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Marília Bassetti Marcato

A política industrial americana e a percepção popular

Se vierem, bons resultados precisarão ser observados no cotidiano do eleitorado

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Marília Bassetti Marcato

Professora do Instituto de Economia da UFRJ, é assessora do presidente do BNDES, Aloizio Mercadante

Um dos maiores legados do governo Joe Biden – a injeção de trilhões de dólares em uma estratégia industrial moderna— é colocado em xeque por especialistas e não encontra respaldo na percepção popular.

Diante da ascensão de Kamala Harris à disputa presidencial, este tema será certamente tratado com algum cuidado pelo Partido Democrata. A insatisfação popular em relação à economia revela, afinal, uma desconexão entre as mudanças na legislação que dá base à nova política industrial americana e a percepção da população a respeito da forma como Biden conduziu a economia, especialmente tendo em vista a incapacidade dos salários de acompanhar o aumento de preços.

Joe Biden no Salão Internacional do Automóvel da América do Norte; o presidente anunciou um investimento de US$ 900 milhões em infraestrutura de veículos elétricos no sistema rodoviário nacional em 35 estados - Bill Pugliano/Getty Images/AFP

A agenda econômica do governo Biden foi descrita pela secretaria do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, como "economia moderna do lado da oferta". Trata-se de um grande esforço da Casa Branca para transformar a economia americana, estimular a competitividade e obter ganhos de produtividade, com uma estratégia de ampliação dos investimentos em infraestrutura pública. Ao mesmo tempo, as ações buscaram reprimir as pressões inflacionárias e reduzir as desigualdades socioambientais.

Juntas, essas leis autorizam mais de US$ 2 trilhões em financiamento e incentivos por até dez anos, com uma combinação de despesas diretas juntamente com ferramentas indiretas, como subvenções, incentivos fiscais e garantias de empréstimos. No caso do IRA (Lei de Redução da Inflação, na sigla em inglês), trata-se do maior investimento americano já realizado no combate às mudanças climáticas.

Mas em que medida essa estratégia industrial moderna conseguirá alcançar seus objetivos?

Por um lado, sua efetividade será verificada pela capacidade de alavancar a competitividade industrial e a produtividade em meio ao cenário de erosão da capacidade produtiva e inovativa americana, complexos desafios atrelados à crise climática e disputa geopolítica imposta pela liderança da China em diversas tecnologias. Por outro lado, para além da criação de empregos, que alcançou números historicamente excelentes, será necessário endereçar a polarização do mercado de trabalho americano e a perda de capacidade de compra dos trabalhadores.

As dúvidas em relação à efetividade da política industrial transbordam para críticas em relação à fragilidade dos mecanismos de governança e monitoramento permanente das ações estabelecidas. As leis compartilham de diversas interdependências e iniciativas individuais que se reforçam mutuamente, trazendo maior complexidade para o acompanhamento e atribuição de responsabilidades.

Na ausência de um único czar da política industrial americana, há uma série de grandes nomes, como John Podesta, Gina Raimondo, Mitch Landrieu e Jack Sullivan. A coordenação entre múltiplas agências federais, várias esferas de governo e múltiplas tecnologias, além da necessidade de garantir intenso envolvimento do setor privado e da existência de múltiplos programas e metas, desafiam a implementação das três leis.

Apenas sob o IIJA ( Infrastructure Investment and Jobs Act) , são mais de 45 agências federais, contemplando cerca de 40 mil projetos. Rodovias e pontes representam a maior parcela desses projetos, que aportam ainda aeroportos, sistemas de água, limpeza de resíduos tóxicos e expansão da rede elétrica.

O caráter difuso dos projetos reflete a necessidade de atender às prioridades específicas das autoridades estaduais e locais, o que revela um aspecto fundamental da batalha para aprovação desta lei (a tal "economia política por trás da política industrial").

Os investimentos pesados em projetos de energia limpa do IRA, por exemplo, concentraram-se no sudeste dos Estados Unidos, em estados e distritos eleitorais liderados por republicanos. Segundo The Economist Intelligence, os estados vizinhos da Carolina do Norte, Carolina do Sul e Geórgia, juntos, representam 40% dos investimentos planejados. Geórgia é justamente um dos seis "swing states", termo utilizado para se referir a estados que não possuem um partido definido, e terá um papel decisivo na disputa eleitoral.

Não bastará que a política industrial produza os resultados esperados para as empresas americanas. Esses resultados precisarão ser percebidos no cotidiano do eleitorado americano. E, ainda assim, isso poderá não ser suficiente para garantir a continuidade da atual política industrial americana.

* A opinião da autora não reflete necessariamente a do BNDES

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