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Artes Cênicas

Boa diversão, 'Gianni Schicchi' e 'Turandot' têm irregularidades

Em cartaz no Theatro São Pedro, dobradinha com Puccini e Busoni exibe os engenhos do teatro com mesmo elenco

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'Turandot' e 'Gianni Schicchi'

Avaliação: Bom
  • Quando: Qua. (7) e sex. (9) às 20h; dom. (11) às 17h
  • Onde: Theatro São Pedro - r. Barra Funda, 171, São Paulo
  • Preço: R$ 40 a R$ 120
  • Classificação: 14 anos
  • Elenco: Giovanni Tristacci, Marly Montoni, Rodrigo Esteves, Raquel Paulin
  • Direção: Ira Levin e Alexandre Dal Farra

O pedido de aplausos feito pelo protagonista, gesto final da comédia "Gianni Schicchi", em cartaz no Theatro São Pedro, está previsto no libreto, "com a licença do grande pai Dante".

De fato, a história musicada por Giacomo Puccini sobre texto de Giovacchino Forzano, inspira-se no canto 30 do "Inferno" da "Divina Comédia", de Dante Alighieri, onde o charlatão Schicchi é punido por ter ajudado a família a falsificar o testamento de Buoso Donati, o qual antes de morrer havia deixado toda a sua grande fortuna para a igreja.

Cena da montagem de 'Turandot/Gianni Schicchi', no Theatro São Pedro - Íris Zanetti/Divulgação

Com extrema habilidade, Puccini (1858-1924) caracteriza —praticamente só com a música, auxiliada tão só pela movimentação cênica dos cantores— a hipocrisia dos familiares, que passam rapidamente da tristeza fingida pela perda do patriarca à especulação sobre o destino da herança. Como diz Zita (a contralto Nathália Serrano), num dos momentos mais divertidos, "quem diria que, quando Buoso fosse ao cemitério, haveria choro de verdade!"

O modo como o compositor ironiza os clichês do gênero talvez já fosse suficiente para minar qualquer preconceito que alguém pudesse ter contra óperas. Uma das mais cultuadas árias de toda tradição lírica, "O Mio Babbino Caro" (Oh meu papai querido), se cantada fora do contexto da peça pode provocar lágrimas; dentro da história, entretanto, deixa um sorriso desconfortável, entre o impacto deslumbrante da música e a percepção de que o canto de Lauretta (a soprano Raquel Paulin) não passa de chantagem emocional de uma filha adolescente sobre seu pai. Para fazer isso tudo, Puccini não precisa nem de dois minutos.

Antes de "Schicchi" é apresentada "Turandot" – não confundir com a ópera de mesmo nome, mas muito mais famosa, do próprio Puccini –, de Ferruccio Busoni (1866-1924), compositor italiano que viveu boa parte de sua vida em Berlim. Pianista conhecido por uma famosa transcrição para o instrumento da "Chaconne" de Bach (original para violino), teve uma outra ópera, "Arlecchino", apresentada em 2017 no mesmo Theatro São Pedro.

A ópera de Busoni é uma versão mais curta e menos badalada da história da bela princesa chinesa Turandot (papel de Marly Montoni) que submete seus inúmeros pretendentes a três enigmas desafiadores (o fracasso era punido com a morte).

A dobradinha em cartaz tem direção musical de Ira Levin e direção cênica de Alexandre Dal Farra. A movimentação dos cenários deixa entrever as estruturas, mostra o "teatro do teatro", o engenho da fantasia, a amplitude do palco. A música é conduzida com fluência, atenta às ironias.

Em alguns momentos, no entanto —sobretudo em "Turandot", quando coro está no palco— parece faltar destaque visual para os solistas, como se som e imagem das personagens se desconectassem.

A ideia de usar o mesmo elenco nos dois títulos pode ter desfavorecido uma maior especialização dos cantores em seus personagens e, no geral, o desenho vocal do espetáculo careceu de homogeneidade e refinamento.

Projeção, vibrato, timbre e equilíbrio poderiam ser mais trabalhados, não só individualmente, mas nas diversas combinações vocais. Isso, no entanto, não impediu que alguns cantores, sobretudo do elenco masculino —se tomarmos a formação da estreia— pudessem mostrar sua qualidade vocal e cênica.

O tenor Giovanni Tristacci, no papel de Kalaf, foi o destaque em "Turandot" – obra de sentimentalidade estranha, e que não deixou marcas profundas, em especial após "Gianni Schicchi"; já nesta última, a participação do barítono Rodrigo Esteves no papel título foi segura e marcante.

Já faz tempo que nos acostumamos a ver em cena o baixo Saulo Javan. São, ao longo de décadas, dezenas de papéis diferentes, aos quais empresta sua voz de rara beleza, sempre com preparação impecável, domínio preciso do estilo, pronto para emocionar ou fazer rir.

A essa lista podem ser somadas agora as duas personagens que interpreta com categoria na presente montagem: Altoum (em "Turandot"), e Simone (em "Schicchi"). A cena lírica brasileira no século 21 não seria a mesma sem sua presença.

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