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Aos cem dias, governo ainda não assumiu as rédeas da política

Brasil de Lula 3 é outro, com Congresso hostil no plenário e nos costumes

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A celebração de cem dias de governo é a celebração do espantalho. Xô Bolsonaro.

O governo federal tem agido, e bem, para reverter retrocessos obscurantistas da administração anterior. Mas isso não é obra de cem dias. A questão das armas ilustra a complexidade e o tamanho do problema.

Decreto de primeiro de janeiro de Lula suspende, por exemplo, registros para aquisição e transferência de armas. Paralisa o mercado, particularmente das de "uso restrito", cria embaraços burocráticos e institui grupo de trabalho para apresentar nova regulamentação para a lei 10.826/2003.

O recadastramento também desestimula a política armamentista. O Supremo (10 a 1) já negou vigência a decisões judiciais contrárias ao decreto presidencial: a legalidade está reafirmada.

O desafio é estabelecer estratégias para o desarmar o país. A indústria de armas é poderosa, ascendente. Segundo o Anuário de Segurança Pública, o número de registros ativos de caçadores, atiradores e colecionadores (CAC) cresceu 473,6% entre 2018 e o primeiro semestre de 2022.

É um arsenal espetacular, cerca de um milhão de armas, suficiente para armar toda a população de cidades como Niterói (RJ) e Diadema (SP), e bastante superior, em quantidade, ao número de policiais militares na ativa em todo Brasil, cerca de 406 mil agentes.

Há uma ameaça latente à segurança constitucional e democrática: 4,4 milhões em "estoques particulares", uma em cada três armas registradas está irregular.

Entre erros e acertos, os movimentos regulatórios e administrativos do Ministério da Justiça tocam em feridas verdadeiras: golpe de Estado, garimpo, terra yanomami, segurança escolar, lobos solitários, redes sociais, consumidor.

Entre erros e acertos, o Ministério da Fazenda, pelo menos no caso do "arcabouço fiscal", adota estratégia absolutamente distinta. Posterga a formalização do projeto, acena para os interesses e aplaca temporariamente a esperteza do mercado com ideia retórica, efêmera, não com o escrito jurídico, com atribuições, regras e consequências concretas.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em evento na Embaixada do Brasil em Pequim - Tingshu Wang/ Pool via AFP

Se não há o que vazar, o discurso se adapta aos acontecimentos. É como resenhar um livro não redigido, apenas idealizado. Textos de lei são objeto de todos os escrutínios, inclusive do vernáculo. Juristas existem para procurar pelo em ovo.

Compromissos eleitorais do presidente com a diversidade e com o meio ambiente também estarão em jogo.

Se Lula escolher para o Supremo Tribunal Federal mais um homem branco, cupincha ou não, manterá intacta a ridícula, cansativa e constrangedora presença desproporcional de mulheres e a absoluta ausência de gente preta. Deixará de mexer no que importa, na matemática do tribunal.

Se Lula patrocinar perfurações da Petrobras na foz do Amazonas, o portal da floresta, ou a exploração de óleo de xisto em Vaca Muerta, na Argentina, sua biografia registrará, além da culpa que já carrega por Belo Monte, uma notável indiferença ao risco de desastre ambiental e etnocida.

A Justiça Eleitoral pode declarar Jair Bolsonaro inelegível nos próximos cem dias. Mas, se a medida é profilática, justa e necessária para frear a escalada do banditismo golpista, não elimina a rejeição ao presidente Lula de parcela expressiva da população brasileira, mesmo que minoritária.

O governo ainda não assumiu as rédeas da política. O Brasil do terceiro mandato é outro. O Congresso é hostil. No plenário e nos costumes.

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