Correspondente da Folha na Ásia
Tradição de apoio eleitoral de jornais vai desaparecendo
'Ninguém sabe a diferença' entre editorial e notícia, diz jornalista; 'a cada quatro anos, nós damos um tiro no pé'
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Na campanha de 2016, dos cem principais jornais americanos, só dois publicaram editorial em apoio a Donald Trump, que venceu.
O Boston Herald, que defendia tradicionalmente os republicanos, foi um que evitou. E resolveu ir além neste ano de eleição para o Congresso, no próximo dia 8, anunciando em editorial que daqui para a frente não vai mais endossar ninguém.
Sob o enunciado "Herald apoia o povo, não os políticos", avisa: "Junto com outros jornais [do fundo Alden Global], não daremos mais endosso na corrida presidencial e na disputa cada vez mais nacionalizada para governador e Senado".
Entre os motivos, hoje "todo mundo tem opinião, mas ninguém quer ouvir o outro lado"; e "com a desinformação em alta os leitores ficam confusos sobre as diferenças entre notícia e artigos de opinião".
Chamado de "abutre" pelos cortes que impõe, o Alden Global adquiriu 200 títulos regionais ao longo da última década, entre eles Chicago Tribune, NY Daily News, Baltimore Sun e Orlando Sentinel, formando a segunda cadeia americana.
O movimento começou meses antes na maior cadeia, Gannett, de 250 jornais, entre eles o USA Today. Como noticiou o Washington Post, ela passou a "encolher radicalmente" o espaço para opinião, "até mesmo os endossos" eleitorais.
O motivo, num relatório de seus editores: "Os leitores não querem que digamos a eles o que pensar. Não acreditam que temos conhecimento para dizer a ninguém o que pensar. Nos veem como tendenciosos".
Antes até, na campanha presidencial de 2020, a rede McClatchy, do Miami Herald, e títulos regionais ainda independentes como Dallas Morning News tomaram decisões na mesma direção.
E uma pesquisa acadêmica acaba de mostrar que os jornalistas não querem mais. "Ninguém sabe a diferença" entre editorial e notícia, falou um. "A cada quatro anos, nós damos um tiro no pé."
FIM DE ERA
Na mídia americana, também estão sob ameaça os tradicionais "talk shows", que nasceram com a própria TV, tanto nas noites de semana, com opinião mais leve, quanto nas manhãs de domingo, com política. Há mudanças em andamento nas redes NBC, CBS e ABC e nos canais pagos Comedy Central e Fox News.
O crítico de TV Bill Carter, hoje na CNN, credita o fim dessa "era de ouro" à mudança gradual da TV linear para o streaming, onde o gênero não se deu tão bem.
NAS PROFUNDEZAS DA FLORESTA
No Washington Post, acima, reportagem de meses do correspondente Terrence McCoy detalha o assassinato do jornalista Dom Phillips, "meu amigo", e do indigenista Bruno Pereira.
Após "revisar os relatórios oficiais, entrevistar dezenas e viajar pelo rio Itaquaí", conclui que a "negligência do governo" proporcionou as condições para o crime.
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