Se tivéssemos de escolher um só ativo que respondesse por pelo menos parte do resultado de todos os outros no mundo, este seria o título público federal de 10 anos americano (T10). Essa taxa atingiu hoje sua máxima dos 16 anos. Nos últimos 30 dias, ela subiu de 3,87% ao ano para 4,34% ao ano. Explico qual a relevância desta taxa e de sua variação.
O valor justo de praticamente todos os ativos é calculado por meio do desconto a valor presente do fluxo de caixa futuro. Vamos ilustrar isso com um exemplo.
Considere um ativo que tenha apenas um fluxo de caixa de R$ 30,00 nos próximos 3 anos. Você vai concordar comigo que R$ 30 em 3 anos vale menos que R$ 30 hoje.
Para entender qual o valor justo para estes R$ 30 em cada ano, ajustamos esse valor pelo preço do dinheiro no tempo que é a taxa de juros, acrescida de um prêmio pelo risco de não se receber este fluxo.
Assim, assuma que a taxa de juros e o prêmio apropriados para esse fluxo são de 10% e 5% ao ano, respectivamente. Logo, a taxa para se descontar o fluxo seria de 15% ao ano.
Portanto, para saber o valor justo do ativo acima, basta realizar o seguinte cálculo:
Valor = 30/ (1+15%) + 30/(1+15%)^2 + 30/(1+15%)^3 = 26,09 + 22,68 + 19,73 = 68,50.
Mas, onde entra a T10?
Ela é a base para o cálculo da taxa de 10% que usamos no cálculo acima.
Ativos como ações, imóveis e empreendimentos em geral têm fluxos de caixa de prazo que se estendem para mais de 10 anos. Não vou entrar nos detalhes matemáticos, mas o prazo médio de um fluxo de longo prazo, ou seja, de mais de 20 anos, costuma estar próximo de 10 anos.
Assim, a taxa de 10 anos americana é, praticamente, a base para construção de todas as taxas de desconto de ativos pelo mundo.
Por exemplo, quando um analista vai calcular a taxa de juros a se descontar os ativos no Brasil, ele inicia com a taxa de juros de 10 anos americana, soma a taxa que representa o risco Brasil e soma o que ele acredita ser a taxa que representaria a variação do câmbio no longo prazo.
Assim, quando a T10 sobe, todas as taxas de desconto sobem. Entretanto, como as taxas de desconto são usadas no denominador do cálculo de valor, quando as taxas desconto sobem, o valor justo dos ativos cai.
A taxa de juros da T10 subiu quase 0,5% em 30 dias. Essa alta é como um terremoto que ocorre no meio do mar e provoca um tsunami cuja onda se estende pelo mundo afetando todas as taxas de desconto.
Veja o efeito no Brasil. Há 30 dias, a taxa de juro do contrato futuro de juro brasileiro de 10 anos negociado na B3 estava a 11% ao ano. Hoje, o mesmo contrato é negociado a 11,4% ao ano. Uma alta de 0,4% no período.
Veja um exemplo do impacto desta alta. Considere uma ação que paga um fluxo, por exemplo, um dividendo constante de R$ 10 por ano indefinidamente. Para calcular o valor justo, usamos a fórmula da soma de uma progressão geométrica infinita. Assim, o valor justo desta ação seria a razão entre o fluxo e a taxa. Vamos desconsiderar o prêmio pelo risco da incerteza do fluxo.
Fazendo o cálculo, há 30 dias, o valor justo desta ação era de R$ 90,91.
Com a nova taxa de juros de 11,4% ao ano, o novo valor justo é de R$ 87,72. Portanto, uma queda de 3,51%.
Sabe quanto o Ibovespa se desvalorizou em 30 dias?
No dia 21 de julho, o Ibovespa encerrou o pregão negociado a 120.267 pontos. Hoje, o Ibovespa encerrou o dia valendo 114.429. Uma desvalorização de 4,85%.
Óbvio que a taxa de juros não é o único fator a influenciar a variação da Bolsa, mas ela foi uma importante variável nesta queda.
A alta das taxas de juros de 10 anos americana são um risco para todos os ativos pelo mundo, pois ela pode desencadear a correção destes ativos.
Portanto, seu comportamento deve ser acompanhado de perto. Entretanto, mais importante do que acompanhar seu nível hoje, é tentar prever como ela estará nos próximos meses, pois será esta variação que influenciará os preços dos ativos pelo mundo.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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