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Escritor e jornalista, autor de “A Vida Futura” e “Viva a Língua Brasileira”.

Descrição de chapéu Portugal

'Miúdos' que falam 'brasileiro' em Portugal

Sucesso de youtubers nacionais entre crianças portuguesas causa polêmica

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A reportagem publicada nesta quarta (10) no Diário de Notícias de Lisboa acrescenta uma página de comédia –agridoce, mas engraçada– ao novelão dos encontros e desencontros entre as variedades de português faladas aqui e em Portugal.

"Há crianças portuguesas que só falam ‘brasileiro’", anuncia o título com alarme. O subtítulo explica: "Dizem grama em vez de relva, autocarro é ônibus, rebuçado é bala, riscas são listras e leite está na geladeira em vez de no frigorífico".

O empresário e youtuber carioca Luccas Neto, 29, posa com seu boneco  - Guto Costa/Divulgação

O curioso fenômeno que faz os miúdos soarem como pequenos brasileiros tem explicação mais simples do que aquele abordado pelo escritor português Valter Hugo Mãe no romance "A Máquina de Fazer Espanhóis". Afinal, a língua no presente caso é a mesma –ou não?

A reportagem resume assim o problema do deslocamento linguístico: "Os educadores notam-no sobretudo depois do confinamento –à conta de muitas horas de exposição a conteúdos feitos por youtubers brasileiros".

Sim, a raiz do fenômeno está naquilo que "a maioria das crianças portuguesas vê nos ecrãs de tablet, computador ou telemóvel". Luccas Neto, 36 milhões de seguidores, é citado como o principal desencaminhador linguístico de tuguinhas.

Como António, 4 anos, que "começou a dar sinais há já algum tempo. Ao princípio, a família até achava alguma piada à forma como ele falava (...). Mas à medida que o tempo foi passando, a educadora de infância começou a preocupar-se e foi dando sinais, porque o menino não conseguia dizer os r’s nem os l’s".

Claro que há muito alarmismo e superficialidade nessa abordagem –como é habitual quando o jornalismo, espelhando o senso comum, trata de temas linguísticos–, para não falar do antibrasileirismo que parece andar em alta na cultura portuguesa. De todo modo, recomenda-se pôr a questão em perspectiva.

Será que pais brasileiros deixariam de se preocupar se, num hipotético –e impensável– caso reverso de imperialismo cultural via Youtube, seus herdeiros em idade pré-escolar começassem a engolir vogais e a chamar a camisa do Flamengo ou do Corinthians de camisola?

Não acho justo acusar a reportagem do DN de xenofobia, embora ela exale sem dúvida um nacionalismo rançoso. O texto até busca algum equilíbrio por trás do ar assustado.

Seu maior mérito nesse sentido é dar voz à linguista Catarina Menezes, que relativiza o problema. "Quando eu era menina havia o mesmo pânico social com os livros do tio Patinhas, que era traduzido em português do Brasil", lembra.

A professora propõe ver no caso uma oportunidade de ampliar a consciência das novas gerações sobre a linguagem, debatendo as diferenças com naturalidade em sala de aula, "porque aí também existe uma interculturalidade que não existia".

Bingo. Como a que há na Inglaterra diante da influência avassaladora do inglês americano. Português europeu e português brasileiro são duas vertentes da mesma língua –uma falada por 10 milhões de pessoas, a outra por uma multidão mais de 20 (vinte!) vezes maior. Um amigo meu diz, com alguma maldade, que "sem o Brasil o português seria uma espécie de búlgaro".

Estamos diante de um fato que não se pode abafar, com sua história complexa –o imperialismo sempre inclui a volta do cipó de aroeira– e suas oportunidades de inseminação cultural. Aos interessados no tema, recomendo a leitura do texto integral do DN, que está aberto a não assinantes.

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