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Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

O apetite insaciável da Netflix

Tamanho da empresa mostra que debate sobre cotas para streaming é bem-vindo

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A capa da revista The Economist desta semana recria o famoso letreiro de Hollywood, instalado no alto de uma montanha na região de Los Angeles. No lugar das nove letras que formam a palavra que virou sinônimo de indústria de cinema, a publicação estampa as sete letras da marca que hoje encarna a sua nêmesis, a Netflix.

A empresa, na visão da revista, se tornou uma indústria em si. Vários números sustentam essa ideia. A Netflix vai gastar entre US$ 12 bilhões e US$ 13 bilhões (de R$ 47 bilhões a R$ 51 bilhões) em 2018, mais do que qualquer estúdio gasta com filmes ou canais de TV investem em programação (excluindo esportes). Seus assinantes receberão 82 filmes em um ano, enquanto a Warner, o maior estúdio americano, vai lançar 23.

O cineasta Walter Salles, para quem a cota de tela no streaming é fundamental - Digulgação

A Netflix está produzindo ou adquirindo os direitos de 700 programas de televisão, nos mais diferentes gêneros. No momento, está atuando como produtora em 21 países, incluindo Brasil, Alemanha, Índia e Coreia do Sul.

Hoje ela tem 125 milhões de assinantes, o dobro do que tinha em 2014, e mais da metade deles fora dos Estados Unidos. A empresa tem valor de mercado de US$ 170 bilhões (R$ 669 bilhões) —maior do que a Disney. Dados de setembro de 2017 indicam que o consumo da programação da Netflix, via streaming, ocupa 20% do total de banda larga do mundo.

Inúmeros outros dados impressionantes são citados, mas vou mencionar apenas mais um, para terminar. A revista compartilha a previsão de um instituto de pesquisas segundo a qual a Netflix pode chegar a 300 milhões de assinantes em 2026.

Analisando esses números, a Economist observa que, diferentemente das outras quatro gigantes de tecnologia (Facebook, Amazon, Apple e Google), a Netflix não é odiada. E arrisca três razões para isso.

Primeiro, por não ter se envolvido com jornalismo (e fake news). Segundo, por não depender de publicidade (o negócio é inteiramente calcado em assinaturas). E, terceiro, por ter se tornado "verdadeiramente mundial", enquanto as outras quatro "são globais, mas inegavelmente americanas".

Por fim, a revista prospecta o futuro da Netflix. A dívida acumulada até o momento é de US$ 8,5 bilhões (R$ 33 bilhões), e a empresa informa que pretende continuar tomando empréstimos bilionários. Isso não será problema se conseguir manter o crescimento das assinaturas e elevar o preço do serviço.

Mais grave é a suspeita de que a Netflix tenha a intenção de monopolizar o setor de TV. "Isso certamente aumentaria a vigilância de órgãos de regulação sobre a companhia", prevê. Bastião do credo liberal, a publicação sugere: "Desta forma, há uma lição final que se aplica à Netflix e a todas as empresas de tecnologia. Para manter consumidores, reguladores e políticos satisfeitos no longo prazo, não existe um substituto melhor do que a competição".

O cineasta Walter Salles Jr. abordou explicitamente essa questão em entrevista à Folha na semana passada. "A cota de tela no streaming é fundamental. Considero a regulamentação do Estado absolutamente necessária —e não só no cinema. O 'laissez faire, laissez passer' significaria o fim da atividade audiovisual no Brasil."

Os bons resultados, ao menos do ponto de vista econômico, da lei que estabeleceu cotas para produção brasileira na TV por assinatura indicam que é necessário enfrentar seriamente esse assunto no Brasil. E os dados oferecidos pela reportagem da Economist sugerem que essa discussão é urgente.

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