Professora emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, é pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)
Os que não estavam lá
Há um significativo contingente de brasileiros em cujas vidas o Estado não está presente de maneira positiva
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
No momento mais tocante da cerimônia de posse, Lula e Alckmin subiram a rampa do Palácio do Planalto acompanhados por um menino negro, um líder indígena, um metalúrgico, um professor, uma cozinheira, um jovem com sequelas de paralisia cerebral, um artesão e uma catadora de material reciclável —de quem o eleito recebeu a faixa. O grupo simbolizava a diversidade do povo pobre, destinatário primeiro do governo encabeçado por um político de esquerda.
É justo que assim seja em um país onde a renda média per capita, em 2021, foi de R$ 1.500 e só 1% da população faturou mais do que R$ 11.300. Quando a pobreza é avassaladora —e mãe de múltiplas desigualdades—, governos progressistas devem fazer de seu combate prioridade e razão de ser.
Além do que foram os mais pobres, nos quatro pontos cardeais, os outorgantes da vitória à ampla coligação encabeçada pelo PT. Pesquisas anteriores ao primeiro turno mostraram que Lula só batia Bolsonaro entre os muitos milhões de brasileiros sobrevivendo com até dois salários mínimos.
Nem por isso cabe imaginar que a sociedade brasileira consista em um amontoado de destituídos e uma ínfima elite de endinheirados sanguessugas. Tampouco se pode conceber que um governo progressista deva única e exclusivamente cuidar dos muitos e exortar os poucos à generosidade.
Entre uns e outros, há um significativo contingente de brasileiros de variadas ocupações, em cujas vidas o Estado não está presente de maneira positiva. Em 2016, encomendei pesquisa de opinião para entender melhor esse grupo —então chamado, imprecisamente, de "novas classes médias".
Os dados mostraram que a melhora por elas percebida em sua condição, nos anos do boom petista, era atribuída ao esforço próprio, a Deus e ao apoio da família, nunca a decisões de governo. Em geral, simpatizavam com o PSDB, embora, dois anos antes, uma parcela tivesse votado em Dilma Rousseff.
Em 2022, consolidando um padrão, as sondagens eleitorais indicavam que praticamente a metade dos brasileiros com renda entre dois e cinco salários mínimos preferia Bolsonaro, enquanto 40% optavam pelo petista. De porte semelhante era a vantagem de Bolsonaro no grupo cujos ingressos superavam cinco salários mínimos (Quaest Consultoria e Pesquisa).
Embora não estivessem representados na rampa em 1º de janeiro, seria grave equívoco ignorá-los nas falas e ações de um governo empenhado em desradicalizar a vida política, o que dele demanda cuidar da qualidade da ação estatal: na segurança pública, na educação e na saúde —além da intransigência com a corrupção e o patrimonialismo no seu quintal.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters