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Professor titular da UFBA (Universidade Federal da Bahia) e autor de "Crônica de uma Tragédia Anunciada"

Mezzo Berlusconi, mezzo Bolsonaro, Pablo Marçal é a nova pizza eleitoral

Candidato mostra aos eleitores que a política é só uma piada infame

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São Paulo virou um circo eleitoral. No centro da arena está um personagem distribuindo currículo para ser o líder político da cidade, fazendo questão, no entanto, de deixar claro que a sua maior qualificação para o cargo é justamente não ser político e achar a política uma palhaçada.

É compreensível que São Paulo admire os bem-sucedidos. É o seu mito fundador. Por isso, o candidato esfrega na cara de todos a sua grana e os indícios de que encontrou um modelo inovador de negócios que lhe deu sucesso e merecimentos. Merece tudo, inclusive o cargo de CEO da cidade mais bem-sucedida do país.

Afinal, ele não está se candidatando a prefeito, mas a chairman da São Paulo S.A., a maior empresa do Brasil, que precisa ser resgatada da mão dessa gente torpe, despreparada e incompetente que são os políticos.

Se quem tem sucesso merece ser governador, por que quem ensina a ter sucesso —e ser "coach" é isso, certo?— não mereceria ser prefeito? Esse é um argumento de vendas pronto para ser embalado para convencer o cliente, digo, o eleitor paulistano, de que escolher alguém que conhece os caminhos para o sucesso é uma decisão valiosa.

Até aqui, a descrição se encaixa no modelo de candidatos como Collor de Mello, Silvio Berlusconi, Doria, que conquistaram cargos importantes no Executivo nos momentos em que a confiança dos cidadãos nos políticos e nas instituições era muito baixa. Mas há um segundo modelo de candidato "apolítico" no mercado eleitoral que também não fica atrás.

Esse traz como item de série atitudes irreverentes e desrespeitosas para destruir o que resta de credibilidade do sistema pelo qual concorre ao cargo público.

Digo "irreverente e desrespeitoso" por educação, mas a palavra correta e vulgar é esculhambação. Trata-se de esculhambar a política, demonstrando em cada ato o desprezo por ela e pela escória que a frequenta.

Nada disso é desconhecido. Vem da cultura pop digital da "zoeira", que combina irreverência com afronta e provocação, um humor feroz e amoral com a valorização da rapidez de raciocínio em conflitos verbais ou tretas, atitudes de desafio à correção política com a arrogância exibicionista e presunçosa que chamamos de "marra".

Quem adota esse estilo vive de cortes de vídeos em que é visto agindo de forma irreverente, destemida, desafiadora, audaciosa. Os óculos escuros, um cigarro digital e a música "Thug Life" formam o meme que se busca: um mito acabou de desferir um golpe fatal em um adversário. É uma cultura de alta energia, onde se celebra o momento em que acontece algo caótico ou exagerado, de preferência em uma briga.

O estilo "Thug Life" e "Turn Down for What" já garantiu sucesso eleitoral para muitos desde 2018. Jair Bolsonaro deixou de ser o militarzão aposentado, chato e histérico quando o universo da cultura juvenil digital percebeu que seu estilo marrento e ofensivo podia ser posto sob nova perspectiva. Foi assim que surgiram as "mitadas" —e o apelido "mito"— e as "lacradas" de 2018.

Hoje, esse padrão é visto em figuras como Mamãe Falei, Nikolas Ferreira e até Milei. Quem ainda não ouviu falar de Jordan Bardella, de 28 anos, tiktoker que é a cara jovem do partido de Marine Le Pen, ou de Alvise Pérez, de 34 anos, do Se Acabó La Fiesta, na Espanha, deve prestar atenção.

Marra, lacração, afronta, incorreção política e tretas a todo custo são um modelo de retórica e atitudes que vêm garantindo eleições, influência digital e visibilidade a radicais em todo o mundo.

Agora é a vez do grande circo do Pablo, que combina os dois modelos. É como se fosse uma mistura de Berlusconi com Danilo Gentili, de Collor de Mello com o Bolsonaro roteirizado pelo CQC.

De um lado, há o Pablo empreendedor, que vende a ideia de que não precisou das tetas de qualquer governo para ficar rico e ter sucesso, que se virou e conquistou o mundo pelas próprias mãos e que se oferece ao paulistano como modelo e farol para as aspirações mais profundas de quem vive "o corre" e as aflições de uma cidade dura e competitiva.

"Como chegar ao governo da mais importante cidade do país vindo do nada e contando apenas com esperteza, charme e truques da era digital" é simplesmente o mais novo curso à venda aos eleitores da cidade. Compre o curso e ganhe um prefeito.

E há o Pablo marra e afronta, provocador, que sem uma única ideia digna desse nome para governar a cidade mais complexa do país, mostra aos eleitores que a política é só uma piada infame, a ser tratada com o deboche que merece.

Ruim por ruim, vota em mim.

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