A professora Cai Xia, que atuou na Escola Central do Partido Comunista da China durante 28 anos, disse em entrevista publicada nesta terça-feira (18) no jornal britânico The Guardian que o líder chinês, Xi Jinping, enfrenta ampla oposição interna e o acusou de “matar o país”.
Cai, que segundo o jornal não está mais na China, deu a entrevista em junho deste ano, após o vazamento de um áudio no qual ela chama Xi de “chefe da máfia”, e o Partido Comunista chinês, de “zumbi político”.
“Se o Politburo [comitê executivo do partido] tem qualquer senso de responsabilidade em relação ao povo, ao país e ao partido, deveriam substituir Xi”, disse Cai na gravação, ouvida pela agência Reuters.
A professora foi expulsa do Partido Comunista nesta segunda-feira (17) em razão das declarações no áudio. Nesta terça, deu autorização ao Guardian para que a entrevista fosse publicada.
Segundo Cai, muitas pessoas de sua geração, que viveram as reformas de Deng Xiaoping, líder da China de 1978 a 1989, “sabem qual é o caminho certo e qual é um beco sem saída”.
A Escola Central do Partido, onde trabalhava, é uma instituição de ensino superior voltada para a formação política de altos oficiais do Partido Comunista. Importantes líderes chineses já foram diretores da instituição, como Mao Tsé-tung, Hu Jintao, líder do país de 2004 a 2013, e o próprio Xi.
Cai era professora da escola desde 1992, na área de políticas democráticas. “O Partido Comunista deixou de ser uma força de progresso na China e se tornou um obstáculo para o progresso”, disse ela. “Eu quis deixar o partido anos atrás, quando não havia mais espaço para falar, e minha voz era censurada.”
A acadêmica diz que Xi “matou o partido e o país” em 2018, quando aprovou a emenda à Constituição que aboliu limites de mandato e permitiu que uma mesma pessoa ficasse indefinidamente no cargo.
“Ele sugeriu a mudança e forçou o plenário nacional a aceitá-la. Mesmo com esses dois graves problemas, ninguém se opôs. O que significa que o partido não é capaz de corrigir erros.”
Cai era parte da elite política e intelectual do país. Ela é neta de um revolucionário que lutou ao lado de Mao na revolução comunista de 1949, responsável pela criação da China moderna.
De acordo com a Escola Central do Partido, Cai foi expulsa após fazer comentários “cheio de problemas políticos sérios” e que “prejudicaram a reputação do país”.
A professora disse que outros membros do partido concordam com ela, mas têm medo de falar e sofrer represálias, como acusações de corrupção. O crime pode levar à pena de morte na China.
“Em um ambiente como esse, o poder sem restrições de Xi leva a erros inevitáveis, como a resposta inicial ao coronavírus em Wuhan.” Pequim culpa políticos locais pela demora em comunicar a expansão do surto.
A expulsão de Cai é a mais recente de uma série de medidas de repressão contra intelectuais críticos ao partido e a Xi. Em julho, Xu Zhangrun, um professor de direito constitucional da universidade Tsinghua, passou dias preso após criticar o governo.
Xu publicou artigos na internet criticando o modo como o líder chinês lidou com a crise do coronavírus e a pressão de Pequim para aprovar a nova lei de segurança nacional em Hong Kong.
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