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Morgana Kretzmann narra a luta ambiental com realismo mágico

Cinematográfico, 'Água Turva' traz narrativa rápida e tensa sobre mulheres fortes em conflito com poderosos

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Talita Almeida

Água Turva

Avaliação: Ótimo
  • Preço: R$ 79,90 (272 págs.); R$ 39,90 (ebook)
  • Autoria: Morgana Kretzmann
  • Editora: Companhia das Letras

Os detalhes minuciosos de como cada personagem se porta, se veste e está inserido nos espaços despertam, já no início de "Água Turva", a possibilidade de se posicionar como telespectador e conduzem a uma leitura de pouco respiro.

A obra 'Jaguari', de Iberê Camargo, de 1954, que ilustra a capa do livro 'Água Turva' - Fundação Iberê/Divulgação

A partir da construção mitológica da experiência de viver ao redor do Parque Estadual do Turvo, no Rio Grande do Sul, bem na fronteira com a Argentina, o segundo romance de Morgana Kretzmann se destaca pela escolha de dialogar diretamente com as experiências sociais e políticas do Brasil, a serviço de seu tempo.

O enredo aposta na catarse das relações de disputa de território envolvendo mágoas e paixões familiares, expressões da religiosidade local e a interferência de políticos corruptos nas riquezas naturais das cidades interioranas. É fácil espelhar as personagens mais desprezíveis do livro em personalidades típicas do governo brasileiro.

Afinal, a obra gira em torno da construção de uma hidrelétrica a partir de um complexo jogo de poderes que envolve políticos ind ecorosos, de Brasília até o município gaúcho fictício de Dourado, cidadãos "de bem" e empresários da cidade e um grupo de caçadores e contrabandistas, os "Pies Rubros".

Das tentativas de emplacar um projeto arquitetado para desviar dinheiro e que ameaça o parque, conhecemos as histórias de Chaya Sarampião, guarda-florestal que tem na proteção daquele espaço e do legado de seu antepassado um motivo para existir; Preta, prima de Chaya e chefe dos Pies Rubros, também da família Sarampião, e Olga, assessora parlamentar de Afrânio Eichma, deputado que personifica o típico sujeito machista, grosseiro e criminoso dentro das instituições públicas.

Essas três mulheres têm um passado em comum, são filhas daquela cidade e, cada uma a seu modo, acharam maneiras de sobreviver à realidade que lhe foi imposta pela herança familiar.

Olga vai embora desprezada pelos conterrâneos e rejeitando tudo o que viveu até a faculdade, Chaya dá a vida para preservar a natureza conquistada por Sarampião, ancestral da família que desaparece no Parque do Turvo; e Preta responde a sua raiva liderando um grupo de contrabandistas desertoras, criado por sua avó.

As construções mais poéticas da narrativa estão nas manifestações de crença em Sarampião, uma entidade respeitada pela população de Dourado e que se manifesta pelo vento e pelas águas do Salto do Yucumã.

A escritora Morgana Kretzmann, autora de 'Água Turva' - Jardiel Carvalho/Folhapress

É por meio do realismo mágico que a história cria conexões com uma religiosidade comum na América Latina, espaço de pertencimento e identificação para os que têm raízes apartadas dos grandes centros urbanos.

Passado e presente se intercalam nos capítulos, mostrando a construção íntima dos conflitos sociais e existenciais dessas mulheres, sua coragem e a força revolucionária de mudança quando, juntas, se unem para derrubar os donos do poder e honrar sua terra.

Se Kretzmann, vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura em 2021, expressa na linguagem literária uma crítica contundente e ecológica, é na formulação da força das mulheres e seu envolvimento com uma comunidade transcendentalmente ligada à floresta, aos animais e aos saberes de seu povo que a decadência da política brasileira é exposta.

Na capa, a reprodução da tela "Jaguari", de Iberê Camargo, acolhe bem o espírito do livro, dando pistas de sua força e intensidade simbólica. Os conflitos cinematográficos convocam a uma leitura curiosa para os que não conhecem sua ambientação, atentos a sua fauna e flora e ao paralelo inevitável com a realidade nada fantástica do Brasil recente.

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