Siga a folha

Descrição de chapéu The New York Times

Governo britânico cobra por resgate de mulheres forçadas a se casar

Taxa de retorno ao país pode chegar a quase US$ 1.000

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Benjamin Mueller
Londres | The New York Times

É um final punitivo para uma provação horrível: mulheres britânicas que sobrevivem a casamentos forçados no exterior são resgatadas com a ajuda do Departamento do Exterior, mas têm de ressarcir o governo por seu resgate.

Se não conseguirem juntar um valor que pode chegar a quase US$ 1.000 (R$ 3.750) em seis meses, o departamento acrescenta uma multa de 10% ao que elas ainda deverem. Para algumas mulheres, isso significa usar empréstimos universitários ou fundos de benefícios públicos para sua escapada de volta.

Essas revelações, feitas em uma série de artigos no jornal The Times de Londres nos últimos dias, provocaram indignação no Parlamento e atraíram uma promessa do secretário do Exterior, Jeremy Hunt, na quarta-feira (2), de que vai solicitar novos conselhos sobre essa política.

"É claro que devemos agir sempre com compaixão e humanidade em cada situação", disse ele em entrevista à rádio, "mas eu quero chegar ao fundo desta questão em particular." 

O Departamento do Exterior ajudou a trazer de volta 27 sobreviventes de casamentos forçados em 2017 e 55 no ano anterior, segundo números do governo obtidos pelo Times de Londres sob as Leis de Liberdade da Informação. O maior número de casos foi no Paquistão, e nem todas as mulheres precisaram de empréstimos do governo para voltar ao Reino Unido

Aisha Gill, professora de criminologia na Universidade de Roehampton que escreveu extensamente sobre o casamento forçado, disse que os empréstimos punitivos minam o trabalho do governo britânico para ajudar a resgatar sobreviventes.

"Na minha opinião, a proteção não deveria ter um preço", disse ela em entrevista. "Elas não deveriam ser punidas por buscarem a proteção do consulado." 

Gill disse que o fato de tal política existir revela a tendência das pessoas a minimizar a coerção e o abuso que são elementos centrais nos casamentos forçados. 

O governo intervém em prol das pessoas que estão presas no exterior sem pedir pagamento, disse Gill.

Mas o fato de que muitas sobreviventes de casamentos forçados são imigrantes, ou vêm de famílias que imigraram recentemente parece torná-las menos simpáticas ao olhar do público, acrescentou ela. 

A política de repagamento do governo britânico é uma extensão de sua abordagem aos turistas britânicos ou outros cidadãos que enfrentam problemas no exterior e precisam de ajuda para retornar ao Reino Unido. Pessoas com 18 anos ou mais têm de reembolsar o governo. 

Esse limite de idade entrou em vigor depois que o jornal The Guardian relatou há dois anos sobre uma adolescente britânica de 17 anos que buscou ajuda na embaixada britânica em Islamabad para escapar de um casamento forçado em 2014. Ela teve de assinar um acordo de empréstimo e entregar seu passaporte britânico antes de receber autorização para voltar ao Reino Unido, e teve de pagar mais de US$ 1.000 (R$ 3.750), com seu passaporte retido até ela saldar a dívida. 

Depois disso, as jovens de 16 e 17 anos ficaram isentas da política de reembolso. 

O Times de Londres reportou sobre quatro mulheres britânicas que foram cobradas em US$ 900 (R$ 3.380) cada uma pelos esforços do governo para libertá-las de uma instituição religiosa na Somália, onde disseram ter sido acorrentadas, chicoteadas e informadas de que seriam mantidas até que se casassem. As famílias das mulheres as enviaram para lá porque achavam que eram independentes demais.

Ayaan, 24, que esteve nessa instituição durante dois anos, disse que assinou um acordo de empréstimo no dia em que foi resgatada.

"Tive de lutar por mim mesma", disse ela ao Times. "O empréstimo causou muita ansiedade."

Assim como o governo não cobraria uma vítima de crime por investigar esse crime, não deveria cobrar das mulheres por trazê-las de volta ao país, disse Alison Gardner, professora-assistente de sociologia que estuda a escravidão moderna na Universidade de Nottingham. Ela disse que uma dívida de US$ 1.000 (R$ 3.750) pode ser devastadora para uma jovem cuja família tentou obrigá-la a se casar e pode deserdá-la se ela escapar.

"É um exemplo dessa política geral de impor os custos a pessoas que sofreram infortúnio, o que conduz a um ciclo de vulnerabilidade crescente", disse Gardner.

Uma porta-voz do Departamento do Exterior disse em um comunicado: "Reconhecemos que um empréstimo de emergência pode ajudar a retirar uma pessoa em dificuldades ou vulnerável do risco quando ela não tem outra opção, mas como são verbas públicas temos a obrigação de recuperar o dinheiro no devido tempo". 

A porta-voz disse que o governo também dá dinheiro a casas de abrigo e outras organizações que não cobram de britânicas sobreviventes de casamento forçado para ajudá-las a encontrar um local seguro. 

 

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas