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'Big techs' só se sustentam com poder dos governos, diz autor

Em livro, escritor extermina clichês vendidos pela indústria de tecnologia

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São Paulo

Em uma palestra recente num evento sobre algoritmos em Utrecht, na Holanda, Evgeny Morozov, 34, escritor e doutor em história da ciência por Harvard, pediu que a plateia avisasse caso ele não chegasse a uma agenda positiva até o fim de sua apresentação.

"A reclamação mais comum que ouço é que pinto uma fotografia escura em uma sala escura e nenhuma luz de intervenção positiva emerge. Digo que o tempo acabou e vou embora", disse. Em quase uma hora e 30 minutos de palestra, disponível no YouTube, pouco tempo foi dedicado à esperança.

Morozov se concentra na desconstrução de conceitos como sociedade digital, vendidos por empresas de tecnologia dos EUA da China.

Em seu terceiro livro, "Big Tech, a Ascensão dos Dados e a Morte da Política", uma coletânea de ensaios, à venda a partir deste sábado (8) no Brasil, o intelectual bielorrusso não critica apenas Uber, Google, Facebook ou Airbnb, mas a própria contracultura tecnológica americana, cujo ideal de libertação do capitalismo, nos anos 1990, se deu pelo consumo.

Como progressista radical, a maior – talvez única– saída para Morozov é que as ameaças capitalistas sejam contidas por políticas de governo que equalizem os benefícios gerados pelo "extrativismo" de dados pessoais. 

O clichê de que os dados pessoais são o petróleo do século 21 só faz sentido para Morozov se for levado em conta o fato de que a história da matéria-prima no século 20 é marcada por violência e guerras e pela "derrubada de regimes democráticos na expectativa de assegurar o controle de recursos estratégicos".

À Folha o escritor fala sobre a conjuntura guiada por empresas de tecnologia e fundos de investimentos do Oriente, mas dá poucos sinais de luz.
 

 

Qual termo incomoda mais: economia compartilhada, sociedade digital ou cidades inteligentes? 
Definitivamente, sociedade digital. É desconectado de uma forma histórica, econômica e geopolítica de enxergar a tecnologia. Abraça a suposição de que as coisas estão melhorando, de que há só uma direção a seguir e de que ou você se torna digital ou é contra o progresso. As big techs [grandes empresas de tecnologia] americanas e chinesas se portam como as guardiãs dessa sociedade, mas o fato de serem representativas têm muito mais a ver com o poder político de Washington e Pequim.

Sua crítica, então, é sobre o capitalismo?
Sim. Quando você fala de tecnologia, tem que falar em dinheiro, poder, finanças, recursos e capitalismo. O capitalismo não é estático, é completamente diferente do dos anos 1950. Minha pesquisa foca muito em como fundos financeiros determinam a relação dessas empresas com seus funcionários. 

Pode dar um exemplo?
O Uber do futuro é completamente automatizado e feito para minimizar despesas. Ele hoje é financiado por fundos de governos da Arábia Saudita, Qatar e Japão. Em 2017, deu US$ 4,5 bilhões de prejuízo. Obviamente é um modelo que não pode continuar, e a única forma de acabar com isso é automatizando. Pode ser automatizado, mas o ideal seria colaborar com a economia local e com os passageiros, beneficiar quem criou a base de dados para gerar a automatização que vai dar dinheiro para a Arábia Saudita e os EUA. 

As pessoas querem a opção de trabalhar no Uber, não veem problema nisso.
Preço baixo um dia custará caro. Será um cálculo parecido com o que fazemos com os recursos naturais. Em um país do tamanho do Brasil, há mais poder de ditar os termos. O governo não vai entrar na infraestrutura do Uber, mas pode exigir que os dados não sejam de propriedade exclusiva das empresas, pode usá-los para incentivar o desenvolvimento de apps locais, cobrar uma taxa extra. O Uber não vai continuar empregando brasileiros desempregados por muito tempo.

O escritor bielorusso Evgeny Morozov, que lança no Brasil o livro "Big Tech" - Leonardo Cendamo - set.2016/AFP

Como as pessoas podem ter soberania sobre seus dados?
Isso virou um mercado, é para ricos. Nos últimos anos, foi vendido que a única soberania que as pessoas alcançam é via consumo. Se você é muito preocupado com a privacidade, tem que investir. Quero evitar um mundo em que precisamos pagar por privacidade. 

Como enxerga a Europa nesse sentido?
A Europa está menos envolvida em transformar os dados de cidadãos em produtos de inteligência artificial, está deixando essa discussão para trás enquanto EUA e China desenvolvem infraestrutura e serviços. No longo prazo, só regulação não contribuirá para a proteção de privacidade. A mudança não virá das big techs ou da pressão de outras grandes empresas de manufatura, mas obviamente do movimento de cidadãos e de planos de governo que assumirem essa agenda e entenderem a importância dos dados no futuro do desenvolvimento econômico e da democracia.


Big Tech, Ascensão dos Dados e a Morte da Política
Evgeny Morozov, ed. Ubu, R$ 49,90, 192 págs.

MAIS VENDIDOS

Veja livros que se destacaram na semana

TEORIA E ANÁLISE

1º/-  Scrum, Jeff Sutherland, ed. LeYa, R$ 34,90
2º/2º Rápido e Devagar, Daniel Kahneman, Ed. Objetiva,  R$ 62,90
3º/-  Arriscando a Própria Pele, Nassim Nicholas Taleb, Ed. Objetiva, R$ 54,90
4º/4º  Marketing 4.0, Philip Kotler, Hermawan Kartajaya e Iwan Setiawan, ed. Sextante, R$ 49,90
5º/5º Menos Estado e Mais Liberdade, Donald J. Boudreaux, Faro Editorial, R$ 24,90


Prática e Pessoas

1º/1º  Pai Rico, Pai Pobre, Robert T. Kiyosaki e Sharon L. Lechter, ed. Alta Books, R$ 65
2º/2º A Sutil Arte de Ligar o F*da-se, Mark Manson, Ed. Intrínseca, R$ 29,90
3º/3º Me Poupe!, Nathalia Arcuri, Ed. Sextante, R$ 29,90, 
4º/5º  O Poder da Ação, Paulo Vieira, ed. Gente, R$ 29,90
5º/5º Seja Foda!, Caio Carneiro, Ed. Buzz, R$ 39,90

Lista feita com amostra informada pelas livrarias Curitiba, da Folha, da Vila, Saraiva e Argumento; os preços são referências do mercado e podem variar 
 

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