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Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Crise energética na China evidencia desafios da transição climática

País precisa de consistência entre o esforço interno e o externo, e proibição de novas usinas a carvão deve ser horizonte

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Pequim aproveitou os holofotes da Assembleia-Geral da ONU deste ano para se cacifar como potência climática. Prometeu deixar de construir usinas a carvão no exterior. Há um ano, na reunião de 2020, já havia anunciado a meta de atingir a neutralidade de carbono até 2060.

O anúncio de 2021 traz ganhos de reputação a Pequim. Na sequência dele, o secretário-geral da ONU disse que descontinuar o uso do carvão no plano global é o passo individual mais importante para atingir o objetivo do Acordo de Paris.

A decisão chinesa, claro, contribui para a redução global de emissões. E também coloca pressão para que outros países assumam mais compromissos climáticos, reforçando esse resultado.

Trabalhador em um depósito ao lado de uma mina de carvão na província chinesa de Heilongjiang - Jason Lee - 24.out.15/Reuters

Além disso, com a torneira fechando para projetos movidos a carvão mundo afora, a demanda energética dos países afetados precisa ser atendida de outra forma. Investimentos energéticos da China no exterior vão mudar. Mas a origem das empresas envolvidas, não. Empresas chinesas dedicadas a energia solar e eólica saem ganhando.

No entanto, a decisão de Pequim, focada em termelétricas no exterior, acaba por chamar a atenção para o que acontece dentro do território chinês.

É inevitável o contraste entre o novo compromisso e o uso abundante de carvão no próprio país. As usinas chinesas produziram, no ano passado, mais da metade da energia gerada a carvão em todo o mundo.

Mesmo depois do compromisso com a neutralidade de carbono, a China seguiu aprovando financiamentos, autorizando a exploração de novas minas e construindo, no país, mais usinas termelétricas –que, naturalmente, não são planejadas para durar um par de anos. Muitos questionam a credibilidade do compromisso chinês.

Para atingir a neutralidade de carbono no prazo previsto, um estudo da Universidade de Tsinghua indica que o carvão teria que responder por apenas 3% da matriz energética em 2060. Hoje, essa fatia é de quase 60%. Fontes de energia eólica e solar teriam que dar conta de impressionantes 23% e 24% da matriz. Atualmente, a fatia de cada uma delas é inferior a 4%.

Reduzir a dependência do carvão não é fácil, como a realidade teima em insistir. Poucos dias depois do anúncio climático na ONU, veio o anticlímax: começaram a aparecer notícias de racionamento de energia na China, afetando ao menos dez províncias do país.

Além da alta do preço do carvão, a crise energética estaria associada ao grau de ambição elevado das metas energéticas que Pequim definiu para autoridades locais. Para entregar resultados para o governo central, as províncias estariam controlando a oferta de energia.

A crise energética atual dá indícios do tamanho do desafio de planejar a transição climática da segunda economia do mundo e campeã global de consumo energético e emissões de CO2.

Para exercer um papel de liderança na agenda climática, a China precisa de consistência entre o esforço interno e o externo. Entre o que diz e o que faz. Entre as metas intermediárias e o grande objetivo da neutralidade para 2060.

Em 2020, Pequim prometeu controlar suas próprias emissões. Em 2021, comprometeu-se com bom comportamento no exterior. No futuro próximo, Pequim teria que proibir a construção de novas usinas a carvão dentro do país, a exemplo da promessa válida para fora do seu território.

A credibilidade da China como potência climática exige coerência. Diante do tamanho do desafio, requer também coragem e competência. Afinal, até para um partido superpoderoso, não é trivial que holofotes em Nova York contribuam para a falta de luz em Jiangsu, Guangdong ou Zhejiang.

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