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'O Homem do Norte' se perde entre os urros de um viking meritocrata

Novo filme de Robert Eggers faz banho de sangue com tintas de 'Hamlet', mas diálogos ruins não ajudam jornada de vingança

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O Homem do Norte

Avaliação: Ruim
  • Quando: Estreia na quinta (12)
  • Onde: Nos cinemas
  • Classificação: 18 anos
  • Elenco: Alexander Skarsgard, Nicole Kidman e Anya Taylor-Joy
  • Produção: EUA, 2022
  • Direção: Robert Eggers

A primeira questão que suscitam os filmes de mitologia contemporâneos diz respeito à sua cor. A tonalidade geral varia entre o bronze e o chumbo. As variações privilegiam uma gama que vai do marrom ao amarelo. O azul é raro e o vermelho quase inexiste.

Não é um detalhe. Em "O Homem do Norte", novo filme do diretor Robert Eggers, de "A Bruxa" e "O Farol", o sangue jorra abundante. Cabeças são cortadas, barrigas são abertas, mas nem assim o vermelho aparece. Estamos em território viking. Ali, um rei guerreiro é traído pelo irmão —Fjölnir, "o bastardo". Amleth, o filho, de não mais de dez anos, jura vingar o pai e parte para o exílio.

Alexander Skarsgård em cena do filme 'O Homem do Norte', de 2022, dirigido por Robert Eggers - Divulgação

Vale a pena aproveitar a sugestão shakespeariana do nome Amleth. De fato, existe algo de podre naquele reino nórdico. Talvez sejam os diálogos. Entre os vikings se fala de maneira solene, embora o essencial pareça ser a capacidade dessa gente de emitir urros. Eles urram para odiar, urram para lutar, urram para matar. Costumam urrar também quando matam um inimigo e bebem o seu sangue.

O urro corresponde, no mais, às metáforas animalescas que representam. O rei morto é um corvo, cujo espírito aparece providencialmente de tempos em tempos para livrar a cara do filho. Amleth vestirá a pele de lobo em dado momento e ela terá repercussões no futuro.

Aos fatos. Depois de adulto e bombado, Amleth decide que é hora de preparar sua vingança. Descobre que Fjölnir foi deposto e se refugiou na Islândia, ainda mais ao norte, com família e corte. Ele se dispõe a ser escravizado para melhor se aproximar do tio que usurpou o seu trono.

Cada etapa de sua preparação é regada a sangue, claro, embora nem o sangue seja vermelho. No mais, algumas surpresas existem ao longo da trama, mas não chegam a transformar nada de significativo. A sede de vingança de Amleth permanece intacta e, para executar seu plano, conta com a ajuda de uma bela jovem, por quem se apaixonará e será mútuo e tal e coisa.

O intrigante em "O Homem do Norte" é saber a que corresponde essa vingança. A um juramento feito ao pai, sem dúvida. Mas, à parte isso, estamos diante de um herói sem outro tipo de substância.

Seu desejo de vingança não tem transcendência. Ele não pretende, por exemplo, fazer o bem a populações maltratadas. Não importa a mínima liberar os homens e mulheres escravizados. Ele o fará apenas na medida em que isso convenha a seus planos. Muito menos deseja instaurar justiça.

Por que luta, afinal, Amleth? Ele é o homem que precisa superar as adversidades para se afirmar no mundo. Ele precisa vencer, eis o essencial. Transposto para nossos dias, esse homem seria um empreendedor, o sujeito que luta para não naufragar num mundo hostil e precisa (ou deseja) demonstrar, a si mesmo, o seu valor.

Amleth é, afinal, um meritocrata, um príncipe destituído que deve demonstrar o valor da monarquia —ou melhor, a virtude de seu sangue. Por isso se preocupa com o prosseguimento de sua linhagem, e com efeito a sua amada Olga terá filhos gêmeos —que poderão dar sequência à saga de Amleth, caso o filme emplaque e se transforme numa franquia.

À inacreditável platitude do roteiro corresponde uma encenação que se dedica, basicamente, a gerenciar os urros e massacres que se organizam em torno do neomonocromatismo que caracteriza o cinema comercial "de grande espetáculo" na era digital. Para resumir, "O Homem do Norte" são duas horas e tanto de intenso sofrimento.

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