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Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Ásia

É impossível entender a China sem passar pelo Partido Comunista

Há o sentimento, ainda que alimentado pelo governo, de que a vida dos chineses melhorou e o país é mais forte

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Em viagem recente à província de Guizhou, no sudoeste da China, presenciei uma cena curiosa. Num museu, vi muitas pessoas, umas cem talvez, vestidas com um uniforme antigo do Exército Vermelho do Partido Comunista Chinês.

Jovens e idosos, mulheres e homens portavam o traje azul pastel com barras vermelhas na gola. Um quepe azulzinho ostentando uma estrela vermelha compunha o figurino. A tiracolo, usavam uma bolsa estampada com a imagem de Mao. Em 2021, celular em punho e tênis confortáveis completavam o visual do que era um grupo de turistas chineses.

Visitantes em frente a um emblema gigantesco do Partido Comunista Chinês durante um tour organizado pelo governo em Nanniwan, ex-base revolucionária do partido - Tingshu Wang-11.mai.21/Reuters

A menos de 30 dias do centenário do Partido Comunista Chinês, os jornais destacam a história revolucionária e o turismo associado a ela. Autoridades promovem o que elas mesmas chamam de turismo vermelho, que tem na cidade de Zunyi, em Guizhou, um dos seus pontos altos.

Na casa hoje transformada em museu, houve em 1935 uma reunião que consolidou a liderança de Mao Tsé-Tung, e aassim a cidade virou parada obrigatória do turismo cívico da China de hoje.

Lustrando suas credenciais revolucionárias, várias províncias têm promovido rotas turísticas temáticas. Sichuan lançou 11 circuitos sob o tópico “Revisitando o Caminho da Longa Marcha”. A cidade natal de Mao, Shaoshan, na província de Hunan, transformou-se em foco de peregrinação.

A promoção do turismo vermelho é apenas uma pequena parte da grande apoteose do centenário do partido. A festa de aniversário reforça o estranhamento e a desconfiança que há no Ocidente a respeito do modelo político chinês.

Pode ser tentador menosprezar o estilo chinês de fazer política focando-se no curioso, no excêntrico ou no caricatural. É tentador —mas enganoso– pensar que tudo se resume a propaganda.

Mesmo que alimentado pelo governo, há o sentimento de que, sob o comando do partido, a vida dos chineses melhorou e o país é mais forte.

Ademais, o partido continua a frustrar aqueles que insistem em prever seu colapso iminente. Não vai esfarelar amanhã. Ao contrário, sai fortalecido pelos resultados no combate à Covid, com seus reflexos na economia e na autoconfiança dos chineses.

A realidade é que o Partido Comunista Chinês é o centro de gravidade do poder no país. Gostemos ou não, para se ter uma noção básica da potência ascendente do nosso tempo, é preciso entender melhor o partido e sua centralidade no modelo político chinês.

China, Terra do Meio

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Para ilustrar por que isso importa, tomo emprestado um exemplo do jornalista Richard McGregor. Pense no que seria, digamos, a área de recursos humanos do partido, o Departamento Central de Organização.

Se houvesse um equivalente nos EUA, esse departamento, diz McGregor, seria responsável pelo processo de escolha dos governadores de todos os estados americanos e dos prefeitos das grandes cidades do país. Esse órgão faria a seleção dos presidentes de empresas que respondem por cerca de um quarto do PIB americano. Estaria ainda sob sua responsabilidade a escolha das chefias dos jornais e das redes de televisão do país, além de membros da Suprema Corte. Esse é, por assim dizer, o RH do partido.

Não é questão de gosto ou preferência política. Não importa o que seus instintos lhe digam sobre a peregrinação rumo à cidade de Mao ou sobre turistas vestidos de membros do Exército Vermelho. É impossível entender a China de hoje sem passar pelo Partido Comunista Chinês. Quem preferir pular esse capítulo não vai entender a história.

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