Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Existe sim, no mundo do cinema, uma minoria não resignada

O melhor do WGA-2023 foi o discurso, quatro minutos apenas, de C. Kaufman

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Para a imprensa especializada em cinema, a maior importância do prêmio do sindicato dos roteiristas nos Estados Unidos (WGA), entregue anualmente, é o que ele sinaliza sobre o Oscar, que costuma ocorrer uma semana depois.

Neste ano, o vencedor foi o roteiro de "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo", reforçando a expectativa de que o filme de Daniel Scheinert e Daniel Kwan fature os principais prêmios neste domingo (12).

Em matéria de televisão, o WGA premiou muito bem. As melhores séries de 2022 foram "Ruptura" (drama), "The Bear" (comédia) e "White Lotus" (minissérie).


Mas o melhor da cerimônia de premiação foi um discurso de pouco mais de quatro minutos, feito por Charlie Kaufman ao receber um prêmio especial do sindicato.

Kaufman escreveu, entre outros, os roteiros de "Being John Malkovich", "Adaptação", "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças", este último premiado com o Oscar em 2005, e "Estou Pensando em Acabar com Tudo", feito para a Netflix.

Cena de 'Estou Pensando em Acabar com Tudo', novo filme de Charlie Kaufman
Cena de 'Estou Pensando em Acabar com Tudo', novo filme de Charlie Kaufman - Mary Cybulski/Netflix


Do púlpito, distribuiu bordoadas aos grandes antagonistas dos roteiristas: os executivos que comandam a indústria audiovisual. "Somos treinados a acreditar que o que fazemos é secundário em relação ao que eles fazem", começou. "Somos treinados a atender às ordens de pessoas motivadas não pela curiosidade, mas pela proteção de seus empregos".

Pegando mais pesado, avançou: "Nosso trabalho é refletir o mundo, dizer o que é verdade diante de tanta mentira. O resto é, na melhor das hipóteses, uma vitrine. E, na pior das hipóteses, ‘Triunfo da Vontade’", afirmou, citando o clássico filme de Leni Riefenstahl, de 1935, que engrandece Hitler e o nazismo.

Num tom mais pessoal, Kaufman disse que perdeu anos "buscando a aprovação de pessoas com dinheiro". E recomendou aos colegas: "Não fique preso aos números de bilheteria. Você não trabalha para este mundo. Apenas torne sua história honesta e conte-a".

E foi ovacionado ao concluir: "Eles (os executivos) nos enganaram fazendo-nos pensar que não poderíamos fazer isso sem eles. A verdade é que eles não podem fazer nada de valor sem nós".

Kaufman representa uma minoria não resignada de autores americanos. É uma turma que insiste em testar limites, ir além do esperado e fazer pensar. As três séries premiadas pelo sindicato este ano, de certa forma, fogem do óbvio, provocam e, eventualmente, deixam o espectador desconfortável.

Mas a grande maioria da produção para TV e streaming segue um padrão previsível ou, quando muito, pouco corajoso. Duas séries recentes, que merecem ser vistas, deixam esta impressão: são boas, mas poderiam ter ido muito mais longe.

"Falando a Real" (Apple) gira em torno da vida profissional e pessoal de três terapeutas interpretados por Jason Segel, Jessica Williams e Harrison Ford. Eles seguem a linha cognitiva e um deles, bem heterodoxo, envolve-se diretamente na vida dos pacientes. A série é escrita por Segel e por uma dupla que participou de "Ted Lasso", Brett Goldstein e Bill Lawrence, o que já dá uma pista do caminho que segue – excesso de otimismo e benevolência.

Já "A Nova Vida de Toby" ("Fleishman Is In Trouble", no Star +) descreve os conflitos de três amigos que estão chegando à meia-idade. Jesse Eisenberg é Toby, um médico recém separado de Rachel, uma agente de atores vivida por Claire Danes. Os amigos do protagonista são Seth (Adam Brody) e Libby (Lizzy Caplan). Taffy Brodesser-Akner, autora do romance que inspirou a série, escreveu o roteiro, que oscila entre momentos de muita sensibilidade e previsibilidade.

São, enfim, duas séries que entregam emoção e entretenimento, o que não é pouca coisa, mas deixam um gosto de quero mais.

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