Após dez meses da pandemia, governo federal avalia financiar pesquisa de vacina brasileira contra Covid
Instituições nacionais têm 15 candidatas a imunizantes contra coronavírus em estudo preliminar
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
Dez meses após o início da pandemia do novo coronavírus e sem data para iniciar a aplicação de vacinas contra Covid-19 na população, o governo federal discute uma medida provisória que liberaria R$ 390 milhões para universidades e instituições completarem estudos de desenvolvimento de vacinas nacionais contra a Covid-19.
Os estudos nacionais ainda estão, em sua maioria, nos ensaios pré-clínicos (ou não clínicos). Essa etapa se limita às análises experimentais em células ou em animais, feitas geralmente antes das pesquisas em humanos (quando passam a ser executadas as chamadas fases 1, 2 e 3).
Os recursos federais, se confirmados, seriam liberados por meio de créditos extraordinários, que podem ser usados para casos urgentes e imprevisíveis (como em situações de calamidade pública).
A verba dependeria ainda de chamada pública de seleção e custearia as fases clínicas das pesquisas de vacinas contra o Sars-CoV-2 que tenham formulação desenvolvida no Brasil.
A iniciativa está sendo liderada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e discutida com o Ministério da Economia. As pastas falaram sobre o assunto em reuniões e agora discutem os detalhes em conjunto com técnicos da AGU (Advocacia-Geral da União).
O Brasil tem 15 candidatas a vacinas nacionais contra a Covid-19, segundo relatório do Ministério da Saúde concluído há menos de dois meses. Entre os desenvolvedores estão as duas principais referências do país em imunizantes, o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz.
A lista inclui também a Universidade de São Paulo, a Universidade Federal do Paraná, a Universidade Federal de Minas Gerais, a Universidade Federal de Viçosa, o Instituto do Coração e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Vacinas.
Em oito casos, os estudos já receberam recursos federais por meio de uma chamada pública anterior criada para bancar o desenvolvimento de pesquisas sobre a Covid-19.
Candidatas à vacina contra Sars-CoV-2 desenvolvidas no Brasil
Desenvolvedor | Tipo de vacina |
---|---|
Bio-Manguinhos/Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) | Vacina sintética |
Bio-Manguinhos/Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) | Vacina baseada em subunidade proteica |
Instituto René Rachou (Fiocruz/MG)/Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Vacinas (INCTV) | Vacina baseada em vetores virais |
Instituto Butantan/Dynavax/PATH | Vacina de vírus inativado (vacina inativada) |
Instituto Butantan | Vesículas de membrana externa em plataforma de múltiplos antígenos |
Instituto Butantan | Vacina baseada em partículas semelhantes a vírus |
Instituto do Coração (Incor) da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) | Vacina baseada em partículas semelhantes a vírus |
Instituto de Ciências Biomédicas da USP (Universidade de São Paulo) | Ácido nucleico (DNA) |
Instituto de Ciências Biomédicas da USP (Universidade de São Paulo) | Vacina baseada em nanopartículas |
Instituto de Ciências Biomédicas da USP (Universidade de São Paulo) | Vacinas baseadas proteína recombinante |
UFV (Universidade Federal de Viçosa) | Vacinas baseadas proteína recombinante |
Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP (Universidade de São Paulo) | Vacina baseada em nanopartículas |
UFPR (Universidade Federal do Paraná) | Vacina baseada em nanopartículas |
UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) | Ácido nucleico (DNA) |
Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP (Universidade de São Paulo) | Vacina baseada em vetores virais |
Fonte: Ministério da Saúde. |
Segundo o governo, os recursos discutidos agora para as pesquisas nacionais são necessários porque a maioria não teria capacidade de avançar para a fase clínica sem parcerias com empresas. O dinheiro garantiria a participação de uma companhia brasileira para produzir os lotes para os ensaios clínicos.
