'Todas as Flores' termina perdida e longe de ser a nova 'Avenida Brasil'
Último episódio foi a coroação da reta final cheia de saídas fáceis e mal explicadas, com uma trama despida de lógica
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O que era para ser a "Avenida Brasil" da época do streaming —a julgar pela trama bem amarrada e os personagens nuançados— acabou com a luz opaca de "Segundo Sol", a esquecível novela que João Emanuel Carneiro levou ao ar há cinco anos.
Naquela ocasião, a novela prometia contar a história de um decadente cantor de axé que, após ser dado como morto, se tornava um mito. E se via preso nessa trama. No entanto, o que a novela entregou foi a história de uma marisqueira que era injustamente acusada de um crime, fugia e voltava para reconquistar o amor dos filhos.
No caso de "Todas as Flores", primeira novela produzida exclusivamente para o Globoplay, deveríamos acompanhar a história de Maíra, vivida por Sophie Charlotte, uma garota com deficiência visual que, ao tomar contato com a mãe, Zoé, feita por Regina Casé, vê sua vida —e inocência— ruírem diante de uma série de armações e injustiças que a separam do amado Rafael, interpretado por Humberto Carrão, e o filho, Rivaldinho. O nome do rebento é uma homenagem ao pai da jovem, Rivaldo, papel de Chico Diaz, assassinado por Zoé.
Tudo foi muito bem na primeira fase da trama de João Emanuel Carneiro, que culminou no juramento de vingança de Maíra, criação sensível do autor e Sophie Charlotte.
A vilã Zoé tinha o mesmo nível de complexidade de Carminha, a malvada de Adriana Esteves em "Avenida Brasil", e vivia dividida entre as filhas boa e má —no caso, Vanessa, brilhantemente interpretada por Letícia Collin do início ao fim da novela.
De origem pobre, Zoé havia conhecido só o pior da vida e no contato com Maíra passou a se contestar se o mundo era assim um lugar tão ruim para se viver.
O mesmo se pode dizer de seu amante e comparsa Humberto, um dos melhores personagens da novela, papel de Fábio Assunção. Garoto que saiu da Gamboa, bairro do centro do Rio de Janeiro, mas nunca a tirou de si, também vivia em constante conflito entre sua ganância e suas origens, seu vazio interior e a necessidade de ser amado.
Como a dupla principal de vilões, Caio Castro também conduziu bem um personagem ambíguo, Pablo, que tinha características semelhantes às do pai —Humberto, no caso.
Os três, porém, foram apenas exceções.
A prometida vingança de Maíra, afinal, nunca aconteceu de fato. Pior que isso —a personagem se pôs como injustiçada por um crime que de fato cometeu, no caso a compra de uma criança.
Por sua mal explicada operação para voltar a enxergar, a novela perdeu um diferencial e um ponto positivo, que era a forma como abordava a questão da deficiência visual, explorando as histórias e a sensibilidade das personagens, sem panfletagem e moralismo.
Uma das melhores personagens da primeira fase, a excelente Mauritânia de Thalita Carauta, tinha tudo para se tornar uma figura inesquecível da galeria de personagens da teledramaturgia. Mas foi relegada a um triângulo amoroso sem graça com um par romântico sem química com o garoto Javé, vivido por Jhona Burjack, e a filha Brenda, papel de Heloísa Honein.
A atriz Susy Rego, que vivia Patsy, também acabou sem história na segunda fase, depois de oferecer excelentes momentos junto de Mauritânia. Uma pena. Foi uma volta bem-vinda.
Diego, interpretado por Nicolas Prattes, sem função, apesar da excelente caracterização do ator, foi parar na tal "fazenda". E lá ficou.
Nada, porém, superaria os capítulos finais —atenção para eventuais spoilers—, sobretudo para o último capítulo, que foi ar na noite desta quinta-feira, ao vivo, na plataforma de streaming.
Vanessa —que era cômica, mas realista— virou uma espécie de Flora, a personagem de Patrícia Pilar em "A Favorita", ao ponto de quase enforcar a mãe. Por dinheiro, faz sentido ela torturar. É do seu caráter. Mas tendo o dinheiro?
Embora Regina Casé não tenha deixado a peteca cair, assim como Letícia Collin, foi difícil aceitar a sucessão de transformações pelas quais Zoé passou de uma cena a outra. Do arrependimento a tudo que fizera a Maíra à traição para, em seguida, confessar todos os seus crimes. Um pouco mais de sutileza, tempos estendidos e cenas que a mostrassem em conflito teriam dado alguma verossimilhança.
O final também se perdeu em cenas explicativas e soluções fáceis, que não haviam sido plantadas antes, como o desenlace amoroso entre Darci, vivido por Xande de Pilares, e dona Darci, papel de Zezeh Barbosa.
Zoé e Vanessa, ao fim, acabaram como duas batedoras de carteira. Apesar da Fundação —a organização de tráfico humano que Zoé chefiava continuar em plena atividade. Por que optar por uma atividade mais arriscada e menos lucrativa? Como diria a Glória Pires, "não sou capaz de opinar".
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