórico das mulheres? Serem a última voz da razão entre o bestiário viril?

A atriz Kerry Condon, de 'Os Banshees de Inisherin' - Valerie Macon/AFP

MELHOR ROTEIRO ORIGINAL

Quem vai ganhar: Daniel Kwan e Daniel Scheinert por "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo". Alguém dizia que uma das tragédias da culinária norte-americana era combinar o incombinável, tornando os pratos doces demais, ou seja, enjoativos demais. O roteiro do filme é um desses cozinhados – uma pizza com ananás, digamos, regada com doses generosas de ketchup, onde cabe tudo: artes marciais, meditações sobre o metaverso, crise conjugal e combate à homofobia. Os americanos costumam gostar.

Quem merece ganhar: Martin McDonagh por "Os Banshees de Inisherin". A premissa é notável: o que acontece quando o melhor amigo se cansa de nós e se afasta por insondáveis razões? A resposta à pergunta vem embalada em desespero, insultos, fragilidades, mutilações e palavras de uma beleza ingênua e sofrida. Quando o melhor amigo desaparece, também desaparece uma parte de nós.

Martin McDonagh, diretor de "Os Banshees de Inisherin" - Maja Smiejkowska - 13.out.22/Reuters

MELHOR FILME

Quem vai ganhar: "Nada de Novo no Front". Adaptação do romance de Erich Maria Remarque sobre a experiência alemã na Primeira Guerra que, opinião pessoal, é melhor que o livro. Em 1914, os soldados partiram para o front com a promessa de que a guerra seria rápida –todos os soldados estariam de volta a suas casas antes do Natal. Ledo engano: a guerra durou cinco anos e ofereceu um espetáculo de destruição humana, material e espiritual que o filme de Edward Berger capta plenamente.

Quem merece ganhar: "Os Banshees de Inisherin". É também de guerra que nos fala, embora de forma indireta: a guerra entre dois homens pode ser tão violenta, cruel e insana como a guerra entre nações. Até porque ambas terminam com a evidência melancólica da inutilidade da carnificina: na Europa de 1919 e na ilha de Inisherin, ninguém escapou à urgência da conciliação.

Barry Keoghan em cena de 'Os Banshees de Inisherin' - Divulgação

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