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Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

Descrição de chapéu União Europeia desmatamento

Lei europeia ruim ataca comércio do Brasil, mas sabemos por que apanhamos

Norma ambiental barra exportações, mas país teria mais razão se fizesse a coisa certa

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A União Europeia vai proibir exportações brasileiras de produtos que tiveram origem em áreas desmatadas a partir do início de 2020, tanto faz se legal ou ilegalmente. Vai bater no Brasil por meio de lei que entra em vigor no início de 2025, na prática. A lei é ruim, no fundo hipócrita e serviria ainda como porrete europeu para disputas comerciais (afeta especialmente uma dúzia de países).

O Brasil, porém, sabe por que está apanhando. Além do mais, com ou sem lei europeia, conviria cumprir um programa que satisfizesse parte do teor dessas normas a fim de conter o desastre climático e suas consequências socioeconômicas.

Vista aérea de uma área da floresta amazônica desmatada por fogo ilegal no município de Lábrea, no Amazonas - AFP

O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento da União Europeia (EUDR), que se tornou lei em abril de 2023, obriga negociantes europeus a se certificar de que não compram e revendem mercadoria que teve origem em área desmatada (ou com ela foi misturada). Por ora, afeta bovinos, cacau, café, dendê, soja, borracha, madeira e certos derivados desses produtos.

Negociantes podem virar as costas a certas mercadorias até por causa do custo da certificação ou do risco de punição (multa pesada, exclusão de concorrência e financiamento estatais).O governo brasileiro pediu à UE que a lei não seja aplicada —poderia afetar até US$ 15 bilhões de exportações para lá. Em última instância, o Brasil apelaria à Organização Mundial do Comércio. Mas a OMC mais e mais se parece com o Conselho de Segurança da ONU —para inglês ver.

A lei é discriminatória, de fato, como diz o governo. País que devastou a natureza mais cedo leva vantagem. A definição de floresta é precária, para variar (pode ser abrangente demais ou incentivar destruição de vegetação que não seja "floresta"). A EUDR pode servir a mumunhas comerciais: abre-se o comércio por um acordo, fecha-se por meio de outras restrições. De resto, a norma vai ser revisada regularmente.

O Brasil pode achar outros mercados para produtos sem certificação, de resto. Pode substituir produtos: exportar o que é certificado, vender aqui o que tem origem podre.

Por outro lado, era sabido que viriam restrições a exportações sujas, do Brasil ou de outros lugares. Quanto à queixa da falta de distinção entre desmatamento legal e ilegal, talvez não faça grande diferença. A maior parte da destruição é ilegal mesmo.

O Brasil tem boas leis ambientais, como o Código Florestal de 2012. Aplicá-las é o problema, embora tenha havido progressos. Há leis e acordos no sistema de Justiça para rastrear a origem de gado, por exemplo. Mas o boi de fazenda de ruína ambiental passa pela peneira; esse bife pode estar no seu prato, hoje.

Há o CAR (Cadastro Ambiental Rural, o "CPF" das terras), ainda em diversas fases de implementação, sempre atrasada, a depender do estado. Mas o CAR é autodeclaração: falta quase toda a análise do que é de fato a terra, sua situação ambiental etc. Os programas de certificação e fiscalização de origem são poucos e precários. Há extensa fraude em ouro e madeira, por exemplo; há grande integração dos produtos do negócio do crime com o comércio e a finança "legais".

Muito importante: não temos grande plano de uso agropecuário de terras degradadas ou suficiente incentivo financeiro e técnico para executar o programa. Enfim, estamos apenas apagando incêndio. Ou nem isso.

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