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Com construção sui generis, 'Lincoln no Limbo' alcança plenitude no final

Romance rendeu a George Saunders Man Booker Prize em 2017

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O presidente Abrahan Lincoln - AFP

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São Paulo

Mil oitocentos e sessenta e dois. Num momento em que os Estados Unidos convulsionam com a Guerra Civil, morre, de febre tifoide, o filho de onze anos do então presidente Abraham Lincoln.

Com sua construção sui generis, “Lincoln no Limbo” —um Lincoln que pode ser tanto o pai quanto o filho— se revela aos poucos, alcançando a plenitude nas últimas linhas.

O limbo em que o pequeno Willie Lincoln se encontra está mais próximo da ideia do purgatório cristão do que da concepção budista do pós-morte, como sugeriria o título original do romance. Com um sincretismo autorizado pelo registro literário, tudo indica que a etapa seguinte não será o renascimento, mas a eternidade.

O pai também se vê em um limbo, mas de luto e indecisão. Se a Guerra Civil prosseguir, milhares de jovens terão o mesmo destino de Willie. A escolha, no entanto, envolve algo muito maior do que a mera unidade de uma nação.

Para fornecer a dimensão aproximada do que deve ter sido o impasse de Lincoln, Saunders insere excertos de jornais e livros —reais e inventados— que retratam e avaliam a figura e o governo do ex-presidente.

Esses excertos são contraditórios, revelando diferentes pontos de vista sobre os contextos e situações do livro. O mesmo acontece no limbo em que está Willie: cada espectro tem uma voz única, que se sobrepõe à dos outros em um diálogo contínuo e cheio de camadas.

Esses espectros raramente chegam a um consenso, mas são capazes de unir forças por uma causa comum. Um dos momentos mais bonitos do livro mostra o alcance e o poder das vozes que, juntas, tentam persuadir Abraham Lincoln a fazer o que é necessário —no caso, deixar o filho partir.

É claro que essa união alcança resultados imprevistos, igualmente nobres. Efeitos que terão impacto no mundo real, onde, sabemos, houve o mesmo tipo de união de forças. 

Enquanto os personagens-espectros do limbo metafísico se veem às voltas com as consequências das escolhas que fizeram em vida, Lincoln-pai, em um daqueles momentos decisivos de uma trajetória, se prepara para as consequências futuras.

“Como eu poderia (ou qualquer um de nós) ter feito outra coisa senão aquilo que, na época, realmente fizemos?”, pergunta um espectro. É a questão central do romance. 

Estamos unidos pelo sofrimento, é o que conclui um “destruído, perplexo, humilhado, diminuído” Abraham Lincoln. O presidente se torna “menos rígido por causa [da perda do filho]”, ao mesmo tempo em que se faz “bastante poderoso”.

Por que poderoso? Porque é capaz de sentir empatia e comiseração. É o sofrimento extremo que garante, simultaneamente, a dimensão humana e a mítica de uma figura agigantada e cristalizada pela História. Com os recursos e perspectivas adotados por Saunders, é como se as duas imagens finalmente se encontrassem: a do grande homem e a do homem de carne e osso

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