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Escritor e ensaísta, autor de "Notas sobre a Esperança e o Desespero" e “A Era do Niilismo”. É doutor em filosofia pela USP.

Culto ao feminismo, às minorias, ao 'LGBTismo' e ao identitarismo é tirania

Diante do pânico de que acusem você de racista, homofóbico, transfóbico, misógino, o melhor é se ajoelhar no altar 'woke'

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A expressão "colabô", francês na origem, se referia às pessoas que, durante a ocupação nazista na França, colaboraram com o regime invasor. Claro que quando os nazistas caíram, não só os que colaboraram com eles foram à "fogueira", mas qualquer um que tivesse um desafeto que tenha sabido usar o momento para destruir seu inimigo.

Diante da nova forma de tirania na cultura, o novo colaboracionismo se caracteriza pela submissão do pensamento à pauta "woke". Diante do pânico de que acusem você de racista, homofóbico, transfóbico, misógino, o melhor é se ajoelhar diante do altar "woke" e jurar fidelidade ao seu clero.

Ilustração de Ricardo Cammarota para Pondé de 12.ago.2024 - Ricardo Cammarota

Uma falsa suspeita de que você seja racista, homofóbico, transfóbico, misógino, destruirá sua vida se você tiver ambições intelectuais. Ou você se ajoelha ou desiste das letras e das artes. A coragem nunca foi uma virtude cultivada no meio das letras e das artes, ao contrário do que se propagandeia por aí.

"Ajoelhar-se diante do ‘wokismo’" é a imagem que a filósofa francesa Bérénice Levet usa em seu livro "La Courage de la Dissidence, l’Esprit Français contre le Wokisme" —a coragem da dissidência, o espírito francês contra o "wokismo"—, livro publicado em 2020. Evidentemente, sem tradução no Brasil.

Aqui, a imensa maioria das casas editorais ou estão atrás de best-sellers sem valor intelectual ou são aparelhos ideológicos. Vivemos uma nova onda de obscurantismo. O luto da cultura como atividade da inteligência livre está em pauta.

A tirania "woke", como afirma Levet, reúne identitarismo, culto das minorias, diversidade, crítica decolonial, culto "LGBTiste" —em francês— "black studies", feminismo.

A tese de Madame Levet é que o "wokismo" é uma forma de destruição do pensamento nas letras e nas artes que serve bem aos preguiçosos. Invenção americana, Levet lamenta que a França, imensamente rica em sua cultura, esteja se curvando à castração feminista, às obsessões de gênero e ao discurso racialista.

No caso do Brasil, como somos pobres em tudo, a tirania "woke" já garantiu o estrago da produção cultural, no mínimo, por uns cem anos.

Sua proposta é que a França e o Ocidente como um todo parem com o "mimimi" de ficar se sentindo culpado e responda, com seu repertório vasto, aos abusos do clero "woke". Este clero não representa nenhum "avanço" intelectual, se constitui apenas num violento e predador processo de reserva de mercado cultural.

No Brasil, mais uma vez, já era. Todos os níveis das produções de letras e artes estão cooptados, e quem recusar, perde emprego, perde patrocínio, perde amigos, será apagado da história da cultura. Trata-se de um dos momentos mais covardes da história do pensamento, da cultura e das artes em nosso país.

Madame Levet cita, por exemplo, a Marquesa de Sévigné (1626-1696), como sendo um exemplo da superioridade da cultura francesa sobre o "blábláblá woke". Suas cartas, escritas para a filha, representam um tesouro da análise fina da condição humana, típicas do século 17 francês. A Marquesa de Sévigné foi contemporânea de gente como Descartes, Pascal, Malebranche, Gassendi, todos grandes expoentes da filosofia francesa até hoje, e conhecia bem esse universo.

Simpática ao jansenismo —assim como Pascal que era um assumido jansenista—, a Marquesa de Sévigné detinha, como os jansenistas, um senso agudo acerca da natureza humana. O século 17 francês fundou a tradição do moralismo em filosofia, que significa uma fina anatomia da alma humana, e não "cuspir regras", como pensa o vão senso comum.

Nas palavras de Madame Levet, uma linha escrita pela Marquesa de Sévigné vale mais do que tudo nesse paradigma tirânico, sufocante e empobrecedor que é o "wokismo". E ela não para aí.

Citando Tocqueville —século 19—, Madame Levet lembra o vaticínio que o brilhante autor lançou sobre a democracia americana e seus cidadãos: paixão pela simplicidade, superficialidade e generalidades. E afirma Tocqueville: incluindo a gente das letras. Uma das vantagens do "wokismo" hoje é elevar à categoria de celebridade intelectual gente preguiçosa, travestindo-se de indignação santa.

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