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Mulher enfrenta périplo por aborto legal após Prefeitura de SP suspender serviço em hospital de referência

Paciente relata trauma e violência obstétrica após ter que repetir exames e consultas em outro local

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Ao menos uma mulher vítima de violência sexual que iria realizar um aborto legal previamente agendado no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, na capital paulista, teve o procedimento suspenso sem aviso prévio após a Prefeitura de São Paulo extinguir os atendimentos no local.

A descontinuidade do serviço foi revelada pela coluna no mês passado. A paciente diz que "ficou com um novo trauma" por ter que passar por todos os procedimentos necessários —exames e consultas com médicos e psicólogos— mais de uma vez. Afirma também ter sido vítima de violência obstétrica quando, enfim, conseguiu realizar a interrupção da gestação em outra unidade de saúde.

Ato pela descriminalização do aborto na avenida Paulista, em São Paulo - Bruno Santos - 28.set.2023/Folhapress

A vítima buscou o hospital Cachoeirinha pela primeira vez no dia 5 de dezembro de 2023. Após passar em consulta com médico e assistente social, o procedimento foi agendado para o dia 20 do mesmo mês. Ao chegar no local na data marcada, porém, ela foi informada de que não seria possível dar prosseguimento ao aborto devido à suspensão do serviço.

No mesmo dia, a paciente foi ao Hospital da Mulher, gerido pelo Governo de São Paulo. Lá, ela afirma ter sido informada de que teria que começar o atendimento novamente, desde o início. "Tive que relatar tudo o que passei [da violência sexual] de novo", relata ela, que pediu que sua identidade não fosse divulgada, em depoimento à coluna.

A paciente, então, buscou o Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem) da Defensoria Pública de São Paulo. No dia seguinte, o órgão enviou um ofício ao hospital pedindo a continuidade do atendimento para a interrupção legal de gestação, com aproveitamento dos exames, consultas e entrevistas já realizados, a fim de se evitar "a revitimização da paciente".

O órgão também ressaltou que a mulher é mãe de uma criança com autismo e que não possui rede de apoio.

A paciente retornou ao Hospital da Mulher no dia 27 de dezembro, para realizar, mais uma vez, as consultas e exames necessários com os profissionais de saúde. Ela diz que se sentiu desconfortável na entrevista com a assistente social.

"Sabe aquela coisa de agir como [se fosse] sua amiga, mas no fundinho está querendo te cutucar? Ela, a todo momento, falava: ‘Você sabe que você pode dar queixa, fazer um boletim de ocorrência? Você não tem culpa, mas a responsabilidade [de estar nessa situação] é sua."

No Brasil, o aborto é previsto em lei quando há risco à vida materna, em casos de estupro e de gestação de feto anencéfalo. Em um caso como o da paciente que buscou o hospital Vila Nova Cachoeirinha, não há necessidade de registro de boletim de ocorrência nem de autorização judicial.

Após a nova triagem, a interrupção da gestação ficou marcada para a última quarta-feira (3). Na data, ela chegou no hospital às 6h30 e, por volta das 10h, uma médica aplicou um comprimido em sua vagina para amolecer o colo do útero antes do procedimento.

Quando foi levada ao centro cirúrgico, por volta das 15h, a paciente diz que começou a sentir uma dor muito intensa. Ela estava de fralda e foi informada que não poderia se levantar. "Fiz xixi, mas vazou para a cama e fiquei toda molhada", conta. Ela ainda diz que pediu para uma enfermeira ajudá-la a se limpar, mas a profissional teria dito que ela não poderia se mover.

"Foi passando o tempo, sentia muito frio e comecei a chorar. Ninguém vinha perguntar nada [sobre como ela estava]", segue. A paciente conta que defecou na fralda, mas ficou com vergonha de pedir ajuda. "Pensei: ‘Se não me ajudaram com o xixi, não vão querer me ajudar agora."

Ela conta que por volta das 17h foi atendida por uma anestesista, que disse que estava com tudo preparado e esperava apenas pelo médico. Pouco tempo depois, ela teria sido levada para a sala de cirurgia. "Falei que eu sentia dor. Tremia muito de frio. Ele [médico] disse que já iria fazer o procedimento."

A dor, conta a mulher, passou com a aplicação da anestesia geral. Ela acordou no quarto, já limpa, e teve alta no mesmo dia. "Eu tenho 36 anos, mas uma menina de 12 anos, 11 anos, que chega lá, que a gente vê muito, talvez não aguente o processo que eu passei. Eu só queria fazer o procedimento, acabar com isso. E, de repente, vou ficar com outro trauma. Me senti oprimida, como se eu tivesse que desistir."

Procurada, a Secretaria Municipal da Saúde diz, em nota, que o serviço de interrupção de gravidez foi "temporariamente suspenso" no hospital Cachoeirinha "para que sejam realizados no local cirurgias eletivas, mutirões cirúrgicos e outros procedimentos envolvendo a saúde da mulher".

A pasta não informa quando a oferta do aborto legal será retomada. "As pacientes que tinham procedimento agendado foram devidamente orientadas pela equipe a procurarem, conforme escolha pessoal, um dos hospitais da rede municipal ou estadual referenciados para realizarem o procedimento de aborto legal previstos em lei", afirma ainda a secretaria.

As outras quatro instituições municipais referenciadas para os casos de aborto legal seguem realizando o procedimento, diz a secretaria. Elas são o Hospital Municipal e Maternidade Prof. Mario Degni, o Hospital Municipal Tide Setúbal, o Hospital Municipal Dr. Fernando Mauro Pires da Rocha e o Hospital Municipal Dr. Carmino Caricchio.

Em nota, a Secretaria estadual de Saúde afirma, por meio de sua assessoria de imprensa, que a direção do Hospital da Mulher está à disposição da paciente e de seus familiares para quaisquer esclarecimentos. "A unidade possui equipe médica interdisciplinar capacitada para a realização do procedimento de aborto legal", diz.

A pasta acrescenta que não compactua com nenhum caso de violência obstétrica e que não pôde apurar o caso citado por não ter o nome da paciente, que foi mantido em sigilo pela reportagem.

"Sobre o protocolo de consultas e exames relatado, o processo de interrupção de gestação cumpre a legislação vigente, que prevê documentação específica a ser preenchida pela equipe multiprofissional que acompanha o caso", afirma a pasta.

"Além disso, quando a paciente dá entrada no Hospital da Mulher, o prontuário médico precisa ser preenchido após a avaliação multidisciplinar para garantir a segurança assistencial da paciente, que tem direito a um acompanhante de sua escolha", complementa.

TERCEIRO SINAL

O ator Eduardo Martini recebeu convidados para a estreia do monólogo "Clô, Pra Sempre", em que homenageia o apresentador e estilista Clodovil Hernandes, realizada no teatro União Cultural, em São Paulo, no sábado (6). As atrizes Catita Soares e Priscila Camargo estiveram lá.

com BIANKA VIEIRA (interina), KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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