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Turismo em favelas cariocas incentiva empreendedorismo social

Trabalho dos guias locais extrapola passeios e ajuda a conectar outros segmentos da economia nas comunidades

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São Paulo

Conhecida por suas praias, monumentos históricos e pontos turísticos, a cidade do Rio de Janeiro também tem visto um crescente interesse por suas favelas. Moradores dessas comunidades empreendem na área do turismo, atraindo a curiosidade dos visitantes e movimentando a economia local.

De acordo com o Anuário do Turismo de 2023, da prefeitura do Rio de Janeiro, as favelas do Vidigal e da Rocinha aparecem na 13ª e na 19ª posição, respectivamente, no ranking de visitas a atrativos turísticos e culturais da cidade.

Os números do anuário foram coletados a partir do sistema GEOData da operadora telefônica Claro, que determina a origem do celular do turista e a sua localização no Rio de Janeiro. A captação do sinal de uma chamada ou de um SMS ou do tráfego de dados do aparelho é computada nas antenas localizadas nas diversas regiões da cidade.

Segundo esses dados, a favela do Vidigal, localizada na zona sul, recebeu mais de 369 mil turistas em 2023. Aparece à frente de outros pontos turísticos importantes, como o Jardim Botânico e a Escadaria Selarón. Nos últimos anos, a favela se tornou um polo de turismo e entretenimento da cidade.

Guia local no Vidigal, Ana Lima atua no setor desde 2010. No início, ela conciliava o trabalho na área administrativa de um escritório com os passeios turísticos aos finais de semana. "Comecei a levar os meus amigos do vôlei [até o Vidigal]. Eles começaram a indicar para os amigos deles e aí eu comecei a cobrar. Não foi algo que planejei, resolvi seguir, mas foi acontecendo."

Guia local no Vidigal, Ana Lima é microempreendedora individual (MEI) desde 2012 - Folhapress

Ana conta que a entrada no turismo foi natural e gradativa. Em 2012, ela fez o curso de guia de turismo do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e também se tornou microempreendedora individual (MEI), com assessoria da instituição.

Hoje, a guia local é dona da conta Trilha Dois Irmãos no Instagram, onde publica e divulga o seu trabalho. Além disso, ela é proprietária de uma casa na comunidade, que aluga para hospedagem temporária de turistas.

No tour, Ana oferece uma experiência de quatro horas de visitação a R$ 130 por pessoa. O passeio inclui transporte em mototáxi ou van até o início da trilha do morro Dois Irmãos e uma caminhada de uma hora até o pico. A descida tem também visitação e explicação sobre a história da comunidade, com pontos turísticos e projetos sociais.

"É extremamente importante, tanto para o Vidigal quanto para outras favelas", afirma Ana. "Quando o turista chega, eu chamo o mototáxi para subir com a gente. O mototaxista vai, ganha o dinheiro da corrida e ajuda a família com isso. Levo os turistas nos barzinhos para almoçar, comprar uma água. De alguma forma, os turistas deixam os recursos aqui."

Essa iniciativa é chamada de empreendedorismo social, cujo conceito não se limita ao próprio negócio. Segundo Carla Panisset, gerente desse segmento no Sebrae-Rio, essa forma de empreender não só impulsiona o crescimento do negócio como também traz benefícios para a comunidade. "Além de gerar trabalho e renda para esses territórios, cria soluções e ofertas de serviços típicas para as pessoas que vivem lá."

No bairro de Botafogo, na zona sul do Rio de Janeiro, o guia local Thiago Firmino também realiza tours. Ele guia turistas para a visitação na favela Santa Marta, que fica localizada perto do Parque Nacional da Floresta da Tijuca, que abriga o Cristo Redentor.

Começou informalmente em 2009, com 27 anos. Thiago trabalhava como professor de dança e DJ quando enxergou a oportunidade de empreender. Durante a implementação do programa das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) na comunidade, ele passou a conciliar a dança com o trabalho de guia. "A dança tem seus altos e baixos e é muito sazonal. Fiquei pensando ‘vou começar a empreender alguma coisa dentro da favela’."

Desde 2009, o guia Thiago Firmino organiza tours no morro Santa Marta. Em abril de 2024, o negócio avançou de MEI para microempresa - Folhapress

Com o aumento da demanda, Thiago decidiu se dedicar exclusivamente à área do turismo. Após seis anos na informalidade, o guia oficializou sua atividade como MEI em 2015. Hoje, aos 43 anos, ele comanda o Favela Santa Marta Tour, que organiza visitação pela comunidade junto com mais dois guias prestadores de serviço. Em abril desse ano, a empresa avançou de MEI para microempresa.

Presente nas redes sociais e em sites de vendas de passeios turísticos, como Get your Guide e Tripadvisor, o tour oferece toda a experiência a R$ 165 por pessoa. O passeio pela comunidade, com duração média de duas horas, inclui visitas a lojas de artesanato, a uma creche local e ao lugar onde Michael Jackson gravou o clipe da música "They Don't Care About Us", em 1996. O pacote dá direito a uma bebida.

"Nós sabemos como é trabalhar dentro de uma favela. Não é nada fácil, ainda mais você engatar na área, onde tem turistas andando dentro da favela", afirma Thiago.

Desafios além do negócio

O acesso a crédito e a informalidade são desafios para quem empreende nas comunidades. Além disso, há outras questões que não estão no alcance dos trabalhadores, como as relacionadas à segurança e infraestrutura.

"Se você tem, por exemplo, algum conflito no território, você tem que fechar seu comércio e isso faz com que ele tenha menos ganhos", afirma Carla Panisset, gerente do Sebrae-Rio. "Se [a comunidade] tem problemas de saneamento e você trabalha com alimentação, demanda outros cuidados. Todos esses impactos recaem na vida do empreendedor na favela."

Thiago, do Favela Santa Marta Tour, afirma que os casos de violência em outras comunidades acabam prejudicando o turismo. O guia lembra do caso de uma turista espanhola que foi morta após ser atingida por tiro da polícia enquanto estava, com outros visitantes, em um carro na parte alta da Rocinha.

"No dia seguinte acabou com meu tour, porque muitas pessoas cancelaram. Deu duas semanas sem tour nenhum, depois foi voltando devagarzinho. Tive que recomeçar do zero e me reconfigurar de novo", afirma Thiago.

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