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Gustavo Alonso

Rock in Rio põe à prova a resistência do Rio de Janeiro ao sertanejo

Sob influência indireta de Bruno Mars, festival se abre para a música mais tocada do Brasil depois de quatro décadas

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Gustavo Alonso

Doutor em história, é autor de 'Cowboys do Asfalto: Música Sertaneja e Modernização Brasileira' e 'Simonal: Quem Não Tem Swing Morre com a Boca Cheia de Formiga'

Se o Rock in Rio precisou de quase 40 anos para se abrir para a música sertaneja, com a sua próxima edição, os sertanejos já superaram suas dificuldades com o rock desde a década de 1960. Foi quando Leo Canhoto & Robertinho incorporaram guitarras, baixo e bateria nas músicas do sertão, sob influência dos Beatles e da jovem guarda.

Nos anos 1980, era comum os sertanejos gostarem de rock e pop. Morto em junho, Chrystian, que fez dupla com o irmão Ralf, uma vez disse que tinha todos os dicos de Led Zeppelin e dos grupos Pantera e Metallica em casa. Zezé Di Camargo, do duo com Luciano, também já declarou seu fanatismo por bandas como Scorpions e Bee Gees.

Chitãozinho, Junior Lima, Luan Santana, Simone Mendes, Ana Castela e Xororó em montagem de Marcio Sampaio - Adriano Vizoni/Folhapress, Eduardo Knapp/Folhapress, Marcio Amaralph/Divulgação, Rodolfo Magalhães/Divulgação

O primeiro Rock in Rio, aliás, influenciou os sertanejos. Em 1985, quando esses artistas começavam a fazer shows em estádios Brasil afora, o festival inaugurou um padrão de excelência inédito. Chitãozinho & Xororó, em ascensão, prestaram atenção na parafernália que os gringos levavam aos palcos para reproduzir tudo em suas apresentações.

A influência continuou nos anos 2000, com os sertanejos universitários. Mateus, da dupla com Jorge, e Hudson, que canta com Edson, tocam guitarra o tempo todo no palco. Hudson, aliás, toca a mesma guitarra de Slash, uma Gibson Les Paul, enquanto Mateus empunha uma Fender Stratocaster, o modelo que foi imortalizado por Jimi Hendrix.

Mas nada disso importava para os organizadores do Rock in Rio, já que o sucesso comercial contínuo dos sertanejos sempre incomodou o Rio de Janeiro. É compreensível. O Rio construiu sua identidade desde o século 19 como o farol cultural do país, especialmente em relação à música popular. Maxixe, choro, samba, bossa nova, MPB, todos foram gêneros formatados a partir da capital fluminense.

Mas, a partir dos anos 1990, a música popular passou a vir de outros cantos. Axé e arrocha baianos, pagode paulista e mineiro, manguebeat pernambucano, funk paulista, forró eletrônico cearense e tecnobrega paraense despontaram e fizeram hits sem bater continência para os cariocas.

O fato de artistas de todos esses gêneros já terem se apresentado no Rock in Rio é uma prova da resistência do Rio aos sertanejos, algo que também se traduz em números.

No YouTube, nenhum dos dez artistas mais ouvidos na capital fluminense nos últimos 12 meses é sertanejo. Já na capital paulista, quatro artistas são desse gênero, segundo a Chartmetric, empresa americana que coleta dados dos serviços de streaming para profissionais da indústria.

Michel Teló, por exemplo, só conseguiu fazer seu primeiro show no Rio dias antes de partir para uma turnê internacional no rastro do sucesso mundial de "Ai Se Eu Te Pego".

A resistência era uma política de Estado. Em 2006, Luiz Paulo Conde, que já havia sido prefeito e vice-governador do Rio de Janeiro, foi empossado secretário de Cultura do estado pelo então governador Sérgio Cabral. Foi quando ele disse que gosta "de música, mas música de qualidade, seja popular, seja erudita, tudo menos Sula Miranda e Chitãozinho & Xororó".

"Essas coisas passam ao largo. Não quero nem saber. São Paulo deu uma contribuição negativa à cultura brasileira com esse ‘folk fake’, música caipira que não tem nada a ver com a cultura do país", disse.

Até o ano passado, os produtores do Rock in Rio, que são os mesmos do The Town, em São Paulo, tinham uma aversão semelhante. Até que o cantor americano Bruno Mars, que faz sucesso reproduzindo os passinhos de Michael Jackson, incluiu os sertanejos no festival paulistano. Nas duas noites em que se apresentou, o tecladista de Mars, John Fossitt, levantou o coro ao tocar a melodia de "Evidências", clássico de Chitãozinho & Xororó.

Foi só então que os organizadores se deram conta de que o sertanejo, há décadas a música mais tocada do Brasil tanto nas rádios quanto nas plataformas de streaming, é incontornável.

No dia 21 de setembro, o chamado "Dia Brasil", com a presença apenas de artistas nacionais em shows divididos por gênero, acontecerá a estreia do sertanejo no Rock in Rio. Haverá um show coletivo de Chitãozinho e Xororó, Junior Lima, Ana Castela, Luan Santana, Simone Mendes e a Orquestra Sinfônica Heliópolis.

Se por um lado demorou demais para incorporar os sertanejos, por outro, quando o fez, o Rock in Rio acertou ao prestar atenção ao fato de que o gênero não é uma coisa só e tem suas divisões e nuances.

Chitãozinho & Xororó acabaram de celebrar 50 anos de carreira. Luan Santana faz parte da geração universitária, que surgiu na primeira década do século. Simone Mendes foi figura importante do feminejo surgido a partir de 2015, que alargou fronteiras do gênero tradicionalmente machista. E Ana Castela, de meros 20 anos, é a grande estrela do agronejo, vertente eletrônica que vem sendo tanto contestada quanto aplaudida dentro das searas do sertão.

A ver como essa salada geracional representará a música sertaneja nos palcos do maior festival de música do Brasil.

Para Sempre Sertanejo

Avaliação:
  • Quando: Sáb. (21), às 21h10, no palco Mundo do Rock in Rio
  • Onde: Cidade do Rock
  • Preço: R$ 795, à venda em rockinrio.com

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