O governo pediu à Academia de Ciências Farmacêuticas do Brasil um parecer para discutir os valores. A entidade estima serem necessários entre R$ 20 milhões a 30 milhões para os ensaios clínicos das fases 1 e 2 e de R$ 250 milhões a 320 milhões para a fase 3. de casa teste
O Ministério da Ciência espera apoiar até três projetos nas fases 1 e 2 e pelo menos um na fase 3.
A visão da pasta é que o desenvolvimento de uma vacina nacional eficaz e um consequente avanço tecnológico no assunto poderia mitigar o impacto da pandemia do coronavírus, impedir futuras epidemias, e ainda daria ao Brasil posição de destaque e de referência na área.
Os valores discutidos, porém, são ínfimos comparados ao dinheiro investido por outros países no desenvolvimento de imunizantes. Só os EUA investiram mais de US$ 10 bilhões (R$ 50 bilhões) no desenvolvimento de vacinas.
Já a União Europeia investiu mais de € 500 milhões (R$ 3,1 bilhões) para financiar as vacinas em desenvolvimento. Os países dentro do bloco, além disso, também fizeram aportes próprios. A França e a Alemanha injetaram recursos em seus próprios laboratórios, Sanofi Pasteur e Curevac, na ordem de € 200 milhões (R$ 1,2 bilhão) e € 300 milhões (R$ 1,8 bilhão), respectivamente.
Por sua vez, o consórcio Covax Facility, da Organização Mundial da Saúde (OMS), que visa garantir acesso mais equitativo das vacinas aos países, também planeja angariar US$ 2 bilhões (R$ 10 bilhões) para cumprir seu objetivo.
Até mesmo a farmacêutica Sinovac, responsável pela Coronavac, testada no Brasil sob a liderança do Instituto Butantan (parceria que resultará em transferência de tecnologia para a entidade) recebeu um investimento bem superior ao planejado pelo governo Bolsonaro. Foram mais de US$ 500 milhões (R$ 2,5 bilhões) para impulsionar o imunizante.
O investimento pesado foi um dos responsáveis pela possibilidade de um rápido desenvolvimento e teste das vacinas, que já começaram a ser aplicadas em milhões de pessoas em diversos países, como EUA e Reino Unido, e até mesmo em vizinhos latinos, como Chile e México.
Além disso, o Brasil já assinou compromisso para comprar algumas centenas de milhões de doses de vacinas, que já tiveram seu desenvolvimento acelerado desde logo depois do início da pandemia.
O Ministério defende ainda a necessidade de autonomia para enfrentar a Covid-19. "O apoio ao desenvolvimento de uma vacina nacional é fundamental na busca por autonomia tecnológica de nosso país", afirma a pasta em documento obtido pela Folha.
A pasta argumenta também que o país é hoje muito dependente da importação de bens para lidar com a crise. "Em diversas ocasiões, a exemplo do que aconteceu com a escassez de testes diagnósticos e ventiladores no início das ações de enfrentamento da Covid-19, foi possível perceber que estamos demasiadamente dependentes da importação de produtos para a saúde", afirma o texto.
Segundo a pasta, a não edição da medida pode impedir os ensaios clínicos e, consequentemente, interromper o desenvolvimento de uma vacina nacional contra a Covid.
A ideia foi ventilada após o governo ter editado uma medida provisória há menos de duas semanas liberando R$ 20 bilhões em créditos extraordinários para assegurar recursos para a compra de vacinas e também para despesas com insumos, logística, comunicação e outras necessidades para a imunização.
Apesar das iniciativas, o Brasil ainda não iniciou a vacinação contra a Covid-19. Na última semana, o governo de São Paulo anunciou que a Coronavac (desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac) teve eficácia superior a 50% nos testes feitos em parceria com o Instituto Butantan e terá registro pedido à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Enquanto isso, países latinos como Chile, México e Costa Rica já iniciaram a imunização da população. No mundo, Reino Unido, Estados Unidos, Canadá, Arábia Saudita, Rússia, Israel e Suíça também já começaram a vacinar. Nos EUA, mais de 1 milhão de americanos já receberam a primeira dose da vacina em dez dias de campanha.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters